• José Eduardo Cardozo fica na Justiça
Valor Econômico
A presidente Dilma Rousseff sabe que ninguém está entendendo nada das suas primeiras decisões na formação de um governo para exercer o segundo mandato mas não está nem aí. E não tem paciência para explicar. Dilma tem um prazer especial em driblar imprensa e partidos, diverte-se ao constatar que estão dando "um fora atrás do outro", numa espécie de brincadeira autoral que, se servir para tirá-la do isolamento no poder absoluto, já terá sido de grande valia.
É zero, inexistente mesmo, a preocupação da presidente Dilma com coerência, especialmente com a conexão entre a reforma ministerial e as teses que difundiu durante a campanha. Certamente adepta da máxima de que campanha é campanha, governo é governo, Dilma sequer cora com as críticas à sua abissal contradição. O marqueteiro até já sumiu, a presidente está reeleita e ponto final. A oposição que encontrasse um antídoto eficiente para, durante a campanha, desconstruir a desconstrução, combater as mentiras. O PT, por exemplo, não está nada incomodado com as incongruências de agora, só quer saber qual é seu novo papel, sua nova parte. Os que se antecipam a assinar notas de protesto vão ficar falando sozinhos. Dilma vai tomando a direção sem olhar para trás.
De vez em quando, mas muito de vez em quando, é possível ouvir de uma autoridade do PT que acompanha a média distância suas decisões, uma exegese dos movimentos do balé presidencial.
Ontem, foi possível perscrutar um deles e saber que Dilma se vê diante de apenas dois graves problemas a resolver logo, problemas enormes, os maiores que há, e é para enfrentá-los que montará parte do Ministério até o fim do ano. Mas provavelmente só a parte relacionada às duas dificuldades capazes de soterrar qualquer iniciativa que venha a tomar em qualquer outra área.
A primeira é a economia. Essa ela decidiu enfrentar deixando de lado questões ideológicas ou políticas até que consiga ver pelo menos o túnel à sua frente. Se mais à frente tudo tiver dado certo, trocar para quê? Pergunta-se, numa evidência de racionalidade.
Acredita a presidente que, sendo ela a condutora do governo, saberá lidar individualmente com cada um da equipe e levar todos a se entenderem em torno de um ponto que vai determinar qual é. Dilma não teme pequenos entreveros diários entre Joaquim Levy, Nelson Barbosa, Alexandre Tombini. A avaliação é que estarão no governo para consertar o estrago, e esse conserto só tem uma direção, não é preciso divergir muito.
Formará toda a equipe econômica, nela incluindo o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Armando Monteiro Neto, e a ministra da Agricultura, Kátia Abreu. Todos já convidados, confirmados e sem perigo de recuo. Kátia ficou na praça, aparentemente sujeita à chuva e ao sol inclemente, mas seu ministério está garantido e não há sinal de desconvite. Ao contrário, o que vem de Dilma é a decisão de integrar a Agricultura à área econômica e turbinar o Ministério com novos setores, inclusive os que perdeu para outras pastas.
No pacote da economia serão nomeados os presidentes de bancos públicos, mas nem isso sairá esta semana, e aqui o personagem que acompanha a presidente não vê a propalada antipatia de Dilma por Luciano Coutinho. É certo que ele não ficará no BNDES, mas não há intenção de abandoná-lo
O segundo mega problema que a presidente Dilma enfrentará neste início de formação do segundo governo é a Operação Lava-Jato e suas implicações. O governo sabe da abrangência e do poder explosivo dessa operação, pressente mais do que sabe, mas não tem o dado fundamental para levar a formação do governo adiante: o que há sobre a presidente Dilma Rousseff nas delações e quais políticos estão nela citados. O que pode haver contra a presidente? Diz-se, nas conjecturas, que pode haver algo que esteve inteiramente fora do seu controle: verba de campanha. O arrecadador de 2010 ou de 2014 pode ter recebido contribuição de qualquer uma dessas empreiteiras envolvidas no esquema de sangria da Petrobras, como vários políticos da base, ministeriáveis, também podem ter recebido. A presidente não arrecadou e não fiscalizou o carimbo do dinheiro. Mas não está livre de aparecer nos autos, como não está livre da morte. Deve se preparar para isso.
Fica difícil também convidar políticos e fazer a distribuição das cotas ministeriais aos partidos sem ter uma noção mínima de quem subirá pelo redemoinho. Lá por meados de dezembro, meados de janeiro, ou quando passar a eleição para a presidência da Câmara e do Senado, quem sabe? Há outras datas melhores para ter essa visibilidade e fazer nomeações, sem pressa.
Ao contrário da economia, em que está convencida de que é preciso trocar os timoneiros para consertar os erros, com relação ao segundo problema gravíssimo do governo, a Lava-Jato, Dilma está convencida do contrário: o governo que se inicia em janeiro terá que manter, não trocar quem comanda. Assim, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, fica no cargo. Era só o que faltava, segundo interlocutores da presidente Dilma, nomear outro diretor geral para a Polícia Federal a esta altura do campeonato de delação. Ficam o ministro, a equipe da PF, a investigação com toda a proteção possível e a presidente da Petrobras, Graça Foster. Não haveria, por essa análise, racionalidade na demissão de Graça Foster.
Com relação a tão espetacular e abrangente operação, a única providência de nomeação que a presidente Dilma tomará, neste momento, é o preenchimento da vaga disponível no Supremo Tribunal Federal, por onde transitam os processos. Um nome, com certeza, amigável.
Dilma começa assim, o resto soluciona aos poucos. Há quem defenda que ela consolide logo, também, o núcleo político dirigente do governo no Palácio do Planalto, para o qual só falta encaixar uma peça. Aloizio Mercadante na Casa Civil, Ricardo Berzoini nas relações com o Congresso e Miguel Rossetto na Secretaria-Geral já estão com papeis definidos, mas formam um grupo beligerante demais, intragável até para os partidos aliados, não teriam condições de ajudar Dilma a fazer política. Essa pessoa que falta é Jaques Wagner, que, no modelo, não poderia ficar preso em nenhum dos gabinetes do Palácio do Planalto. Procura-se, para ele, um ministério adequado que, inclusive, o deixe livre para fazer política ao lado da presidente.
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