quarta-feira, 31 de dezembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Empreendedor brasileiro tem muito a ganhar com IA

Por O Globo

País não tem chance de disputar liderança na nova tecnologia, mas ela abrirá inúmeras oportunidades

As empresas na vanguarda da inteligência artificial (IA) — todas americanas — investiram em 2025 cerca de US$ 400 bilhões. Isso equivale ao quádruplo do que a Petrobras, maior empresa do Brasil, pretende investir nos próximos cinco anos. Na briga para tentar desenvolver um modelo de IA capaz de superar a maioria dos seres humanos em várias tarefas, gigantes como OpenAI, Anthropic ou Google não param de captar capital e aplicá-lo na construção da infraestrutura necessária para desenvolver modelos mais e mais poderosos. Vislumbra-se um impacto transformador em praticamente toda a economia global.

O único país capaz de disputar a liderança com os Estados Unidos é a China. Europa, Japão e Rússia estão fora do páreo. Brasil, nem se fala. Apesar disso, os brasileiros podem obter benefícios se as previsões de uma nova revolução tecnológica se confirmarem.

Mesmo quem não desenvolve modelos de IA avançados tem muito a ganhar com a tecnologia. A adoção de ferramentas de IA é, já no estágio atual, capaz de melhorar o desempenho da mão de obra em diferentes setores. O Brasil já é o terceiro maior mercado em usuários de IA. Os produtos serão, portanto, influenciados por demandas e especificidades dos brasileiros.

De 1980 para cá, os brasileiros têm se afastado dos americanos em renda, enquanto asiáticos ou europeus orientais têm encurtado a distância. A principal causa é a estagnação da produtividade. Há 45 anos, eram necessários dois brasileiros para fazer o trabalho de um americano. Agora são quatro ou cinco. Um fator determinante para o atraso é o nível baixo na adoção de novas tecnologias. A IA traz a oportunidade de uma virada.

Há motivo para otimismo. Numa pesquisa realizada pela consultoria BCG em 11 países, incluindo Alemanha, Estados Unidos, França, Índia e Japão, o Brasil aparece em primeiro lugar na adoção no local de trabalho de ferramentas “digitais inteligentes capazes de aprender, raciocinar e lidar com tarefas complexas de forma independente”. No mesmo levantamento, os brasileiros são os que menos temem o sumiço do emprego nos próximos dez anos. A predisposição para encarar a nova tecnologia de maneira positiva deve ajudar na sua popularização.

Há oportunidade para empresas brasileiras adaptarem modelos desenvolvidos pelos pioneiros da IA e criarem novos produtos e serviços. A maior parte do lucro certamente ficará com as gigantes do setor, mas há espaço para explorar adaptações voltadas a países emergentes. Como o desenvolvimento de IA consome quantidades gigantescas de energia elétrica, o Brasil também pode atrair investimento de empresas estrangeiras de data center interessadas numa matriz renovável. Para que os sonhos despertados pela IA se concretizem, duas condições são essenciais: os empreendedores precisam estar atentos às oportunidades e, acima de tudo, o governo não pode atrapalhar.

Episódios de intolerância religiosa se chocam com imagem do Brasil

Por O Globo

Convívio entre crenças não é belicoso como noutros países, mas registros de incidentes e agressões têm crescido

As imagens das praias cheias de gente vestida de branco, pulando sete ondas e oferecendo flores a Iemanjá no réveillon podem transmitir uma impressão enganosa. Elas sugerem um país de maioria católica que convive bem com crenças de matriz africana e outras religiões. E é verdade que, na comparação com outros países, o Brasil tem retrospecto positivo na harmonia entre diversas crenças. Na prática, porém, têm sido registrados episódios frequentes de intolerância.

A tensão fica evidente no inquérito civil que o Ministério Público Federal instaurou para investigar suspeita de discriminação religiosa na organização do réveillon de 2025 pela Prefeitura do Rio, depois da queixa de que a programação priorizou atrações para o público evangélico em detrimento de outras religiões. Além de criticar o palco gospel, sob o argumento de que os evangélicos foram favorecidos, representantes das religiões de matriz africana alegam que os terreiros foram pioneiros na festa de fim de ano na praia.

Privilégios a grupos específicos podem e devem ser questionados. A Prefeitura deveria ter se preocupado em oferecer espaço também a outras manifestações, como a cultura afro. O próprio prefeito Eduardo Paes reconheceu isso implicitamente ao afirmar que “o réveillon da Praia de Copacabana é de todos” e que “alguns ajustes terão de ser feitos no próximo ano”. Mas, ainda que o réveillon à beira-mar seja tradição da umbanda e do candomblé, os evangélicos também devem ter direito a comemorar no espaço público.

As críticas ao palco gospel ocorrem num momento de escalada preocupante dos ataques de evangélicos radicais a umbandistas e candomblecistas. Num conjunto de 511 terreiros, 80% afirmaram ter sofrido, ao menos uma vez em dois anos, agressão verbal, xingamentos, ataques diretos ou abordagem policial discriminatória, situações identificadas pela expressão “racismo religioso”. É o que revela a pesquisa “Respeite o meu terreiro”, cujos resultados foram apresentados no início de dezembro em reunião da Organização das Nações Unidas na Suíça. O levantamento — idealizado pela Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde e pelo terreiro Ilê Omolu Oxum, em parceria com o Ministério de Direitos Humanos e Cidadania — revelou que 76% foram alvo de diversas formas de violência, e 74% foram ameaçados, depredados ou destruídos.

São dados alarmantes, mas nem por isso surpreendentes. O Disque Direitos Humanos (Disque 100) registra agravamento do problema: houve 2.472 denúncias de casos de intolerância religiosa em 2024, alta de 66,8% em relação às denúncias em 2023 (1.481). Se considerados os dados registrados entre 2021 e 2024, as denúncias de violações cresceram 323,29%.

Autoridades precisam estar atentas e punir ataques à fé alheia exemplarmente, na forma da lei. O Brasil não pode ser leniente com a intolerância religiosa. Não importa de que campo político venha. Num Estado laico, a liberdade de culto garantida pela Constituição é sagrada.

Embates entre Poderes marcaram 2025

Por Folha de S. Paulo

Parlamentares minam Orçamento, STF mantém inquéritos opacos e lulistas chamam Congresso de inimigo do povo

Não se trata de alguma ameaça à democracia, como sob Jair Bolsonaro, mas de erros e excessos capazes de prejudicar seu funcionamento

O ano de 2025 se encerra com um panorama político e institucional conturbado por passos temerários dados por Executivo, Legislativo e Judiciário. Não se trata de alguma ameaça à democracia, como sob Jair Bolsonaro (PL), mas de erros e excessos capazes de prejudicar seu funcionamento.

Parte dos embates deriva da mudança na correlação de forças entre Palácio do Planalto e Congresso, num processo que já tem mais de uma década.

No arranjo inicial da redemocratização, dois instrumentos permitiam ao presidente da República impor sua agenda aos parlamentares: as prerrogativas de editar medidas provisórias com grande facilidade e de decidir se pagaria ou não as emendas por eles incluídas no Orçamento.

Assim se governava e se negociavam apoios com dificuldades menores num Congresso Nacional fragmentado em múltiplos partidos —no que ficou conhecido como presidencialismo de coalizão.

No entanto mudanças no trâmite das MPs e das emendas mudaram o cenário. Medidas não aprovadas no prazo legal passaram a perder validade, e a execução de grande parte das emendas tornou-se obrigatória. O valor a elas destinado se multiplicou até os R$ 60 bilhões incluídos na lei orçamentária de 2026, montante sem paralelo conhecido nas principais democracias.

O Supremo Tribunal Federal, com destaque para o ministro Flávio Dino, interveio corretamente na questão ao impor normas mínimas de transparência e moralidade na execução das despesas —as quais os congressistas insistem em desrespeitar.

Mas também o STF, que teve membros envolvidos em situações sombrias de conflito de interesses, tratou de hipertrofiar seus poderes. O que começou como reação necessária às afrontas do bolsonarismo se perpetuou na forma de inquéritos opacos e intermináveis. Decisões voluntaristas, ademais, com frequência invadem a seara do Legislativo.

No caso mais recente, o ministro Gilmar Mendes achou por bem blindar a si e aos colegas mudando com uma canetada a lei do impeachment, de 1950 —recuando parcialmente depois.

Luiz Inácio Lula da Silva (PT), embora ciente do novo cenário, escolheu governar como há duas décadas, concedendo apenas postos secundários aos partidos aliados. A diferença é que agora busca se amparar sempre que possível no Supremo, para o qual tem indicado apenas nomes de sua estrita confiança, em detrimento do mérito jurídico.

Depois de muitas derrotas legislativas, ademais, os petistas adotaram a estratégia populista e antipolítica de carimbar o Congresso como "inimigo do povo", acirrando as tensões.

Não estamos diante de impasses insolúveis ou de uma crise terminal do presidencialismo. O sistema segue em funcionamento e está em evolução, mas será necessário que lideranças e autoridades cheguem a um entendimento para conter a balbúrdia.

A quem servem os Correios

Por Folha de S. Paulo

Estatal abriga indicações políticas e destina dois terços de gasto corrente a quadro de pessoal inchado

Plano de recuperação, com R$ 12 bi garantidos pelo contribuinte e promessa de fechar 1.000 agências, visa manter um negócio obsoleto

Os Correios empregam cerca de 85 mil pessoas, com um dos maiores quadros do país. Embora a empresa estatal esteja em situação falimentar e recorrendo a um socorro bilionário garantido pelos contribuintes brasileiros, seus funcionários —representados por nada menos que 36 entidades sindicais em todos os estados— estão em greve por aumento de salários.

Pagamentos de remunerações e benefícios são estimados em R$ 15,1 bilhões neste ano, equivalentes a cerca de dois terços das despesas correntes da companhia. Os benefícios incluem gratificação de 70% nas férias, mais que o dobro dos 33,3% exigidos pela Constituição, generosas horas-extras nos fins de semana e um plano de saúde hoje considerado insustentável, entre outros.

Funcionários de estatais são regidos pela CLT e, em teoria, não gozam da estabilidade no emprego que é garantida no Brasil, de forma anômala no mundo, à grande maioria dos servidores públicos. Na prática, porém, a Justiça brasileira cria todo tipo de obstáculo a demissões tentadas por essas empresas.

Por isso, o recém-anunciado plano de recuperação dos Correios prevê um programa de demissões incentivadas (PDV) para tentar convencer 15 mil empregados a sair com a oferta de vantagens diversas —que, de início ao menos, elevarão custos.

É nesse paquiderme do corporativismo, dirigido por indicações políticas e com prejuízo acumulado de R$ 6,1 bilhões de janeiro a setembro, que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está injetando R$ 12 bilhões, obtidos por empréstimo graças à garantia do Tesouro.

Na segunda-feira (29), ao discorrer sobre as prometidas medidas de ajuste, o presidente da empresa, Emmanoel Rondon, adiantou que precisará de mais R$ 8 bilhões em 2026 —que, por sua declaração, poderão vir diretamente dos cofres públicos, sem a fachada do crédito bancário.

Acredite quem quiser que compromissos como fechar 1.000 agências deficitárias, de um total de cerca de 6.000 unidades próprias, serão levados adiante e conterão a sangria na estatal, mesmo porque nem mesmo se pode garantir que Lula será reeleito e o próximo governo dará continuidade à empreitada.

Fato é que todo esse esforço inglório, à custa dos pagadores de impostos, tem o objetivo de manter em funcionamento um negócio obsoleto que poderia ser vendido ou, na falta de interessados, fechado para contenção de danos para a sociedade. Apenas apaniguados políticos e sindicatos teriam perdas irreparáveis.

O verdadeiro ‘novo’ na política

Por O Estado de S. Paulo

Em ano eleitoral como 2026, é preciso lembrar que a renovação de que o Brasil precisa não nasce da antipolítica, mas de instituições fortes, lideranças responsáveis e modernização gradual

Há algo de profundamente equivocado na ideia do “novo na política” que ganhou força no Brasil desde as chamadas Jornadas de Junho de 2013, a série de mobilizações em massa que ocorreram por todo o País naquele ano, que abriram caminho para o arrefecimento do lulopetismo à época e escancararam as portas para o bolsonarismo no ciclo seguinte. O adjetivo, que deveria evocar aprimoramento e modernização da política e das instituições brasileiras, acabou sequestrado por uma retórica de terra arrasada, cujo princípio básico era negar a própria política – e, portanto, a própria democracia, tal como a conhecemos – como forma de organização da vida nacional.

Passado o choque, o Brasil tem a chance de resgatar o verdadeiro sentido do novo na política. Nada tem a ver com o exotismo performático de candidatos que se vendem como salvadores, mas que entregam desordem. Tampouco com a promessa de rupturas impossíveis ou soluções mágicas, alimentadas pelo legítimo sentimento de frustração popular com a “classe política”, associada ao desgaste provocado pela polarização tão virulenta quanto estéril entre Lula da Silva e Jair Bolsonaro. O novo de que o País precisa é menos ruidoso, mais trabalhoso e muito mais transformador: um novo que modernize práticas, racionalize políticas públicas e reinvente, sem destruir, as relações entre os Poderes. Que reconheça os limites reais do sistema político, mas trabalhe de forma consequente para aprimorá-lo.

Tal fenômeno não é exclusivamente brasileiro. A antipolítica floresce quando a representação democrática passa a ser vista não como instrumento de mediação, mas como fraude permanente. O resultado desse experimento histórico está à vista: a ascensão de outsiders cuja principal promessa era “mudar tudo o que está aí”, ainda que isso significasse destruir o que existe sem colocar nada viável no lugar. O bolsonarismo, com seu populismo autoritário, foi apenas a expressão mais acabada desse surto antipolítico; Pablo Marçal e outros epígonos dessa lógica são sua versão caricatural.

No livro Populism: A Very Short Introduction (Populismo: Uma Brevíssima Introdução), o cientista político holandês Cas Mudde, hoje um dos principais estudiosos do extremismo e do populismo na Europa e nos EUA, argumenta que o populismo autoritário ganha força quando lideranças reivindicam representar sozinhas a vontade do “povo puro” contra uma “elite corrupta”, combinando moralismo, autoritarismo e exclusão. Populistas autoritários se alimentam das frustrações reais de sociedades desiguais, mas que retornam ao eleitor apenas ilusões perigosas: a crença de que um líder forte resolverá questões complexas sem freios e contrapesos.

Pois o desafio é qualificar a política, não negá-la. Isso exige reconstruir confiança, fundamento de qualquer projeto nacional sério. Confiança não nasce do populismo, e sim de instituições previsíveis, políticas econômicas responsáveis e lideranças capazes de dizer a verdade ao eleitorado, ainda que ela seja incômoda. A tarefa do verdadeiro novo na política é justamente canalizar essa insatisfação para projetos concretos de melhoria incremental, que não desperdicem energia com aventuras e se concentrem em resolver problemas reais com racionalidade econômica e compromisso democrático.

A modernização de que precisamos não exige menos política, e sim mais: mais capacidade técnica, mais transparência, mais responsabilidade no trato com o dinheiro público. Exige coragem para enfrentar privilégios arraigados, mas também para explicar ao cidadão que reformas estruturais não se fazem da noite para o dia. Exige que o Estado seja capaz de planejar, avaliar e corrigir rumos, e que o País abandone de vez a ideia infantilizada de que governar é exibir indignação e promover divisões.

Para o Brasil e seus desafios, o novo não estará em figuras folclóricas nem em slogans de ocasião, muito menos na repetição de velhos modelos, e sim na disposição de reencontrar a política como instrumento de construção coletiva. Trata-se de recuperar o valor da experiência aliada à inovação, da responsabilidade fiscal aliada à sensibilidade social, do diálogo institucional aliado à firmeza de propósito. Não é pouco. E, no entanto, é exatamente o que separa sociedades maduras de nações condenadas a repetir seus erros. Um alerta especialmente importante num ano eleitoral como 2026.

Dificuldade institucional de gerar bem-estar

Por O Estado de S. Paulo

Estudo da Fundação Dom Cabral mostra que as instituições brasileiras são pouco capazes de criar bem-estar, embora o Brasil invista mais por habitante do que a média da OCDE

O Centro de Gestão Pública da Fundação Dom Cabral formulou um indicador, o Índice de Capacidades Institucionais (ICI), que serve para medir a relação entre as capacidades institucionais do País e a criação de bem-estar social. E nisso, também, o Brasil vai mal.

Na comparação com uma amostra de 145 países, o Brasil registra um índice de capacidade (0,484) muito abaixo de grupos como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que tem 0,672, embora ligeiramente acima da média da América Latina (0,417). Com a média dos dois grupos agregada (0,520), o Brasil continua atrás. O estudo evidencia que o País gasta mais por habitante do que os integrantes da rica OCDE, mas faz uma gestão pior dos recursos.

O ICI é calculado por modelos estatísticos que medem a qualidade de três componentes: instituições, gestão pública e ambiente de negócios. O índice revela uma dificuldade crônica em transformar orçamento em serviços públicos eficientes.

Não admira que, diante do cenário atual do País, a qualidade das instituições tenha despontado com a menor pontuação. Isso indica, de acordo com o estudo, que o bem-estar que poderia ser gerado com o nível de renda produzido no País está sendo minado pela baixa capacidade institucional. Destacam-se, entre os tópicos que compõem o nível de qualidade institucional, os resultados abaixo da média em controle da corrupção, qualidade da segurança pública e da regulação.

Em entrevista ao jornal Valor, Humberto Falcão Martins, professor da Fundação Dom Cabral e um dos especialistas que trabalharam no cálculo do índice, disse que, apesar do avanço dos órgãos de controle nas duas últimas décadas, chama a atenção como a corrupção, o mau funcionamento dos níveis de governo federal, estadual e municipal e o ambiente de negócios agravam a deteriorada qualidade institucional brasileira.

São temas que deveriam nortear o debate público a menos de um ano de mais um processo eleitoral para a Presidência da República e os governos dos Estados. A reforma administrativa, que atravessa um claudicante percurso no Congresso Nacional e, para muitos analistas, corre alto risco de não acontecer, é citada por Martins como um fator de capacitação para fazer com que o Estado use de forma mais eficiente e proveitosa para a população os recursos públicos.

O ICI aponta que a qualidade da gestão pública é diretamente proporcional ao desenvolvimento, ou seja, sem uma gestão pública capaz, não é possível um país se desenvolver e gerar qualidade de vida à sua população. “Esse país pode até enriquecer, como acontece com alguns países produtores de commodities, por exemplo, países produtores de petróleo, mas esse enriquecimento não se traduz em qualidade de vida à sua população”, ressalta o trabalho. Nesse quesito, a gestão pública do Brasil (0,616) está ligeiramente acima da média da dos países da América Latina (0,533), mas bem abaixo do índice médio da OCDE (0,777).

O índice geral reflete uma visão ampla, baseada em 68 indicadores. Análises comparativas por faixa de renda apontam para a existência de alguns países que mesmo com um maior ICI não conseguem alcançar um nível de desenvolvimento condizente. Isso pode confirmar teorias como a da chamada armadilha da renda média, que, de acordo com os autores do estudo, aparece de forma muito clara em relação ao Brasil.

O diagnóstico é de que o País precisa avançar em diversas frentes para alcançar maior desenvolvimento, em particular no fortalecimento das instituições. Mas há outras batalhas. No componente de gestão pública, por exemplo, a pior pontuação foi na performance governamental. Já no que diz respeito ao ambiente de negócios, os itens mais mal avaliados foram qualidade do crédito, exportações e produtividade da mão de obra. Em todos, o Brasil é o pior país quando comparado aos de média-alta renda, o que a esta altura deveria ser inaceitável.

Trump e a tentação do atalho

Por O Estado de S. Paulo

A Ucrânia acena à cessão de território, mas sem garantias a guerra apenas muda de forma

A reunião entre os presidentes dos EUA, Donald Trump, e da Ucrânia, Volodmir Zelenski, entregou o que se esperava. Não houve acordo, ruptura ou anúncio decisivo. Houve continuidade. Em um conflito marcado por ilusões diplomáticas e atalhos retóricos, manter o processo em movimento já é, paradoxalmente, um resultado.

O encontro expôs a assimetria que estrutura as negociações. Zelenski não negocia para vencer, mas para evitar a derrota. Seu objetivo é impedir que a Ucrânia seja coagida a uma paz que apenas congele o conflito e preserve as condições para uma nova agressão russa. Trump quer encerrar a guerra, não necessariamente resolvê-la bem. O fim do conflito tem, para ele, valor político próprio, independentemente da solidez do arranjo que o sustente.

Essa diferença de incentivos explica por que a pressão recai sobre Kiev. Para a Casa Branca, a guerra é um estorvo estratégico; para a Ucrânia, é uma questão existencial. Ainda assim, Kiev deu um passo relevante ao sinalizar abertura para discutir concessões territoriais como parte de um cessar-fogo, desde que ancoradas em garantias de segurança duráveis e juridicamente vinculantes. Ao fazê-lo, voltou a demonstrar que não é o obstáculo à paz.

O ditador russo, Vladimir Putin, não estava à mesa, mas moldou o ambiente da conversa. Sua estratégia segue inalterada: prolongar a guerra, simular abertura diplomática e explorar fissuras no campo ocidental. Moscou aposta menos em avanços decisivos no campo de batalha do que no desgaste do apoio à Ucrânia. Cada rodada inconclusiva, cada ambiguidade ou sinal de impaciência em Washington são tratados como ativo estratégico.

Trump atua nesse jogo como um mediador pouco confiável. Sua diplomacia personalista, avessa a detalhes técnicos e sensível à encenação de força, cria um terreno fértil à manipulação. O risco não está apenas em concessões explícitas, mas no enquadramento do debate: quando a paz se torna um fim em si, dissociado das condições que a tornam durável, o agressor ganha vantagem antes mesmo de negociar.

O nó central se mantém: garantias de segurança. A viabilidade de qualquer acordo depende menos da extensão das concessões ucranianas – que já avançaram além do politicamente confortável – do que da credibilidade dessas garantias e da disposição americana de sustentar a dissuasão. Cessões territoriais sem proteção efetiva não encerram a guerra; só a adiam.

As perspectivas são pouco animadoras. O mais provável é a continuidade de negociações arrastadas, combinadas a uma guerra de atrito que favorece Moscou. Um segundo cenário é uma “paz suja”: concessões apressadas, sem garantias críveis, que plantariam as sementes de um conflito futuro. A solução desejável é, lamentavelmente, a menos provável: uma paz sustentada por compromissos claros e verificáveis exigiria de Trump um grau de disciplina estratégica e clareza moral que ele jamais demonstrou.

Encerrar a guerra a qualquer custo é tentador. Mas encerrá-la mal custará mais caro. Uma paz que normalize a agressão e confunda realismo com resignação não estabiliza a Europa nem reduz riscos globais. Só prepara a crise seguinte, provavelmente mais aguda.

Socorro ambiental deve ser prioridade em 2026

Por Correio Braziliense

É dever dos candidatos à Presidência da República, aos estados e ao Poder Legislativo apresentar um plano de governo detalhado, com medidas concretas no combate ao aquecimento do planeta

Era novembro de 2023, quando o Brasil recebeu a conclusão de uma pesquisa que, em condições ideais de temperatura e pressão, deveria motivar um profundo debate público. Pesquisadores do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) identificaram, pela primeira vez na história do país, uma região árida, no bioma nordestino da Caatinga.

Até então, o Brasil só tinha conhecimento de regiões semiáridas. A mudança de classificação significa que, na prática, aquele território tem uma demanda atmosférica superior à chuva que recebe. Isso representa períodos de seca muito mais agressivos para a população local — como mostra reportagem publicada no último domingo (28) no jornal britânico The Guardian.

A publicação visitou a cidade de Macururé, de aproximadamente 10 mil habitantes, no estado da Bahia. Lá, pessoas ouvidas pela reportagem contam como suas realidades mudaram profundamente nas últimas décadas. Sem água para agricultura de subsistência, a população é obrigada a gastar mais dinheiro para conseguir alimentos para si e para a criação de caprinos, principal modo de ganhar a vida em Macururé. Um decréscimo econômico que causa fome e mata sonhos.

Realidade parecida foi amplamente dissecada pelo Estado de Minas na série de reportagens Veredas Mortas, publicada em julho de 2024. A reportagem percorreu cenários da célebre obra de Guimarães Rosa para mostrar que onde o autor descrevia "a mais bela" cabeceira de água não sobra uma gota sequer para matar a sede durante os períodos de estiagem.

Diante disso, o combate às mudanças climáticas precisa ser tema prioritário nas eleições do próximo ano. É dever dos candidatos à Presidência da República, aos estados e ao Poder Legislativo apresentar um plano de governo detalhado, com medidas concretas no combate ao aquecimento do planeta.

Ainda que o Brasil tenha uma das matrizes energéticas mais renováveis do planeta, baseada em usinas hidrelétricas, solares e eólicas, urge ressaltar que um país continental como o nosso encara diferentes realidades. A abundância encontrada nas cidades economicamente desenvolvidas não faz parte da rotina dos sertões espalhados a partir do norte de Minas até a Região Nordeste, passando também pelo bioma do Cerrado, amplamente arrasado pelo desmatamento nos anos recentes.

Se a COP30 terminou sem um caminho definido para os combustíveis fósseis — diante dos desafios de tecnologia, investimento e de vontade política que se impõem —, a população brasileira precisa cobrar de quem se coloca nas urnas alguma resposta prática para o problema. Ao menos, um caminho a ser seguido, com metas claras e gatilhos punitivos para o não cumprimento delas.

É evidente que tal solução passa por um compromisso global de combate ao aquecimento do planeta, mas isso não exclui a necessidade de discutirmos mais seriamente um meio ambiente mais sustentável internamente.

Sim, o Brasil precisa de apoio de nações mais ricas para continuar nadando contra a corrente, defronte as feridas abertas pelo colonialismo, mas quando medidas ambientais foram discutidas seriamente em debates políticos em nosso país?

É preciso entender que falar de saúde, mobilidade e habitação se torna impossível sem debater sobre a emissão de gases do efeito estufa no cenário atual — apenas para citar três áreas extensivamente disputadas por candidatos e diretamente atingidas pelo problema. Já passou da hora de repensarmos o funcionamento da nossa sociedade em prol de algum futuro — de preferência mais justo, transparente e com oportunidades iguais para todos.

Adeus Ano Velho, Feliz Ano Novo

Por O Povo (CE)

Chegamos ao último dia de 2025, mais um ano que deixa atrás de si marcas importantes e que apontam para um novo tempo desafiador no 2026 que começa a ser vivenciado amanhã, 1º de janeiro. Como é normal que aconteça, o balanço do período aponta avanços e retrocessos, ganhos e perdas, nos cabendo agora fazer a melhor análise dele para tirar as lições necessárias já com os olhos voltados para o que está por vir.

A sociedade brasileira foi muito testada nos últimos 364 dias. Com destaque evidente para o que aconteceu na área política, diante do momento histórico representado pela esperada conclusão do julgamento, no Supremo Tribunal Federal (STF), dos núcleos centrais e considerados decisivos de um movimento que, entre os anos de 2022 e 2023, quase levou ao rompimento da democracia no País.

Claro que o ambiente ainda é tenso. Seria ingenuidade dar a situação crítica por superada, completamente, mas o ano finda com sinais importantes de que temos sido capazes de absorver sem traumas maiores uma ação muito firme de instâncias como o Ministério Público e o Judiciário para dar uma resposta à situação no nível grave que ela carrega como símbolo. A democracia brasileira segue de pé, com suas imperfeições e problemas.

Gente grande, de ex-presidente da República a oficiais de alto patente, com responsabilidade comprovada com os fatos graves daquele período ao longo das investigações receberam as punições devidas e, no nosso entendimento, justas.

Quem discorda se manifesta de maneira crítica, muitas vezes até com algum excesso, ocupando espaços parlamentares, na mídia e onde mais seja possível, como é normal que aconteça no ambiente de liberdade política que concretamente vivenciamos, apesar da ideia central que se tenta emplacar de que o direito à opinião estaria sendo tolhido no momento do País. Há uma realidade que nega isso de maneira límpida.

Outra área seriamente testada no 2025 do qual nos despedimos nesta quarta foi a segurança pública. Um quadro nacional, diga-se, embora aqui, no Ceará, o governo conclui o ano pressionado por números e estatísticas que indicam uma situação muito distante do que poderia representar aquilo que a população considera aceitável. A resposta à ousadia de facções criminosas que atuam no Estado com aspectos próprios, e mais graves, não está sendo suficiente para melhorar a sensação de segurança dos cearenses e das cearenses.

Foi um ano no qual a economia comportou-se bem, mesmo que ainda distante do que entendemos como ideal, no qual a agricultura beneficiou-se de um inverno regular, em que a educação continuou nos oferecendo motivos de orgulho aos olhos do País, enfim, se encerra uma etapa do calendário que, como dito inicialmente, esteve marcado por boas e más notícias. É aguardar que a nova etapa que amanhã se inicia traga com ela mudanças reais que permitam a prevalência das manchetes positivas quando tivermos que fazer o próximo balanço, daqui a um ano. 

 


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