Vandson Lima – Valor Econômico
BRASÍLIA - Os dois primeiros dias da campanha de Eduardo Campos (PSB) à Presidência da República deixaram muito clara a mudança de estratégia do candidato. Com a leitura de que tanto PT quanto PSDB querem polarizar a disputa - e por consequência, anulá-lo -, Campos escolheu bater duro na gestão da presidente Dilma Rousseff e não falar no candidato tucano, de quem se afastou e vinha criticando, além de mostrar como o próprio governo federal e o PT articularam intensamente para evitar sua entrada na disputa.
Em visita a Águas Lindas, cidade goiana no entorno do Distrito Federal, Campos disse que o governo de Dilma lhe ofereceu uma série de acordos para que não concorresse ao Planalto em 2014. "A nós foram tentadas várias promessas, de participação no governo, participação em chapa, promessa para [a eleição de] 2018", afirmou, quando questionado se não era incoerente o PSB concorrer com um governo do qual fez parte.
"Nós, em nome do que estávamos vendo, fizemos o caminho que muitos brasileiros fizeram. Muitos votaram em Dilma na eleição passada e não vão votar mais. Foi dada a ela a chance, ela não soube ou não quis usar e precisamos agora cuidar do Brasil", defendeu. "Quando vimos que o projeto tinha inconsistências, fizemos a crítica interna. E fizemos o que não é comum na política, saímos do governo. Saímos pela porta da frente", continuou. Quando lhe foram pedidos detalhes das propostas para desistir, sobretudo quem as fez, o ex-governador apontou: "O que passou está registrado nos veículos de comunicação e cada um tire a lição desse processo".
Ao abordar o esforço em tirá-lo do páreo, Campos procura mostrar que o próprio governo reconhece que ele tem chances de chegar ao Planalto. A nova estratégia é, ainda, um antídoto para a pecha de "traidor" que "cospe no prato que comeu" que a direção da campanha da reeleição da presidente Dilma já está propagando contra ele.
"Chegou a hora de a presidente Dilma sair de trás do marqueteiro e vir para as ruas, falar com o povo e dizer o que ela fez nestes quatro anos. A gente procura no Brasil real e não encontra esse governo", atacou. No domingo, o candidato esteve na Comunidade Sol Nascente, distante 40 km da Esplanada e considerada a maior favela da América Latina. "Foi para mostrar que tão próximo existe uma realidade desconhecida do governo".
Ao lado de sua vice, Marina Silva, o candidato andou pelo comércio local de Águas Lindas. Poucos o reconheceram. "Prazer, Eduardo", prontificava-se a se apresentar, pacientemente. A comerciantes e vendedores ambulantes, Campos, de camisa branca e tênis verde e amarelo, sempre perguntava: "Você tem sentido o preço das coisas aumentar? E as vendas, caíram?"
Sabendo que estava em uma cidade com grande número de migrantes, principalmente do Norte e Nordeste, Campos sempre perguntava de que cidade era o interlocutor. Ao ouvir a resposta, fazia comentários sobre a cultura e a economia local. "Tu é de Jabitacá [PE]? Terra da festa de poesia, dura 14 dias", disse a um comerciante local.
"Deixa eu pegar na mão da futura presidente. Vou votar na senhora", pediu uma mulher a Marina, sempre muito requisitada para fotos. "Eu agora sou vice dele", respondeu a ex-ministra, apontando para o candidato. Um assessor não perdeu a deixa: "Vota 40, tá?".
A coletiva com repórteres revelou uma dinâmica insólita na chapa. Após cada resposta de Campos, Marina expunha também sua opinião, mesmo com as perguntas não sendo direcionadas a ela. "Aqui é o Brasil onde o marketing não resolve", disse Campos, pontuando que o município tinha altíssima taxa de homicídios, em torno de 120 a cada 100 mil habitantes. "Tem o Brasil colorido do marketing e o Brasil em preto e branco, com lixo na rua, sem saúde, sem educação", completou Marina.
Na caminhada, Campos encontrou até um primo distante, que não conhecia. Com os mesmos olhos claros e traços parecidos com o do candidato, o piauiense Angelo Fabio Braga Arraes, de 42 anos, filiado ao PDT, era dos poucos que sabia que ali estava um candidato a presidente. "Conversamos, dei meus telefones. Ele sabe quem é meu pai", disse o parente do ex-governador pernambucano.
Ontem, no primeiro ato oficial de campanha em seu Estado natal, Campos participou de uma plenária com a militância do PSB de Pernambuco. Para manter a hegemonia política local, o partido começou a campanha com uma verdadeira blitz. Nas primeiras horas do domingo, primeiro dia permitido para campanha, a capital pernambucana já estava repleta de material dos candidatos do PSB.
Sem a presença constante de Campos, em campanha nacional, o PSB de Pernambuco está preocupado com a disputa contra o senador Armando Monteiro Neto (PTB), candidato ao governo que conta com o apoio do PT e, principalmente, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que é pernambucano.
Em caso de derrota na campanha presidencial, Campos não pode abrir mão da hegemonia de seu grupo em Pernambuco, motivo pelo qual seu partido - amparado por um amplo leque de alianças - já encheu de militantes as ruas do Recife. (Colaborou Murillo Camarotto, do Recife)
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