• Os delatores do petrolão afirmam que políticos do PT receberam propina. Os nomes de José Dirceu, Antonio Palocci e Cândido Vaccarezza aparecem nos depoimentos
Leandro Loyola - Época
"Bob". Quem é "Bob"? Em outubro do ano passado, o doleiro Alberto Youssef forçou sua memória em um dos muitos depoimentos prestados ao Ministério Público e à Polícia Federal no Paraná, para ajudar a desvendar os intrincados meandros do petrolão. Naquele dia, Youssef detalhou ao Ministério Público e à Polícia Federal a participação do lobista Júlio Camargo, representante da empresa Mitsui Setal, atual Toyo Setal, na rotina da corrupção. Youssef contou que Júlio tinha uma função semelhante à sua: fazer o dinheiro pago por empresas com o intuito de obter contratos na estatal chegar até os facilitadores desses negócios. Júlio trabalhava na ocasião para a Toyo e a Camargo Corrêa. Atuava na Diretoria de Serviços, comandada por Renato Duque, indicado pelo PT. Youssef disse que Júlio era próximo de José Dirceu, o padrinho político de Duque, e próximo também de outro ministro petista, Antonio Palocci. Segundo Youssef, Júlio tinha uma alcunha para Dirceu: "Bob".
O teor desse e de outros depoimentos da delação premiada de Youssef vieram a público pouco antes do Carnaval. Neles, petistas como Dirceu brilham em cores vivas, sempre ao lado de operadores como Júlio Camargo. Youssef disse que Júlio também fazia os pagamentos da propina do petrolão - especialmente ao PT. Segundo Youssef, o dinheiro era direcionado "para pagamentos da Camargo Corrêa e da Mitsui Toyo ao Partido dos Trabalhadores, sendo que as pessoas indicadas para efetivar os recebimentos à época eram João Vaccari e José Dirceu". De acordo com os depoimentos de delação premiada de Youssef, um funcionário de Júlio Camargo usava um pen drive protegido por senha, com nomes de pessoas indicadas para receber esse dinheiro. Youssef viu o conteúdo do pen drive. Havia uma lista na qual José Dirceu era simplesmente "Bob".
Dirceu e Júlio tinham uma relação mais próxima do que as transações financeiras apontadas por Youssef sugerem. Segundo Youssef, como muitos outros políticos ainda desconhecidos, Dirceu viajava no "avião do Julinho", um Citation Excel. No depoimento, Youssef diz que Dirceu e Camargo são amigos e que "o avião referido fica guardado no Hangar 1 da Companhia Aérea TAM, no Aeroporto de Congonhas". Por meio de nota, o ex-ministro José Dirceu negou ter recebido recursos do empresário Júlio Camargo e da Toyo Setal. Disse, ainda, que as declarações de Youssef são mentirosas e que sempre viajou em aviões de carreira ou empresas de táxi-aéreo.
O doleiro Youssef não entregou, pelo menos nos depoimentos conhecidos até o momento, provas documentais da participação de Dirceu. Os investigadores tentam provar que Dirceu, poderoso no PT e no governo, sabia que Duque, seu afilhado na Petrobras, trabalhava para cobrar um pedágio em contratos da estatal, de modo a direcionar o dinheiro para o caixa do PT e o bolso de alguns políticos escolhidos. Assim como no mensalão, suspeitas de que Dirceu tinha domínio da engrenagem começam a emergir com mais nitidez.
Aos poucos, as provas obtidas peia força-tarefa da Lava Jato permitem reconstituir o alcance e a proeminência do PT no esquema. No ano passado, Youssef e Paulo Roberto Costa afirmaram que Vaccari era o homem encarregado pelo PT de receber a propina destinada aos políticos da legenda. Há duas semanas, soube-se que o ex-gerente Pedro Barusco, subordinado ao diretor Renato Duque, contou à Justiça que o PT recebeu cerca de R$ 200 milhões em propinas da Petrobras, "com a participação de João Vaccari". O PT e Vaccari negam todas as acusações.
Também vieram à tona, às vésperas do Carnaval, depoimentos da delação premiada de Paulo Roberto Costa. Eles confirmam, em muitos pontos, o que diz Youssef sobre o PT. Neles, Paulo Roberto confessa a existência de um braço internacional do esquema, envolvendo algumas das maiores empresas de petróleo do mundo - conforme revelou ÉPOCA em abril do ano passado. Paulinho, como era chamado por Lula, rememora no depoimento algumas lições de vida. "Paulo, você é muito tolo, você ajuda mais os outros do que a si mesmo. E, em relação aos políticos que você ajuda, a hora que você precisar de algum deles, eles vão te virar as costas". Paulo Roberto diz ter ouvido esse conselho de Rogério Araújo, um diretor da empreiteira Odebrecht. Segundo Paulo Roberto, ali, em 2008, Rogério acertou que a Odebrecht depositaria recursos para ele diretamente no exterior, por fora dos acertos para os políticos, para "manter a política de bom relacionamento". A Odebrecht, em nota, nega qualquer irregularidade.
Em uma dessas contas, em 2009 ou 2010, segundo Paulo Roberto, a empresa Sargent Marine depositou US$ 192.800 em propina. Meses antes, a empresa havia sido apresentada a Paulo Roberto por Jorge Luz, um dos mais antigos lobistas da Petrobras. No governo Lula, Luz construiu boas relações com chefes do PMDB e do PT. Uma delas com o então deputado petista Cândido Vaccarezza, amigo de Lula e influente na Petrobras. Em sua delação premiada revelada às vésperas do Carnaval, Paulo Roberto diz que, em troca da propina, deu um contrato sem licitação à Sargent Marine. Segundo o depoimento, Paulo Roberto foi avisado por Jorge Luz que, do valor do contrato, R$ 400 mil seriam entregues ao deputado Cândido Vaccarezza, do PT paulista, então líder do PT e, depois, do governo na Câmara. "Nunca em minha vida apresentei nenhuma empresa a ele ou tive contato com essa empresa Sargent Marine", diz o ex-deputado Cândido Vaccarezza.
As quatro contas reveladas por Paulo Roberto foram abastecidas não só pela Sargent Marine, mas por outras gigantes do mundo petrolífero, como publicou ÉPOCA. Paulo Roberto recebeu US$ 10 mil da Glencore, em uma conta administrada por Youssef no banco UBS do principado de Luxemburgo. Outra empresa, a Trafigura depositou US$ 600 mil em propinas em uma conta do banco Lombard Odier-Gen, na Suíça. Novas revelações das delações premiadas podem ajudar a esclarecer esses casos.
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