-
O Globo
A
novela do julgamento de Lula pode chegar a um fim hoje, se o plenário do
Supremo Tribunal Federal (STF) entender que a Segunda Turma, que decidiu pela
suspeição do então juiz Sergio Moro, poderia fazê-lo mesmo antes de ser
definida a questão da competência da Vara de Curitiba nos julgamentos da
Lava-Jato.
Mas, como em cabeça de juiz ninguém sabe o que se passa, a dizer que julgam com
independência — a evolução da tecnologia médica não permite mais dizer que não
se sabe o que tem em barriga de grávida nem em fralda de bebê —, existem
algumas situações peculiares neste julgamento de hoje.
O decano do STF, ministro Marco Aurélio, não concordou com a afetação do
processo ao plenário, mas, vencido pela “douta maioria” — nesse caso não tão
douta assim, na sua opinião —, já votou a favor da manutenção dos processos em
Curitiba, e pode votar outra vez, já que disse que a suspeição de Moro é bem
mais importante. O ministro é sempre elogioso ao trabalho de Moro na Operação
Lava-Jato e, com seu voto, pode ajudar a impedir que seja confirmada a suspeição
dele.
O ministro Alexandre de Moraes disse na sessão anterior que não é possível
afirmar que o julgamento pelo plenário significa desrespeito ao princípio do
juiz natural: “A estrutura da Corte privilegia o plenário, e as turmas só foram
criadas devido ao excesso de trabalho do tribunal”. Com essa posição, é
provável que defenda que o plenário tem preferência às turmas. Mas não
significa que concorde ou não com a suspeição de Moro.
A ministra Rosa Weber convocou para assessorá-la durante o julgamento do
mensalão o juiz Sérgio Moro, que era famoso apenas no círculo jurídico como
especialista em combate à corrupção, não a celebridade de hoje. Ela tem
melhores condições que qualquer outro para julgar se Moro é um juiz suspeito.
O ministro Nunes Marques é contabilizado como um dos quatro votos certos a
favor de que a Segunda Turma tinha condições de julgar a suspeição naquela
sessão, pois votou na ocasião, embora contra, para surpresa do ministro Gilmar
Mendes. Mas pode alegar que, hoje, com a decisão tomada pelo plenário sobre a
incompetência da Vara de Curitiba, considera que aquela questão se sobrepõe à
suspeição.
Como ressaltou a ministra Cármen Lúcia, o plenário não é órgão revisor das
turmas. Mas, nesse caso, seria uma análise técnica, não uma revisão. *
Nesse caso, o resultado é imprevisível. Já temos três votos pela suspeição
dados na Segunda Turma —Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski — e
um a favor de Moro, por Nunes Marques. Alguns ministros já se pronunciaram
favoravelmente em várias oportunidades sobre a Operação Lava-Jato, como o
presidente Luiz Fux e os ministros Luís Roberto Barroso e Marco Aurélio Mello.
Assim como fizeram, contra, os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.
Na visão de Fux, a discussão envolvida no caso é relevante, pois pode afetar
outros processos da Lava- Jato e “atingir um grande trabalho feito pelo Supremo
Tribunal Federal no combate à corrupção”. A sombra que paira sobre o
julgamento, os diálogos entre os procuradores de Curitiba e o juiz Sergio Moro
divulgados depois de ter sido roubados por um hacker, sofreu um golpe com o
laudo da Polícia Federal afirmando que não há possibilidade técnica de atestar
sua veracidade ou origem. O laudo não apagou da mente dos ministros a impressão
causada, mesmo que digam que não o usaram nas decisões, mas colocou
concretamente a possibilidade de que tenham sido alterados.
A suspeição de Moro no caso do triplex do Guarujá criará uma situação
esdrúxula: o ex-presidente da empreiteira OAS Léo Pinheiro, que confessou ter
dado o apartamento a Lula em troca de benefícios recebidos durante seu governo,
será também absolvido, assim como o ex-executivo Agenor Franklin Medeiros,
ambos condenados no mesmo processo. O mesmo acontecerá nos demais processos
contra Lula, caso o benefício seja estendido a eles pelo ministro Gilmar
Mendes, novo relator da Lava-Jato na Segunda Turma do STF.
Nenhum comentário:
Postar um comentário