Mercado vê com certo alívio voto de confiança do presidente Jair Bolsonaro ao ministro da Economia, mas ativos ainda sofrem com crise política
Marcelle Gutierrez, Marcelo Osakabe, Victor Rezende e Ana Carolina Neira e Lucas Hirata | Valor Econômico
SÃO PAULO - Depois de muita apreensão nos últimos dias, o mercado viu com certo alívio o voto de confiança dado pelo presidente Jair Bolsonaro ao ministro da Economia, Paulo Guedes. Embora a crise política esteja longe do fim, a reaproximação ajudou a reverter parte das preocupações dos investidores sobre a derrocada das políticas do economista e até de uma substituição no cargo. O dia foi de recuperação para o Ibovespa, após o tombo de 5,45% na sexta-feira, mas não suficiente para retomar os 80 mil pontos. No câmbio, ainda prevalece a busca por proteção e o dólar voltou a subir com força durante parte da sessão, alcançando R$ 5,72 na máxima do dia.
Ontem, o principal índice de ações do país fechou em alta de 3,86%, aos 78.239 pontos, respaldado também pelo avanço das bolsas globais com as sinalizações de reabertura da economia em alguns países na Europa e Estados americanos. O volume financeiro do Ibovespa somou R$ 18,4 bilhões, um pouco acima da média diária de abril, de R$ 17,9 bilhões.
No câmbio, as preocupações sobre a capacidade do governo de entregar resultados da agenda de reformas após a retomada da crise do novo coronavírus ainda pesam. Ao mesmo tempo, os riscos fiscais ajudam a manter as taxas de juros de longo prazo em nível elevado, em uma evidência clara do prêmio de risco que os investidores exigem para apostar no país. A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2027, por exemplo, subiu de 8,12% para 8,42%.
Já o dólar comercial fechou em alta marginal de 0,01%, a R$ 5,6581, longe da máxima de R$ 5,7253, por força da atuação do Banco Central, que interviu fortemente através de leilões surpresa no mercado à vista e no spot. Ao todo, o BC injetou US$ 2,1 bilhões líquidos no mercado, sendo US$ 1,5 bilhão em swaps cambiais e outros US$ 600 milhões no mercado à vista.
No início do dia, todos os ativos financeiros do Brasil tiveram desempenho bastante positivo, inclusive o real que se valorizou contra o dólar no começo da sessão. A moeda americana abriu em forte queda, batendo mínima de R$ 5,53 influenciada pelo tom positivo no exterior e por sinais da permanência do ministro Paulo Guedes no governo. Com a saída de Sergio Moro na sexta-feira, os investidores temiam que a era dos “superministros” havia acabado e que o economista seria o próximo a deixar o governo.
Em aparição pública logo pela manhã, o presidente Jair Bolsonaro reafirmou que Guedes é o homem que decide a economia no país. A demonstração contou com a presença de outros ministros e do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
“Isso passou uma mensagem bastante positiva para o mercado, que ficou em dúvidas sobre Guedes após o episódio de sexta-feira”, comenta Filipe Villegas, estrategista da Genial Investimentos, ao destacar o desempenho do Ibovespa melhor que pares globais.
Roberto Indech, estrategista-chefe da Clear Corretora, afirma, entretanto, que o alívio foi pontual, já que a crise política permanece com a saída de Moro e suas acusações feitas contra Bolsonaro. “O governo pode perder popularidade caso não seja capaz de lidar com a pandemia e o cenário econômico pós-pandemia. O mercado acompanha de perto.”
Ao longo do dia, o alívio inicial foi dando lugar a uma leitura de que, embora uma guinada na economia ou um processo de impeachment estejam afastados no momento, a perda de capital política do governo Bolsonaro deve afetar o esforço pós-crise.
“O cenário continua totalmente incerto e com a perspectiva fiscal ruim. Não há uma melhora crível. Embora seja positivo Bolsonaro demonstrar comprometimento com a agenda econômica, fica difícil avaliar a governabilidade. Ele tem a oportunidade de aumentar a base, mas as nomeações, até agora, têm sido de cunho pessoal. O fato de ele defender Guedes é algo bom, mas não indica que a agenda fiscal terá prosseguimento”, afirma Vinicius Alves, estrategista da Tullett Prebon Brasil.
Em relatório enviado a clientes, estrategistas do J.P. Morgan notam que a aproximação entre o governo e o Centrão pode forjar uma aliança no Congresso. Eles, contudo, veem ressalvas. A primeira é a possibilidade de Bolsonaro perder popularidade por se aproximar da “velha política”, enquanto a segunda está na possibilidade de o Centrão levar o governo a adotar uma abordagem mais populista na política econômica passados os efeitos do novo coronavírus.
Apesar do cenário político tomar conta dos mercados, notícias corporativas influenciaram também a bolsa brasileira.Via Varejo ON subiu 18,65% com a compra da empresa de tecnologia do setor de logística ASAPLog, crescimento do comércio eletrônico em meio à pandemia e recomendação de compra pelo Bradesco BBI. Na ponta negativa, Embraer ON caiu 7,49%, para a menor cotação desde 2009, de R$ 7,66, com o fim do negócio com a Boeing.
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