• Documento com diagnóstico certeiro da crise e prescrições corretas não é debatido como deveria. Mas fingir que não há os problemas não os faz desaparecer
Aproxima-se o fim do primeiro ano de Dilma 2, e a crise fiscal, antevista há muito tempo, mas só admitida pela presidente depois da vitória eleitoral em outubro do ano passado, continua a avançar sem que seja tomada qualquer medida mais efetiva, como é crucial, para se começar a reverter o quadro de maneira consistente.
Admita-se que há um cenário político nada amigável turbinando as dificuldades econômicas. Não apenas devido à impopularidade de Dilma — justificável, por ela ter desmentido na prática o que dissera dos palanques na campanha —, mas também por ser obrigada a ir contra dogmas seus e do PT, para consertar o desastre que ela mesma patrocinou, também inspirada pelo pensamento econômico do partido.
Ao destroçar o equilíbrio fiscal, Dilma criou uma difícil herança maldita para si mesma. Sucumbiu à ilusão de acelerar a economia por meio de subsídios de crédito bancados pelo Tesouro, assim como de tarifas de energia. Estrangulou a Petrobras também pelo congelamento de preços, e não deu a devida importância a uma inflação persistentemente alta e à necessidade de acumular efetivos superávits primários.
Ela acertou ao colocar no Ministério da Fazenda um economista do ramo, Joaquim Levy, secretário do Tesouro no primeiro governo Lula, quando também foi necessário um ajuste fiscal, e dele Levy participou, com êxito, na equipe do ministro Antonio Palocci.
Mas agora a situação é pior, porque não se trata apenas de manejar com eficiência as políticas fiscal (gastos) e monetária (juros). Como, a partir do final do primeiro mandato de Lula, e com Dilma na Casa Civil, a política econômica passou a ser a do partido, do velho PT — “desenvolvimentista”, dirigista —, os gastos públicos foram elevados ao extremo, sem qualquer cuidado, e o país quebrou em moeda nacional. Não como acontece com frequência no Brasil, pela falta de divisas externas. A quebra foi em reais.
O PMDB acaba de divulgar o documento “Uma ponte para o futuro”, com um diagnóstico preciso da crise e um esboço de ações na direção correta. Mas criou-se algo como um cinturão de silêncio em torno do texto. O PT silencia porque não concorda, mas não deseja criar mais tensões com o PMDB, diante das ameaças de impeachment da presidente. Pela mesma razão, finge não serem graves as denúncias contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A oposição também não fala, porque se dedica apenas ao projeto do impedimento de Dilma.
Enquanto isso, questões fundamentais não são debatidas. Pior, nada se faz para desfazer o imbróglio, de causas estruturais, em que o país foi colocado pelo lulopetismo. É a clássica tática do avestruz. Mas enfiar a cabeça no chão não para a evolução dos fatos. Até piora a crise, pela degradação das percepções dos agentes de mercados e consumidores. Não se investe, não se compra.
Só no dia 1º de janeiro, quando entrar em vigor o novo salário mínimo, com 10% de aumento, haverá um tal impacto nos gastos que Levy precisará encontrar zonas de cortes e tentar aumentar a arrecadação, para tapar este rombo adicional, estimado em 0,2% do PIB.
Isso porque parte ponderável do Orçamento está indexada ao salário mínimo ou inflação. Bem como há uma enorme conta de gastos vinculados a despesas específicas (Saúde e Educação, por exemplo). Assim, não é possível executar o ajuste fiscal de que se necessita. É por isso que as despesas crescem mais que a renda e o PIB, rumo à hecatombe fiscal. Mesmo a rota de fuga do aumento de impostos está obstruída, pois a carga tributária encontra-se nos píncaros dos 36%. Isso precisa ser discutido, queiram ou não Dilma e PT. A realidade se imporá de alguma forma. Melhor que seja de maneira organizada.
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