Projetos de reforma política jamais são modelos teóricos, abstrações imunes ao interesse de poder daqueles que propõem a regra do jogo. Tanto definições comezinhas de distritos de votação quanto princípios como o da separação de Poderes têm raízes mais ou menos profundas no confronto de forças sociais ou partidárias.
Isso considerado, as mudanças que ora se debatem nas regras eleitorais do Brasil se enquadram, sem dúvida, nos casos mais rasteiros.
A cúpula do Legislativo pretende aprovar, a galope, novo modo de eleger deputados e vereadores. O objetivo evidente é facilitar a reeleição e a reconquista do privilégio de foro para a massa de parlamentares às voltas com a Lava Jato e outros riscos judiciais.
Pela manobra que se ensaia, o eleitor passaria a votar apenas na legenda, não mais em cada candidato. A depender da proporção de votos obtidos, cada agremiação teria direito a proporção correspondente de cadeiras legislativas.
Os contemplados seriam aqueles escolhidos pelos partidos, pela ordem em que apareçam na relação de nomes previamente definida —ou lista fechada, como se batizou tal sistema.
Camuflados na lista, os candidatos dependeriam mais de suas afinidades com a burocracia partidária do que de sua aceitação pelo público votante.
Recorde-se que tal proposta já foi examinada pela Câmara dos Deputados em 2015, quando sofreu derrota vexatória. Apenas o PT e seus satélites mais fiéis a defenderam na época.
Agora, a tese volta à baila em reuniões suprapartidárias que envolveram os presidentes das duas Casas legislativas, o do Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes, e o próprio presidente da República, Michel Temer (PMDB).
Argumentam os reformistas de ocasião que as regras são necessárias para a instauração do financiamento de campanha com predomínio do dinheiro público. Pelo raciocínio, cairiam os custos da eleição para os contribuintes.
Nesse caso, seria também preciso acreditar que os políticos brasileiros de súbito abandonariam a prática do caixa dois e disputariam o pleito apenas com as verbas autorizadas no Orçamento.
Esta Folha defende a adoção de um sistema misto, pelo qual o eleitor votaria em lista aberta, de forma a fortalecer os partidos sem perder o direito de escolha nominal, e também em um candidato de seu distrito, favorecendo a aproximação com os representantes.
Haverá, em outras democracias, situações em que a lista seja funcional. Aqui, não passaria de casuísmo que dificultaria a urgente tarefa de renovar o Congresso.
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