Por Ricardo Mendonça | Valor Econômico
SÃO PAULO - Após reconhecer que cabe ao Supremo Tribunal Federal (STF) decidir pela "conveniência" de recolocar em discussão o entendimento sobre execução de pena após condenação em segunda instância, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, disse ontem que há "perplexidade intelectual" dos brasileiros diante do comportamento da corte sobre o tema.
Na última vez que se debruçou sobre o assunto, o STF decidiu, por 6 votos a 5, que cabe prisão após condenação em segunda instância. Para muitos, porém, esse entendimento contraria o item LVII do Art. 5 da Constituição, segundo o qual "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".
Pelo menos um ministro que votou a favor da execução, Gilmar Mendes, diz que mudou de ideia e hoje votaria contra. Se o caso voltar à pauta, o que tem sido evitado pela presidente da corte, Cármen Lúcia, é o suficiente para inverter o placar. Além disso, outros membros do STF, em decisões individuais, têm concedido habeas corpus a favor de condenados em sentido oposto ao da decisão colegiada.
O tema ganhou importância política após a confirmação da condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Líder nas pesquisas para presidente, o petista poderá ser preso nos próximos dias, assim que os desembargadores do TRF-4 esclarecerem as últimas dúvidas jurídicas sobre a sentença condenatória. Se o STF mudar seu entendimento sobre o tema antes disso, porém, Lula ganha a garantia de continuar podendo recorrer em liberdade.
"Para o advogado e para a sociedade civil, a dúvida que fica é essa: dois ou três ministros já concederam mais de 70 liminares em habeas corpus contra a decisão de 6 a 5 [do STF]. Então há, sim, eu diria uma perplexidade intelectual, uma dúvida política natural da sociedade brasileira, para saber se esse 6 a 5 continua ou se vira 8 a 3, 7 a 4 ou 6 a 5 no sentido inverso", disse Torquato.
O ministro afirmou ainda que, pessoalmente, é a favor da execução pós-segunda instância. Mas reconheceu que "é da inteira legitimidade dos atores políticos, da imprensa, dos interessados, quererem que o tribunal afirme ou reafirme a decisão". "As 70 liminares geram dúvida", completou.
Torquato deu as declarações após participar de um painel sobre corrupção no Fórum Econômico Mundial na América Latina, em São Paulo. Em sua apresentação, ele estimou que a Lava-Jato apura só 10% da corrupção do país. Algo distante do noticiário, "e muito mais sério", ocorre cotidianamente nos Estados e nos municípios, disse.
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