Folha de S. Paulo
Bolsonaro atentou contra as eleições e esteve
no centro da mobilização golpista mais grave desde a redemocratização
Desde o primeiro anúncio do tarifaço ao
Brasil, Donald Trump o
justifica pela perseguição que Bolsonaro sofreria nas mãos do STF (Supremo
Tribunal Federal). Não é segredo para ninguém também que, dentre os críticos
mais assertivos de Alexandre de Moraes, muitos sejam partidários de Bolsonaro
que querem livrá-lo da Justiça e reabilitá-lo para concorrer em 2026. Cabe
perguntar então: será que Bolsonaro sofre perseguição? Vou rememorar fatos já
amplamente sabidos.
Ao longo de seu mandato e especialmente a partir de 2022, Bolsonaro promoveu ativamente, sempre que pôde, acusações falsas de fraude contra as urnas eletrônicas e o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), para dessa forma negar os resultados das eleições caso perdesse, como de fato veio a ocorrer.
Bolsonaro colocou à frente da Abin seu
aliado Alexandre
Ramagem, que a transformou num órgão de inteligência paralela para
monitorar opositores e mesmo aliados suspeitos do presidente, além de produzir
conteúdos enganosos sobre as eleições.
No segundo turno das eleições de 2022,
a Polícia
Rodoviária Federal de seu governo planejou e executou um plano
de bloqueio de rodovias seletivo, cujo critério eram regiões em que Lula obteve
mais votos no primeiro turno.
Após a derrota nas urnas, milhares de
apoiadores seus armaram acampamento na frente de quartéis por todo o Brasil,
pedindo um golpe militar. Os acampamentos de Brasília se notabilizaram por
promover uma noite de incêndios e depredações em 12 de dezembro, e um de seus
participantes colocou uma bomba na frente do aeroporto de Brasília na véspera
de Natal, que só não explodiu por falha técnica. Esses acampamentos estavam em
comunicação constante com o alto escalão do governo.
Em 7 de dezembro de 2022, Bolsonaro se reuniu
com generais do alto comando do Exército para persuadi-los a apoiar um decreto
de estado de sítio que impediria a posse do presidente eleito. Conseguiu o
apoio de um deles, mas não dos outros dois. Foi isso que, aparentemente, o fez
desistir do plano, apesar das cobranças insistentes de militares e apoiadores.
Já em 2023, depois de ter saído do país, seus
seguidores tentaram provocar uma intervenção militar com a invasão dos Três
Poderes em 8 de janeiro.
Em nenhum momento Bolsonaro tentara desmobilizar os acampamentos e desautorizar
seus pedidos por um golpe.
Por tudo isso, Bolsonaro foi o presidente que
mais atentou contra nossas eleições e esteve no centro da mobilização golpista
mais grave desde a redemocratização.
Isso não exclui críticas a diversas decisões
questionáveis de
Moraes: cautelares injustificadas, prisões preventivas indevidas,
penas muito duras, a decisão de não se declarar impedido para julgar um crime
no qual ele figurava como um dos principais alvos.
Há ainda questionamentos que se pode fazer à
acusação contra Bolsonaro: até que ponto ele estava ciente de todas as frentes
que se organizavam por um golpe? Ele teve algo a ver com as movimentações
posteriores à posse de Lula, que culminaram no 8 de janeiro? Sua conduta chegou
a configurar o crime de golpe de Estado? É justamente para esse tipo de discussão
que serve o julgamento. Mas que ele esteja sendo julgado por tudo que foi
descrito acima não é perseguição; é o mais elementar funcionamento da Justiça.
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