segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Marina e PV anunciam 'independência' no 2º turno

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Partido não apoiará formalmente nenhum dos candidatos, mas integrantes da legenda podem fazer campanha

Em carta aberta aos candidatos Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB), a senadora Marina Silva (PV) declarou "independência" no segundo turno das eleições. O PV acompanhou a decisão e não apoiará formalmente nenhum candidato. Na prática, os filiados ao PV não estão proibidos de fazer campanha para nenhum dos candidatos, desde que não portem símbolos do partido em eventos públicos. Ontem, Marina fez duras críticas ao PT e ao PSDB pelo tom da campanha no segundo turno. Ela classificou as duas legendas como "fiadores do conservadorismo renitente" - o apoio estava condicionado à convergência de programas de governo. Dos 92 membros do PV presentes à plenária, apenas quatro votaram pelo apoio explícito a Serra ou a Dilma.

Marina rejeita acenos de adversários e declara "independência" no 2º turno

Senadora do PV, que obteve cerca de 20 milhões de votos no primeiro turno da disputa presidencial, faz duras críticas ao PT e ao PSDB pelo tom adotado na campanha e classifica as duas legendas como "fiadores do conservadorismo renitente"

Roberto Almeida

Em carta aberta aos candidatos Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB), a senadora Marina Silva (PV), que ficou em terceiro lugar no primeiro turno das eleições presidenciais, declarou "independência" no segundo turno. O PV, por ampla maioria, acompanhou a decisão de Marina e não apoiará formalmente nenhum dos dois candidatos - o que não impede que integrantes do partido o façam.

A mensagem de Marina foi lida ontem na plenária do PV, realizada na capital paulista. A senadora, que obteve cerca de 20 milhões de votos no dia 3, fez críticas ao PT e ao PSDB pelo tom da campanha no segundo turno. Classificou as duas legendas como "fiadores do conservadorismo renitente".

O apoio do Marina a Dilma ou Serra estava condicionada à convergência de programas de governo. Os verdes, no entanto, consideraram "fracas" as respostas dadas pelas campanhas adversárias à "Agenda por um Brasil Justo e Sustentável" - lista de 42 compromissos apresentada pelo PV.

Apesar das críticas, Marina avaliou que o PT apresentou respostas melhores que as do PSDB à demanda verde. "Tivemos acolhimento parciais nas duas respostas que nos foram enviadas", disse ela. "Identificamos, para ter senso de justiça, na resposta enviada pelo PT, um maior acolhimento."

A senadora verde, porém, preferiu definir-se como "mantenedora de utopias" e não declarou em quem votará no dia 31. "É secreto, me reservo a meu direito de eleitora", esquivou-se.

"Quero afirmar que o fato de não ter optado por um alinhamento neste momento não significa neutralidade em relação aos rumos da campanha. Creio mesmo que uma posição de independência, reafirmando ideias e propostas, é a melhor forma de contribuir com o povo brasileiro", discursou a ex-candidata.

Com essas palavras, que reforçam um provável cenário de terceira via para as eleições presidenciais de 2014, Marina passou a fazer uma crítica ao "caráter dualista" da política nacional. Ela afirmou a existência de uma "ironia histórica" no duelo entre petistas e tucanos.

Embates. Na carta, a senadora comparou a disputa travada entre PT e PSDB nos últimos 16 anos aos embates entre monarquistas e republicanos, entre UDN e PSD - que dominaram a política nas décadas de 1940 a 1960 - e entre MDB e Arena, durante o regime militar. "Dois partidos nascidos para afirmar a diversidade da sociedade brasileira, para quebrar a dualidade existente à época de suas formações, se deixaram capturar pela lógica do embate entre si até as últimas consequências", observou.

Na visão de Marina, o posicionamento "pragmático" dos dois partidos é uma "armadilha para a qual ambos caem e levam o País". "O grande nó está na política, porque é nela que se decide a vida coletiva, se traçam os horizontes, se consolidam valores ou a falta deles", sublinhou.

Ao final, em entrevista, Marina descartou a hipótese de participar em um futuro governo, independentemente de coloração partidária.

Instruções. Dos 92 membros do PV presentes à plenária de ontem, apenas quatro votaram pelo apoio explícito a Serra ou Dilma, afirmou Maurício Brusadin, presidente do PV paulista.

Dois deles são secretários da Prefeitura de São Paulo: Eduardo Jorge, do Meio Ambiente, e Marcos Belizário, da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida. Completam a lista de dissidentes do posicionamento de Marina a presidente estadual do PV no Espírito Santo, Sidnéia Fontana, e um outro correligionário que não foi identificado pelos presentes.

Na prática, os filiados ao PV não estão proibidos de fazer campanha para Serra ou Dilma, desde que não portem símbolos do partido em eventos públicos para não causar constrangimento à decisão nacional.

O vice-presidente do PV, deputado eleito Alfredo Sirkis (RJ), disse que não há como fiscalizar o cumprimento da definição, amparada por documento interno do partido, mas pediu ajuda da imprensa e de correligionários para identificar traidores.

Para as disputas de governo estadual, onde o partido é coligado e ainda há disputa de segundo turno, o apoio formal será mantido. Enquanto isso, presidentes de diretórios e porta-vozes do PV estão proibidos de declarar voto em Serra ou Dilma.

TRECHOS DA CARTA DE MARINA

"Mesmo sem concorrer, estamos no segundo turno com nosso programa, que reflete as questões aqui colocadas. Esta é a nossa contribuição para que... ...o processo eleitoral transcenda os velhos costumes e acene para a sustentabilidade política que almejamos.

Como disse, ousei trazer a vocês essas reflexões, mas não como formalidade ou encenação política nesta hora tão especial na vida do País. Foi porque acredito que há terreno fértil para levarmos adiante este diálogo. Sei disso pela relação que mantive com ambos ao longo de nossa trajetória política.

De José Serra guardo a experiência de ter contado com sua solidariedade quando, no Senado, precisei de apoio para aprovar uma inédita linha de crédito para os extrativistas da Amazônia e para criar subsídio para a borracha nativa. Serra dispôs-se a ele mesmo defender em plenário a proposta porque havia o risco de ser rejeitada, caso eu a defendesse.

Com Dilma Rousseff, tenho mais de cinco anos de convivência no governo do presidente Lula. E, para além das diferenças que marcaram nossa convivência no governo, essas diferenças não impediram de sua parte uma atitude respeitosa e disposição para a parceria, como aconteceu na elaboração do novo modelo do setor elétrico, na questão do licenciamento ambiental para petróleo e gás e em outras ações conjuntas.

(...)Por isso me atrevo, seja quem for a assumir a Presidência da República, a chamá-los a liderar o País para além de suas razões pessoais e projetos partidários, trocando o embate por um debate fraterno em nome do Brasil."

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