Valor Econômico
Politicamente, o que mais fará diferença para
o governo Lula é um cenário externo que facilite uma queda dos preços
domésticos, particularmente de alimentos
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva faz
pronunciamento em rede nacional de rádio e TV (17/07) sobre o
"tarifaço" de Trump — Foto: Reprodução
O Palácio do Planalto tem visto a tarifa
imposta pela Casa Branca sobre as exportações brasileiras como uma excelente
oportunidade política. Evidentemente, há preocupações com as consequências
econômicas de um acirramento do conflito entre Brasil e EUA, mas já está claro
que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem colhido benefícios junto à
opinião pública.
AtlasIntel e Genial Quaest já registraram uma alta de três a cinco pontos percentuais na aprovação do presidente Lula (de 45% para 50%, e de 40% para 43%, respectivamente). Esse movimento pode ser parcialmente explicado pela queda na inflação dos alimentos — mas, principalmente, pelo embate com o governo de Donald Trump. O fenômeno tem precedentes: as aprovações dos governos do Canadá e do México subiram depois que Trump elevou as tarifas sobre ambos; alguns países da Europa viveram situações semelhantes. Tanto lá fora quanto aqui, eleitores veem as medidas norte-americanas como injustas, o que acaba inflando o nacionalismo contra uma ameaça externa.
Aqui, há o agravante de que o governo associa
as tarifas ao lobby explícito do deputado Eduardo Bolsonaro para que Washington
impusesse sanções contra o Brasil — embora o deputado tenha pedido mais sanções
contra ministros do Supremo Tribunal Federal que tarifas. Mas, em termos políticos,
isso abre um flanco para que qualquer candidato apoiado pelo ex-presidente Jair
Bolsonaro seja associado a medidas do governo norte-americano que podem
prejudicar empregos e renda no Brasil.
Mesmo reconhecendo esses avanços, ainda é
cedo para afirmar se esse movimento terá um efeito concreto sobre o resultado
das eleições de 2026.
Se o pleito fosse nos próximos três a cinco
meses, as tarifas certamente contariam a favor da reeleição de Lula. Uma onda
nacionalista e antiamericana tende a beneficiar a candidatura do presidente e
enfraquecer qualquer outra associada a um governo que está tirando empregos do
Brasil. Ao mesmo tempo, as consequências econômicas de uma guerra tarifária com
os EUA tendem a ser sentidas mais tarde, não no curto prazo.
Essa equação muda um pouco com o passar do
tempo. Falta um ano e três meses para as eleições, e os efeitos de eventos como
esse tendem a se dissipar. Outros temas, mais caros para os eleitores — como
renda, custo de vida, segurança — acabam falando mais alto.
Economistas estimam que as tarifas
norte-americanas terão um impacto bastante modesto sobre a economia brasileira,
reduzindo o PIB nacional entre 0,2% e 0,4% — uma vez que as exportações para os
EUA representam menos de 2% do PIB brasileiro, e a produção doméstica deve
encontrar novos mercados.
Mas é preciso fazer duas ressalvas.
A primeira é que os mercados provavelmente
terão que avaliar os riscos de uma deterioração mais grave na relação
bilateral. Se a Casa Branca aumentar de 50% para 100% as tarifas impostas ao
Brasil e sancionar ministros do STF com a Lei Magnitsky, cresce o risco de o
governo Lula retaliar contra empresas ou importações norte-americanas. A
exclusão do Brasil do sistema de pagamentos Swift parece bem improvável (até
porque precisaria do aval de países europeus e do G10), assim como medidas para
bloquear o uso de GPS no território brasileiro. Mas não é pequeno o risco de
uma escalada que possa ter consequências além das tarifas.
A segunda é que toda essa incerteza pode
evitar uma apreciação do real. A moeda brasileira se desvalorizou pouco, de R$
5,40 para R$ 5,56, desde que as tarifas sobre o Brasil foram anunciadas. Mas o
real poderia ter feito o movimento inverso se não fosse a crise. Além do mais,
um Lula politicamente mais forte nos próximos meses também pode reduzir as
apostas de uma mudança de governo em 2026 — o que também tende a evitar uma
apreciação cambial.
Não é pequeno o risco de uma deterioração nas
relações EUA-Brasil que possa ter consequências além das tarifas
Politicamente, o que mais fará diferença para
o governo Lula é um cenário externo que facilite uma queda dos preços
domésticos, particularmente de alimentos. A inflação dos alimentos foi um dos
principais responsáveis pela queda na aprovação do presidente no primeiro semestre
deste ano, exacerbada pela desvalorização cambial. Assim, a percepção de que
Lula pode ter vantagem em 2026 (algo que agentes do mercado vinham
subestimando), combinada a uma incerteza econômica maior, pode levar a uma
desvalorização do real — ou evitar uma valorização. O resultado para 2026 pode
ser neutro: Lula ganha um pouco com uma onda mais nacionalista, mas perde com
um câmbio mais fraco.
O dado mais relevante da equação pode ser a
composição da chapa da oposição. As chances de Tarcísio de Freitas ser o
candidato da direita parecem ter diminuído. Ao criticar as tarifas
norte-americanas, o governador reforçou a suspeita dos Bolsonaro de que sua
fidelidade ao ex-presidente tem limites, e aumentou a tendência de que o
Bolsonaro escolha um de seus filhos para disputar a presidência como seu
indicado.
Mas é difícil antecipar o impacto até desse
quesito nas eleições. Se há um desejo de mudança — seja por causa de custo de
vida ou de renda — qualquer candidato de oposição tende a prevalecer. E se a
associação de Bolsonaro com um governo Trump impopular afeta negativamente a
candidatura de alguém de sua família, abre-se um espaço para mais um candidato
no campo da oposição, fragmentando a direita.
Ao fim e ao cabo, é fácil avaliar que Lula tende a se beneficiar do embate com Trump em 2025. Mas fazer projeções sobre o impacto desse conflito nas eleições do próximo ano é um exercício muito mais difícil — e ainda não permite concluir que Lula tende a se beneficiar com o embate em 2026.
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