Medo de obstrução leva o Planalto a adiar a votação da medida que institui o marco regulatório dos portos. A confusão é tanta que, em nota, até o partido da presidente Dilma, o PT, faz críticas à proposta.
Planalto intensifica o lobby por MP dos Portos
Além de R$ 1 bilhão em emendas, Executivo mobiliza ministros e cobra vitória na votação na Câmara, remarcada para a manhã de hoje
Leandro Kleber, Antonio Temóteo
Além de prometer a liberação de R$ 1 bilhão em emendas parlamentares aos deputados em troca da aprovação da Medida Provisória 595/2012, a MP dos Portos, o Planalto cobrou do primeiro escalão federal mobilização total com o propósito de assegurar o novo marco regulatório do setor. Apesar do time em campo e da promessa bilionária, a convocação da sessão extraordinária feita pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), para as 18h de ontem não deu em nada. Alves preferiu encerrar a sessão, por volta das 20h, para não correr o risco de ver a votação obstruída por partidos da oposição e do PMDB. Alves marcou outra sessão extraordinária, às 11h de hoje, para apreciar a matéria. Até o fim da noite de ontem, o vice-presidente da República, Michel Temer, ainda se reunia com lideranças do governo e do Congresso para buscar uma solução para o caso (leia mais na coluna Brasília-DF, na página 6). O Executivo avalia mudanças no texto a fim de evitar a derrota após os esforços dos últimos dias.
Logo na manhã de ontem, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, se reuniu com ministros da coordenação política e da área de infraestrutura para que eles orientassem os parlamentares a votar a medida, considerada essencial pelo Planalto. A ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, passou cerca de quatro horas ontem no Congresso reunida com líderes da base. Ela prometeu aos deputados a liberação de R$ 1 bilhão em emendas nos próximos meses, conforme antecipou o Correio na edição de ontem, mas negou que o anúncio do pagamento dos recursos tenha relação com a votação da MP dos Portos. O deputado Eduardo Cunha (RJ), líder do PMDB na Câmara, disse que o "partido não está à venda".
Em São Paulo, a presidente Dilma Rousseff, que já havia feito um apelo na semana passada para que o Congresso votasse o texto antes de encerrar sua validade, na quinta-feira, voltou a falar sobre a importância da matéria. "Estamos em um momento importante. A MP dos Portos tem por objetivo abrir os portos brasileiros ao investimento privado, gerando competição, maior eficiência e modicidade nos custos", afirmou.
O deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), um dos porta-vozes do movimento sindical na Câmara, disse que o governo não aceitou negociar mudanças na MP dos Portos com os líderes da base aliada. "O governo veio para enquadrar o Congresso. E eu, como não gosto de ser enquadrado, vou atrapalhar a votação", disse o pedetista, que saiu antes do término do encontro. "Saí agora porque perdi a paciência para negociar." À noite, ele foi chamado para um reunião com Michel Temer no Palácio do Jaburu.
Henrique Eduardo Alves negou que o Congresso tenha fracassado ao não votar a matéria ontem. Ele argumentou que a sessão foi convocada para mostrar a importância da proposta. "Quando se convoca segunda-feira à noite, (o objetivo) primeiro é mostrar a importância para criar, portanto, um clima de responsabilidade, de importância para se votar. E, muitas vezes, é para dar início à discussão para que a proposta venha a ser votada na terça", declarou.
O líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE), negou que o governo tenha saído derrotado do plenário. Para ele, o presidente da Casa foi prudente ao encerrar a sessão para não correr qualquer risco. "O PT estava praticamente 100% aqui hoje", disse. Após a votação na Câmara, o Senado terá apenas um dia para votar o texto.
Emendas
Deputados da oposição criticaram o anúncio da liberação de emendas parlamentares, como mostrou o Correio ontem. Izalci (PSDB-DF) disse que "manchetes como essa na imprensa" envergonham o Congresso. "É verdade que o governo sinaliza, em véspera de votações importantes, com a liberação de emendas. Isso é ruim, porque coloca as emendas como algo negativo, de corrupção, o que não é verdade", afirmou.
Ivan Valente (SP), líder do PSol na Câmara, avalia que a liberação de emendas às vésperas da apreciações de matérias consideradas importantes pelo governo é "muito ruim" para a democracia. Segundo ele, a prática é usada como moeda de troca e representa o fisiologismo na política brasileira. "Se votarmos o orçamento impositivo, essa situação acaba."
Entrave ao plano do Executivo
Graças a uma emenda aglutinativa apresentada pelo líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB), a votação da Medida Provisória (595/12), que regulamenta a exploração dos portos brasileiros, tornou-se um incômodo para o Palácio do Planalto. A manobra do parlamentar corroborou a irritação do governo com a indicação de Cunha para liderar o principal partido aliado de Dilma Rousseff na Câmara, no início de fevereiro.
Polêmico, o deputado fluminense é evangélico e foi um dos principais responsáveis pelo acordo político que resultou na eleição do pastor Marco Feliciano (PSC-SP) à presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Casa. Cunha também poderá ter problemas no Supremo Tribunal Federal (STF), que acolheu denúncia, em março, por uso de documento falso quando ele ainda era presidente da Companhia Estadual de Habitação do Rio de Janeiro.
Antigo aliado do deputado Antonhy Garotinho (PR-RJ), líder do partido na Câmara, hoje os dois — principais responsáveis pelo cancelamento da sessão plenária da última quarta-feira, quando seria votada a MP dos Portos — não se cumprimentam e, vez ou outra, trocam desavenças públicas. Durante a apreciação da matéria na semana passada, Garotinho disse que lobistas do setor portuário atuaram no Congresso Nacional em favor da emenda aglutinativa apresentada por Cunha. Ele, por sua vez, nega qualquer favorecimento a terceiros e diz que o PMDB representará contra o ex-colega no Conselho de Ética da Câmara.
Fonte: Correio Braziliense
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