Jair Bolsonaro, do PSL, venceu com uma confortável e convincente vantagens de quase 10,7 milhões de votos em relação a seu rival petista, Fernando Haddad. A onda antipetista, impulsionada por Bolsonaro, quebrou a polarização tradicional nas eleições presidenciais das últimas décadas entre PT e PSDB, arrastou a maioria dos votos e o apoio de vários governadores nos Estados mais ricos da nação, no Sul e Sudeste, elegeu a segunda maior bancada na Câmara dos Deputados - que ainda pode crescer - e criou potencial de arregimentação parlamentar que pode lhe garantir no início da gestão, o apoio necessário para aprovar as primeiras medidas que definir.
Impõe-se agora que o presidente eleito defina desde logo quais serão as linhas de orientação de seu governo. Seu programa não foi nada claro a respeito durante uma campanha eleitoral radicalizada, na qual Bolsonaro se esquivou dos principais debates na reta final. Contados os votos, Bolsonaro terá de se elevar à altura do estadista que não foi até agora, após desferir agressões a minorias e adversários políticos, render homenagens aos tempos em que não havia eleições para a Presidência e ser obscuro sobre o que pretende fazer para enfrentar a aguda crise fiscal do país.
Há tempos difíceis à frente na economia e na política, após a disputa eleitoral tensa e radicalizada. Bolsonaro terá de governar para todos os brasileiros, entre os quais se contam os 46,4 milhões de eleitores que votaram em seu rival, os 11 milhões que anularam ou votaram em branco e os 31,2 milhões que não foram às urnas. Em seu primeiro discurso após a vitória, ele procurou apaziguar os temores de que seu governo possa ser marcado pelo cerceamento das garantias democráticas.
Bolsonaro definiu a liberdade como "princípio fundamental", prometendo garantir o livre exercício da opinião política, de credo religioso e da informação, e, ainda, respeitar as "diversas opiniões, cores e orientações", em alusão a setores da sociedade que hostilizou nas batalhas eleitorais. Disse ainda que vai "defender e proteger os direitos dos cidadãos".
Escorado em um partido minúsculo, Bolsonaro, após vitória expressiva, terá de conquistar apoio parlamentar para executar um programa econômico cujo norte foi definido - "reduzir o déficit primário o mais rapidamente possível", como disse ontem -, mas cujos meios para atingir esse objetivo não estão claros. Por não ter comparecido a debates no segundo turno, o presidente eleito não se comprometeu com um rol explícito de propostas. Naquelas em que havia sido claro, ensaiou recuos - bem vindos em alguns casos, como a ideia de fundir o Ministério da Agricultura com o do Meio Ambiente e a de retirar o Brasil do Acordo de Paris.
Há urgência em deter a escalada da dívida pública e Bolsonaro e sua equipe precisam definir logo se atacarão de cara um dos rombos principais, o déficit da previdência, com a reforma que está no Congresso ou se optarão pelo caminho mais problemático de um novo sistema, com capitalização.
Da mesma forma, é preciso fixar com clareza a linha de uma reforma tributária, outra necessidade consensual entre economistas, em que a simplificação e seus benefícios estão ao alcance das mãos, mas a redução da carga tributária, não, pelo menos a curto prazo. As respostas sumárias que o programa eleitoral do PSL dá à questão vital da educação, outra unanimidade nacional na lista das deficiências, são muito insatisfatórias.
Tão importante quanto definir as reformas que almeja será o modus operandi do governo no Congresso, que dará a palavra final sobre seus programas. O grande cacife eleitoral recebido das urnas e o apoio de pelo menos metade dos novos governadores sugerem grande apoio parlamentar inicial a suas propostas, mesmo as mais polêmicas, como a de mudanças no Estatuto do Desarmamento.
Bolsonaro terá de ser algo maleável com a oposição, cujos partidos, PT à frente, não perderam posições no parlamento -PDT, Psol, PCdoB, PSB e Rede têm 138 cadeiras. À oposição caberá agir com racionalidade, em duas frentes importantes: as medidas necessárias para reerguer a capacidade financeira do Estado e a defesa da democracia contra eventuais investidas autoritárias da coalizão de governo.
Bolsonaro estabeleceu para si um teste importante já na formação de sua equipe de governo. Ele prometeu não fazer barganhas de ministérios em troca de apoio político, mas terá diante de si um Congresso mais fragmentado do que nunca. A composição do governo dará ideia inicial de suas chances de vitórias legislativas ao longo do tempo.
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