- O Estado de S.Paulo
Normalização do mercado de crédito pela TLP tende a aumentar a produtividade
Sempre que se pensa no grande desvio de política econômica que levou o Brasil até a dramática recessão iniciada em 2014, a atenção principal vai para a destruição do equilíbrio fiscal a duras penas conquistado no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso e nos primeiros anos do governo Lula. Afinal, o crescimento explosivo da dívida pública é o principal problema da economia brasileira, aumentando a incerteza e o risco e inibindo o investimento e até o consumo.
Não de deve desprezar, entretanto, outra vertente menos evidente da política pública, a chamada “agenda microeconômica”, abandonada em algum ponto do governo Lula e substituída pelo intervencionismo da nova matriz, de triste memória. Uma boa notícia em meio a uma conjuntura ainda dificílima é que os avanços microeconômicos estão sendo retomados.
A vitória recente mais comentada nesse front foi a aprovação pela Câmara da MP 777, que cria a TLP em substituição à TJLP como taxa de juros de referência das operações do BNDES. A TLP em cinco anos eliminará subsídios implícitos de crédito derivados da diferença entre o custo de captação do governo e a taxa de referência do BNDES. Nesse sentido, a MP 777 tem até uma dimensão fiscal, macroeconômica. E há ainda outro aspecto macro: ao fazer com que a política monetária atue sobre o crédito concedido pelo BNDES, a mudança permitirá que os objetivos do sistema de metas de inflação sejam atingidos com juros menores.
Mas a TLP também é uma reforma microeconômica. A nova taxa vai melhorar a remuneração de fontes do “funding” do BNDES que têm natureza de “poupança forçada”, como os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Simultaneamente, a TLP gradativamente eliminará subsídios de crédito canalizados para uma fração dos projetos na economia.
Além de corresponderem a uma taxação dos recursos do FAT, juros artificialmente baixos podem viabilizar projetos de baixo retorno, ou induzir excesso de capacidade em diferentes setores. Em ambos os casos, essa má alocação de capital, no jargão dos economistas, reduz a produtividade da economia. A normalização do mercado de crédito pela TLP, portanto, é positiva para a eficiência da economia e tende a aumentar a produtividade.
Menos atenção foi dada a outro avanço importante na agenda microeconômica de crédito, proposto pelo Banco Central (BC) e pela Secretaria de Reformas Microeconômicas da Fazenda: a aprovação da MP 775, sancionada nessa quarta-feira pelo presidente Michel Temer. Com ela, duplicatas e recebíveis, utilizados como garantias em operações de crédito, passam a fazer parte de um sistema de registro centralizado. Assim, as garantias podem ser vinculadas com toda a segurança a uma determinada operação de crédito, evitando fraudes como, por exemplo, a utilização da mesma duplicata para mais de um empréstimo.
Essa inovação vai na mesma direção de uma série de reformas do mercado de crédito levadas a cabo no final do governo de FHC, com Arminio Fraga na presidência do BC, e principalmente no início do governo Lula, quando foram tocadas pelo então secretário de Política Econômica da Fazenda Marcos Lisboa.
São medidas que reforçam a segurança do emprestador em modalidades como crédito consignado e empréstimos para aquisição de automóveis e imóveis. A Lei de Falências de 2005 também tentou em parte atender a esses objetivos, e hoje já se pensa em reformulá-la para superar falhas de execução.
Todas essas medidas reduzem o spread dos empréstimos, a diferença entre o custo de captação dos bancos e o juro que cobram para emprestar. A ideia é simples: com mais segurança de receber de volta o dinheiro, os emprestadores cobram menos juros. Juros menores de forma horizontal e democrática aumentam a produtividade da economia. Todos os lados ganham com a agenda microeconômica que está sendo retomada.
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