- Valor Econômico
No mercado há quem defenda acelerar o corte da Selic
O comportamento da atividade econômica ainda é errático. Excluindo o crescimento exuberante da agricultura, a performance dos demais setores no primeiro trimestre tende a ser negativa. A inflação desaba. Com juros e câmbio constantes, o IPCA cairia para 3,6% este ano e para 3,3% em 2018, conforme correção feita anteontem, pelo Banco Central, no relatório de inflação divulgado no fim de março. Com taxa de juros e câmbio do relatório Focus, o IPCA cai para 4% este ano e para 4,5% no próximo.
Cresce, nesse ambiente, o coro dos que consideram, no mercado, que há espaço para o Banco Central acelerar o corte da taxa básica de juros para além dos 100 pontos base. Ontem pelo menos uma instituição, BBM Investimentos, aumentou de 100 para 150 pontos o tamanho do corte da Selic esperado para a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), nos dias 11 e 12. Oficializou, assim, o que antes era a opinião de um dos seus diretores, Marcelo Mendes de Castro, externada na última reunião com o presidente do BC, Ilan Goldfajn.
A própria correção que o BC fez nos prognósticos de inflação para este e para o próximo ano com juros e câmbio constantes, que levaria a uma taxa de inflação muito aquém da meta de 4,5% para 2018, seria uma justificativa para redimensionar a decisão do comitê na semana que vem, disse uma fonte do mercado.
Como no último relatório de inflação o BC mencionou a possibilidade de "intensificação moderada do ritmo de flexibilização da política monetária", porém, não se disseminou no mercado a possibilidade de surpresas na reunião do Copom, quando se espera que a Selic caia de 12,25% ao ano para 11,25% ao ano. A partir daí, no entanto, o ritmo de corte poderia ser reavaliado para se chegar mais rapidamente à taxa de juros neutra (que o mercado calcula em torno de 5,5% em termos reais), como disseram a esta coluna três de cinco ex-dirigentes do BC consultados. Dos outros dois, um considera que o BC está correto e o outro, que mesmo havendo margem ele não acelerará o passo que acabou de definir no relatório de inflação, que é o de cortes de 100 pontos nas próximas reuniões do comitê.
Uma coisa, portanto, é fontes do mercado identificarem espaço para intensificar a queda dos juros. Outra é o Copom decidir por essa alternativa. Mesmo quem enxerga margem para dois cortes de 150 pontos nas reuniões de maio e julho, que derrubariam os juros para 8,25% ao ano, têm dúvidas sobre se o comitê mudaria o passo. O prognóstico é que na próxima reunião ele ao menos não feche questão como fez no relatório de inflação, ao delimitar a "intensificação moderada" dos cortes.
Por outro lado, as próximas semanas são cruciais para se ter uma ideia mais precisa sobre qual a reforma da previdência que o Congresso está disposto a aprovar. O mercado havia colocado nos preços dos ativos uma votação mais fácil para o governo, inspirado na rapidez com que foi aprovada a PEC do teto do gasto. Nos últimos dias está ficando claro que a negociação mudará vários aspectos da reforma e isso começou a pressionar juros e câmbio. A economia política recomendaria um Banco Central mais conservador, pois o risco de o Copom agir e o resto do governo se acomodar "é parte de uma doença global", disse um ex-dirigente do BC.
Há um outro aspecto inquietante, relativo ao custo do dinheiro para o tomador final. Apesar da queda de 200 pontos básicos da Selic de outubro para cá, quando a taxa saiu de 14,25% ao ano para 12,25% ao ano, o spread bancário não cedeu. Resultado da diferença entre a taxa que os bancos pagam na captação e o que cobram na aplicação, o spread, ao contrário, está em alta.
Para o crédito livre, o spread, que era de 32% ao ano em dezembro de 2015, subiu para 41,1% em setembro de 2016 e, a despeito do corte da Selic a partir de outubro, aumentou para 42,5% em fevereiro. A elevação ocorreu tanto para pessoas jurídicas (de 15% para 17,9% e para 18,3% nos três períodos, respectivamente) quanto para pessoas físicas (passou de 48% para 60,9% e, agora, para 62,3%)
Os bancos não parecem dispostos a expandir a oferta de crédito ao longo deste ano e um dos argumentos é o de que não há demanda, pois famílias e empresas continuam em processo de desalavancagem. Outra explicação é que a recuperação da economia será bastante lenta e a oferta de emprego vai demorar a aparecer. Isso significa que a inadimplência pode permanecer alta ainda por algum tempo.
Não será pelo aumento do crédito, portanto, que a economia vai reagir. O que se espera nesse início é que recuperação ocorra mais por reposição de estoque. Os dados do primeiro trimestre não estão lá muito animadores e o único estímulo à mão para a atividade econômica seria o juro desde que, é claro, caia o custo para o tomador final.
Não é útil, a essa altura, julgar se o BC foi tímido ou tardio no início do ciclo de redução dos juros, superestimando a resistência inflacionária.
Se os fatos comprovarem que há um aperto monetário além da conta para colocar a inflação na meta, caberá ao Banco Central recalibrar a intensidade e a extensão do ciclo de afrouxamento. Aí está uma boa discussão.
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