Lula tenta apaziguar o PT e o PMDB no Rio, para evitar um racha que pode custar caro a Dilma Rousseff em 2014
Thiago Prado
A sempre impositiva e incontrastável demiurgia eleitoral de Lula já produziu um desastre em São Paulo com a eleição de Fernando Haddad para a prefeitura com o apoio de Paulo Maluf. Nas eleições de 2014 ela vai ser testada no Rio de Janeiro, o terceiro maior colégio eleitoral do país, onde, sem maiores sobressaltos, sobrevive há quase uma década a sólida aliança entre PT e PMDB. A situação no Rio é mais complexa do que foi em São Paulo. Se forçar muito a barra para um lado ou para o outro, Lula poderá acelerar o racha entre o PT e o PMDB. produzindo como resultado indesejável o fato de deixar Dilma Rousseff sem palanque no Rio de Janeiro em sua luta pela reeleição ao Palácio do Planalto. O jogo da sucessão estadual no Rio de Janeiro caminha para a polarização. De um lado está o petista Lindbergh Farias. Do outro, o candidato do PMDB. Luiz Fernando Pezão, vice e preferido do governador Sérgio Cabral. Ambos agem como candidatos. Lindbergh reivindica o corte imediato dos vínculos do PT com o governo do PMDB, divórcio que seria teatralizado pelo pedido de demissão em massa dos 1 250 militantes petistas atualmente na folha de pagamento do governador Cabral. Pezão descreve os movimentos de Lindbergh como uma aventura inconsequente. Ambos, porém, devem estar conscientes de que não vão a lugar algum sem que seja selado um acordo em nível superior, aquele habitado por Lula e Cabral.
Nesta altura de sua carreira política, o ex-presidente e o atual governador do Rio de Janeiro têm pretensões e circunstâncias distintas. Lula precisa se mostrar à altura de sua fama de grande estrategista, o fabuloso eleitor de "postes" do PT e reeleitor de Dilma. Cabral tem na eleição de Pezão para seu lugar talvez a única chance real de manter algum prestígio político no Rio de Janeiro. O governador se desgastou tremendamente como a figura central de uma série de escândalos. Sua credibilidade desmoronou, levando junto sua popularidade, a ponto de Cabral anunciar que sairia do governo bem antes do prazo legal para não atrapalhar demais a campanha de Pezão. Lula, que fareja como poucos as fragilidades dos aliados e adversários, vem cozinhando Cabral em fogo baixo. Sua esperança é convencê-lo de que terá todo o apoio do governo Dilma para tentar se reerguer politicamente, quem sabe até concorrendo ao Senado, como ele quer, desde que abra caminho para a candidatura de Lindbergh. Lula sabe que não pode deixar Cabral à deriva, sob o risco de que a poderosa engrenagem do PMDB fluminense ignore ou até hostilize a candidata Dilma.
O Rio de Janeiro será o colégio eleitoral estratégico no xadrez de 2014. É o único entre os grandes no qual a oposição a Dilma não tem candidato fone. Em São Paulo, o tucano Geraldo Alckmin está na dianteira na disputa pelo governo: em Minas Gerais, também é dado como certo que o PSDB do ex-governador Aécio Neves, oponente de Dilma, vai ganhar com excelente margem. Outro eleitorado importante para o PT, o de Pernambuco, deverá pender para onde o governador Eduardo Campos apontar. Nesse cenário, seria suicídio político abrir mão do palanque peemedebista no Rio de Janeiro. A máquina eleitoral do PMDB fluminense é formidável. Ela é formada por 10000 cabos eleitorais muito bem abrigados em dezenas de prefeituras. Diz Jorge Picciani, presidente do PMDB no Rio: "O PT simplesmente não pode se dar ao luxo de prescindir dessa máquina".
Um bom ponto de partida para tentar antecipar o que vai ocorrer no Rio, portanto, é tomar como premissa o fato de que Lula fará de tudo para não abrir mão da máquina eleitoral do PMDB no estado. As abóboras terão de se ajeitar na carroça de acordo com essa realidade. As promessas — e as eventuais traições — serão negociadas em tomo desse, digamos, marco regulatório. Lindbergh, que hoje considera uma possível chapa única com Cabral para o Senado um "abraço de afogados", terá de ceder em algum momento aos interesses eleitorais maiores do PT. Lindbergh é mais uma das criaturas de Lula que alimentam o sonho de vida política própria sem o constante sopro do criador no pescoço. Ele vem conversando com o PSD com a ideia de oferecer ao partido a vaga ao Senado em sua chapa; ganharia assim tempo de televisão, neutralizando um pouco os efeitos de uma cisão com o PMDB. Dilma detesta Lindbergh. Refere-se a ele como "moleque" e não lhe perdoa o notório entusiasmo com o movimento "Volta, Lula". Pezão, ao contrário, é amigo e aliado antigo de Dilma. Ela já o chamou publicamente de "pai do PAC" e o trata pelo apelido familiar de "leão da montanha". E útil lembrar que o senador Aécio Neves tem cordialíssima convivência com Lindbergh, amizade pessoal com Sérgio Cabral e diálogo ameno com muitos peemedebistas fluminenses. Portanto, 2014 promete ser o ano em que o Rio de Janeiro, de alguma forma, volta a se tomar a capital política do Brasil.
Fonte: Revista Veja
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