Por Sergio Lamucci e Arícia Martins – Valor Econômico
SÃO PAULO - As expectativas de recuperação da atividade econômica a partir deste fim de ano estão sendo frustradas. Depois dos maus resultados da indústria e do comércio no terceiro trimestre, alguns indicadores econômicos de outubro reforçaram a avaliação de que a economia vai encolher também nos últimos três meses do ano. Neste cenário, marcado pela queda na produção de veículos, cimento e outros itens importantes, bancos e consultorias já revisam para baixo as estimativas para a variação do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano e também 2017.
Para 2016, as projeções para o PIB, que anteviam uma recessão de 3%, agora se situam em 3,5%. Para o próximo ano as estimativas indicavam um crescimento de até 2%, mas agora estão mais próximas de 1%. Alguns analistas, como os do Banco Fator, já preveem expansão zero.
A vitória de Donald Trump nas eleições americanas é um novo complicador, porque eleva a incerteza no mercado internacional e já provoca a desvalorização das moedas emergentes, como o real. Esse movimento cambial gera inflação e pode levar o Banco Central a ser mais cauteloso no ciclo de queda dos juros, iniciado no mês passado.
No terceiro trimestre, a produção industrial caiu 1,1% em relação ao período imediatamente anterior, feito o ajuste sazonal, enquanto as vendas no varejo ampliado recuaram 2,7%. Os números indicam que o investimento poderá levar mais tempo para decolar, além de evidenciar a fraqueza do consumo. Analistas chegaram a estimar alta de 0,2% no PIB do terceiro trimestre, mas hoje acreditam que pode ter havido queda de até 1% em relação ao segundo. Para os últimos três meses do ano, o economista-chefe da JGP Gestão de Recursos, Fernando Rocha, antevê nova queda, de 0,2%.
Para economistas, o otimismo não se materializou por vários fatores, como perda de fôlego do setor externo, frustração em relação à velocidade no corte dos juros e, também, fatores pontuais que prejudicaram a atividade industrial em agosto e setembro.
Indicadores sugerem atividade abaixo do esperado até 2017
Depois dos maus resultados da indústria e do comércio no terceiro trimestre, alguns indicadores de outubro reforçaram a avaliação de que a economia brasileira vai encolher também nos últimos três meses do ano. Nesse cenário difícil, marcado pela queda na produção de veículos e de cimento no mês passado, bancos e consultorias revisam para baixo as estimativas para a variação do Produto Interno Bruto (PIB) em 2016 e 2017.
Para este ano, as projeções de que o PIB cairia 3% dão lugar a previsões de um recuo na casa de 3,5%. No caso do ano que vem, as estimativas estão mais próximas de 1%, embora haja quem preveja um PIB estável, caso do Banco Fator. Para complicar, a vitória de Donald Trump nas eleições americanas elevou a incerteza no mercado internacional, pressionando moedas emergentes como o real, o que pode levar o Banco Central (BC) a ser mais cauteloso no ciclo de queda dos juros, iniciado no mês passado.
No terceiro trimestre, a produção industrial caiu 1,1% em relação ao segundo, feito o ajuste sazonal, enquanto as vendas no varejo ampliado recuaram 2,7%. Os números indicam que o investimento levará mais tempo para decolar, além de evidenciar a fraqueza do consumo. "Houve uma decepção grande no terceiro trimestre", resume o economista-chefe da JGP Gestão de Recursos, Fernando Rocha, que chegou a estimar uma alta de 0,2% sobre os três meses anteriores.
Hoje, ele acredita que o PIB tenha recuado 1% no terceiro trimestre, uma queda mais forte da atividade do que a registrada na primeira metade do ano. No primeiro trimestre, o PIB encolheu 0,4%, caindo 0,6% no segundo. Para os últimos três meses do ano, Rocha prevê nova baixa, de 0,2%.
Rocha diz que a recuperação terá que ser liderada pelo investimento. O consumo não fará o papel de tirar a economia da recessão, num quadro de forte piora do mercado de trabalho. Ele nota que há uma destruição de mais de 100 mil empregos formais por mês, na série com ajuste sazonal, e a massa salarial está em queda. Tampouco virá do setor público o impulso à retomada, uma vez que o governo deverá se empenhar em ajustar as contas públicas.
No segundo trimestre, a produção de capital cresceu com força - 6,8% em relação ao primeiro -, sugerindo um quadro mais favorável para o investimento, o que não se manteve. No terceiro, caiu 2,6%.
Para o economista Igor Velecico, do Bradesco, a formação bruta de capital fixo (medida do que se investe em máquinas e equipamentos, construção civil e pesquisa) caiu entre 1,5% e 2% no terceiro trimestre, sendo um dos principais motivos para o recuo previsto de 0,9% para o PIB no período. Já o consumo das famílias, que responde por mais de 60% do PIB, deve ter se contraído 0,8%
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Um dos motivos que explicam a demora da retomada é o descompasso entre a avaliação sobre a situação atual e as expectativas de empresas e consumidores, diz Velecico. Os indicadores de confiança subiram neste ano por causa da melhora em relação às perspectivas para o futuro, mas as condições correntes seguem fracas(veja reportagem Sem endosso da realidade, economia se descola da expectativa). Companhias e famílias estão endividadas e o crédito está travado.
Indicadores de outubro sugerem resultados desanimadores também para o fim do ano. Velecico cita a queda da produção de cimento, de 2,3% em relação a setembro, e a de 12,2% na fabricação de caminhões, segundo dados com ajuste sazonal do Bradesco. A expectativa do banco é de que o PIB caia algo como 0,3% no quarto trimestre em relação ao terceiro - antes, a aposta era num recuo de 0,1%.
Com o desempenho decepcionante no segundo semestre, Rocha passou a projetar retração de 3,5% para o PIB neste ano. Ainda não é uma queda tão forte quanto os 4% que ele estimava no começo do ano, quando Dilma Rousseff ainda era a presidente, mas é pior que o recuo de 3% previsto no momento mais otimista de 2016, na esteira do aumento da confiança de empresários e consumidores. Velecico vê uma retração do PIB de 3,6% neste ano.
O Banco Fibra também rebaixou as suas projeções para a variação do PIB em 2016 e 2017. Para este ano, o economista-chefe da instituição, Cristiano Oliveira, reduziu a estimativa de uma queda de 3% para um tombo de 3,7%, com a expectativa de novos recuos da atividade no terceiro trimestre (recuo de 1%) o e no quarto (-0,2%).
Com esses resultados, a herança estatística (o "carry over') de 2016 para 2017 será pior, caindo de -0,2% para -0,8%. Isso significa que, se o PIB do ano que vem não crescer nada em relação ao nível do fim deste ano, a economia encolherá 0,8% em 2017.
O "efeito Trump" sobre a curva de juros no Brasil ajuda a explicar parte da redução da estimativa de crescimento do PIB no primeiro trimestre do ano que vem de 0,9% para 0,5%, segundo Oliveira. A expectativa de que haja uma expansão fiscal mais forte no governo de Donald Trump elevou as taxas dos títulos do Tesouro americano. Para muitos investidores, os cortes de impostos e o aumento dos gastos em infraestrutura desejados por Trump devem levar a mais crescimento e mais inflação, o que implica juros mais altos nos EUA, pressionando as moedas emergentes. Por aqui, o real se desvalorizou e a curva de juros subiu. Oliveira também revisou a projeção para o primeiro trimestre de 2017 por causa da própria fraqueza da economia brasileira, num cenário de crédito travado e endividamento de consumidores e empresas.
Também houve certa interrupção da melhora dos indicadores de confiança, diz Oliveira. Para ele, parte dos empresários acreditava num corte da Selic de 0,5 ponto percentual na reunião de outubro e em mais 0,5 ponto neste mês. No entanto, o BC fez uma redução de apenas 0,25 ponto no mês passado, para 14% ao ano, e a perspectiva é de que promova outro corte da mesma magnitude em novembro, num momento em que há incertezas no mercado e o câmbio está mais pressionado.
Rocha e Velecico, que trabalhavam com crescimento de 1,5% para 2017, projetam agora 1%, mas consideram que até mesmo esse número pode ser difícil de ser atingido. Para Rocha, é importante reduzir os juros, num cenário em que a atividade está muito deprimida e as expectativas de inflação para 2017 já caíram abaixo de 5% - a meta perseguida pelo BC é de 4,5%.
Para o economista-chefe do Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, as perspectivas para a atividade são difíceis. Ele manteve a previsão de uma queda do PIB de 3,3% neste ano, mas revisou a estimativa para 2017 de uma alta de 0,5% para estabilidade. O problema, para ele, é o consumo, que seguirá em queda também no ano que vem, num ambiente em que o desemprego poderá atingir 13% em junho - no terceiro trimestre deste ano, ficou em 11,8%.
Sem endosso da realidade, economia se descola da expectativa
A afirmação de que as expectativas não correspondem à realidade retrata com exatidão o momento atual da economia brasileira. Desde março, os índices de confiança calculados pelo Instituto Brasileiro de Economia da FGV (Ibre-FGV) foram impulsionados por forte alta dos indicadores que medem perspectivas futuras, em descompasso com a avaliação da situação por empresários e consumidores.
O descolamento é maior no Índice de Confiança do Consumidor (ICC), em que o Índice de Expectativas (IE) superou em 23,6 pontos o Índice de Situação Atual (ISA) em setembro, maior diferença desde dezembro de 2007. No Índice de Confiança Empresarial (Ice) - que agrega os setores de serviços, indústria, construção e comércio - a distância entre o IE e o ISA diminuiu de agosto para setembro, mas permanece em patamar elevado, de 12,4 pontos.
Para economistas, o otimismo não se materializou por uma série de fatores, como perda de fôlego do setor externo, frustração em relação à velocidade do ciclo de afrouxamento monetário e, também, fatores pontuais que prejudicaram a atividade industrial em agosto e setembro. Nos próximos meses, como ainda não houve resposta da economia, a avaliação é que as expectativas devem ser ajustadas para baixo, como já ocorre em alguns setores.
"Os empresários estão mais realistas, enquanto a percepção do consumidor está um pouco defasada", diz Aloisio Campelo, superintendente de estatísticas públicas do Ibre, que destaca o comportamento atípico dos dados na recessão atual. Segundo estudo publicado por Campelo no Boletim Macro em conjunto com o professor Paulo Picchetti, quando mais de 22,3% dos empresários consultados na Sondagem da Indústria consideram a situação atual desfavorável, há uma distorção na variável de expectativas, o que costuma ocorrer durante crises econômicas.
Nas crises anteriores após o Plano Real, mais curtas, o nível de insatisfação elevado permaneceu durante apenas um ou dois meses. "Desta vez estamos há alguns meses com um nível de insatisfação muito grande por um bom tempo", disse Campelo, o que, em sua avaliação, vai levar a um movimento de correção para baixo das expectativas nos próximos meses. Entre setembro e outubro, o índice de expectativas empresarial caiu 2,7 pontos, para 87,7 pontos, com retração na indústria, serviços e comércio.
Além da mudança de governo, que levou a uma percepção de que a instabilidade política ficaria menor, a melhora das perspectivas de empresários, no caso da indústria, teve a demanda externa como outro vetor, observa o economista da FGV, mas esse impulso já arrefeceu. "A indústria começou a substituir importações e exportar mais e, no momento seguinte, a produção física subiu. Quando o câmbio passou a se apreciar, o canal externo perdeu fôlego e a demanda interna não voltou."
Para Rodolfo Margato, do Santander, o cenário mais favorável que se desenha para a demanda em 2017 - com desaceleração da inflação, redução dos juros e estabilização do mercado de trabalho - pode explicar o descompasso entre expectativas e avaliação da situação atual dos consumidores. Do lado dos empresários, além da desvalorização do câmbio, o momento de início e a magnitude do corte de juros pode ter representado outra frustração, depois de ter elevado as expectativas em um primeiro momento, afirma Margato.
Considerando apenas o comportamento dos indicadores de confiança, era de se esperar desempenho melhor que o previsto para o Produto Interno Bruto (PIB) entre o segundo e o terceiro trimestres, diz o economista. "Tínhamos uma projeção de queda de 0,3%, mas, provavelmente a contração vai ficar entre 0,5% e 1%". Mesmo assim, Margato não considera que os dados de confiança representaram um "falso positivo", principalmente para a indústria. "A confiança industrial tem série mais longa e antecipou a reversão da produção industrial e dos investimentos."
Jankiel Santos, economista-chefe do Haitong, concorda que, ao analisar apenas a evolução da confiança, alguma reação da atividade já deveria ter ocorrido. "As esperanças quanto ao futuro, no entanto, estão mais robustas do que a situação atual", afirma, acrescentando que, para que haja recuperação de fato da atividade, é preciso que esses últimos indicadores também subam, diminuindo o descolamento em relação às perspectivas.
Com base no índice da indústria da FGV e na confiança do consumidor da cidade de São Paulo, calculada pela Fecomercio-SP - os únicos índices com série histórica anterior a 2000 - Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores, afirma que o atual descompasso entre expectativas e momento atual não foge muito do script de qualquer recessão. Na média destes dois indicadores, essa diferença se estabilizou em torno de 45 pontos desde junho. Na crise de 2003, o pico foi de 41 pontos.
"O descompasso está ocorrendo há mais tempo, mas isso tem a ver com a duração da recessão atual, de quase dois anos e meio", nota Borges. A fase atual do ciclo apontada pelos índices de confiança com série mais longa é de recuperação, diz o economista, mas a melhora não veio no PIB do terceiro trimestre devido a um conjunto de "ruídos negativos". Os principais foram a paralisação temporária da produção da Volkswagen, que derrubou em quase 4% a atividade industrial, e a greve dos bancários, que teve duração maior em 2016 e derrubou as concessões de crédito.
Com a reversão dos fatores temporários, o PIB trimestral deve voltar ao campo positivo nos últimos três meses de 2016, avalia Borges. Se a economia seguir a trajetória ocorrida nas duas recessões dos anos 80, as mais similares à atual, o PIB cresceria entre 2% e 2,5% em 2017, calcula. Por isso, a projeção da consultoria de alta de 1,5% no período não pode ser considerada otimista, argumenta o economista da LCA.
Mais cautelosa, a equipe de conjuntura do Ibre projeta aumento de apenas 0,6% do PIB no próximo ano. As sondagens sinalizaram bem o momento da virada, afirma Campelo, principalmente para a indústria, mas corroboram a visão de que a recuperação será lenta.
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