DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Derrota de Gordon Brown para um político claramente menos preparado não é certa, mas infelizmente é provável
Derrota de Gordon Brown para um político claramente menos preparado não é certa, mas infelizmente é provável
O Partido Conservador continua favorito nas eleições de 6 de maio no Reino Unido e, provavelmente, David Cameron será o novo primeiro-ministro britânico, embora sua vantagem sobre o Partido Trabalhista, de Gordon Brown, seja pequena. Comparados os dois programas, analistas chegam a duas conclusões: primeira, as diferenças são pequenas; segunda, nenhum dos dois partidos tem uma resposta clara sobre o que fazer com o deficit público do país, que neste ano será de 11% do PIB, e, mais amplamente, com a crise financeira.
Brown tem contra ele o desgaste de 16 anos de governo trabalhista; a desastrosa decisão de seu primeiro-ministro anterior, Tony Blair, de participar da Guerra do Iraque; e o fato de não haver conseguido dar uma resposta decidida à crise global, que atingiu principalmente seu país. Vale, entretanto, observar que, em meio à crise, Brown teve a coragem de aumentar impostos, enquanto os analistas de economia do país concordam que, do ponto de vista fiscal, a proposta de Cameron de reduzi-los não é viável.
O Partido Trabalhista é um partido social-democrata que, ao assumir o governo, em 1997 -em uma década em que a hegemonia ideológica neoliberal havia alcançado o pináculo devido ao colapso da União Soviética à época-, propôs-se a modernizar a social-democracia por meio da proposta de uma Terceira Via.
Na Europa, onde o centro político sempre esteve mais à esquerda do que no Reino Unido, a esquerda rejeitou a proposta, porque via nela um grau alto demais de concessão ou de compromisso com as ideias liberais. O fato, porém, é que a social democracia exigia um duplo "aggiornamento": dado o aumento da concorrência dos países de mão de obra barata, os países ricos e social-democratas precisavam, primeiro, transferir sua própria mão de obra para setores mais sofisticados do ponto de vista tecnológico, que exigem trabalhadores mais qualificados e pagam melhores salários; e, segundo, tornar mais eficiente a prestação dos grandes serviços públicos de caráter social -educação e cuidados de saúde principalmente- para poder pagar salários mais altos.
Blair e seu ministro das Finanças, Gordon Brown, compreenderam que esse era o problema fundamental e não hesitaram em enfrentá-lo. Tornaram mais flexíveis as leis trabalhistas, possibilitando a redução dos salários para tornar as empresas mais competitivas.
Compensaram esse prejuízo com o aumento da carga tributária para financiar os serviços sociais de saúde e educação ao mesmo tempo em que se dedicavam à reforma gerencial desses serviços para torná-los mais eficientes.
Os resultados dessa política foram positivos, mas necessariamente contraditórios. Enquanto o aumento do gasto social contribuía para diminuir a desigualdade, a flexibilização das leis de proteção ao trabalho levava ao aumento dessa desigualdade. Por outro lado, para garantir o papel central de Londres nas finanças globais, o governo neoliberal de Margaret Thatcher havia desregulado o mercado financeiro em 1986, e os trabalhistas nada fizeram para reverter essa medida irresponsável.
Em consequência, quando, em 2008, a crise financeira global se desencadeou, ela atingiu de maneira frontal o Reino Unido. Brown, que assumiu o governo à véspera da crise, em 2007, tomou medidas competentes e corajosas para enfrentá-la, mas essas medidas não foram suficientes para garantir sua reeleição. Sua derrota diante de um político claramente menos preparado não é certa, mas infelizmente é provável.
Luiz Carlos Bresser-Pereira, 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Globalização e Competição".
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