A economia global continua perdendo fôlego, embora perspectiva de uma recessão não esteja próxima. A OCDE, depois do Fundo Monetário Internacional, reduziu a estimativa de crescimento para 2019 e 2020 de 3,7% para 3% em 2019 e 2020, correção pouco expressiva e que parece otimista diante das correções nos preços dos ativos que estão em curso, a começar pelas bolsas americanas, cujos ganhos no ano foram aniquilados nas últimas semanas. Dois fatores estão operando simultaneamente para refrear o crescimento. O primeiro deles, e mais importante, é o aumento das taxas de juros nos Estados Unidos, que será seguido, em dezembro, pelo fim do programa de compras de títulos do Banco Central Europeu, que acumulou € 2,6 trilhões em seu balanço. O segundo é a disputa comercial entre EUA e China, que vai longe e cujas consequências são danosas para todos.
A troca de sinal da política monetária de "afrouxamento quantitativo" para aperto quantitativo (FT) tornou menos favoráveis as condições financeiras, moderando aos poucos o crescimento nos EUA e obrigou os mercados financeiros a se reposicionarem. O gradual enxugamento do dinheiro farto e barato torna mais cara a alavancagem das posições e sua desmontagem parcial tem relação com a queda das ações de tecnologia nas bolsas americanas e das apostas especulativas nas cotações do petróleo.
Este ambiente propiciou, segundo analistas, uma conjunção que não se vê desde 2008. Em 2018, ao que tudo indica, tanto os retornos dos títulos do Tesouro americano, quanto os dos títulos de alto rendimento, os dos papéis de dívida de empresas de grau de investimento, das ações e das commodities, fecharão no negativo. (Mike Mackenzie, FT, ontem). Este é um movimento esperado e por enquanto ordenado, pois os juros estão sendo reajustados gradualmente e sem surpresas.
A expansão econômica nos mercados emergentes perdeu força, freada pelas correções obrigatórias diante da alta forte do dólar em meados do ano, que foram trágicas para a Argentina, por exemplo. Dos mercados desenvolvidos, clientes de suas exportações, os EUA ainda exibem crescimento bem acima do potencial. A zona do euro voltou ao seu ritmo de sempre, um pouco acima de 1% o que não demoveu o BCE de acabar com os estímulos monetários em dezembro, como mostra a ata da reunião do banco divulgada ontem. A China, 2ª maior economia do mundo, está mais uma vez desacelerando e o Japão, a 3ª maior, teve queda do PIB no terceiro trimestre (-1,2%).
A economia chinesa, em meio a uma guerra comercial e desequilíbrios passados não resolvidos, tem menos poder hoje de reerguer a demanda global e, em especial, a dos países emergentes. Seu ritmo em outubro está abaixo dos 6,5% e com viés de baixa. O governo chinês tem todos os meios para dosar a taxa de crescimento e deixou claro que vai usá-los à vontade. O relatório trimestral do Banco Central da China foi bastante revelador sobre isso. Saiu do texto oficial a preocupação de "firmemente conter uma avalanche de estímulos" - para conter a bolha de crédito - e em seu lugar entrou a promessa de manter "liquidez razoavelmente ampla". Igualmente importante, deixou o relatório a meta de "avançar firmemente para a desalavancagem estrutural", trecho substituído pela necessidade de "aprofundar o apoio financeiro a empresas privadas e de pequeno porte".
A reversão do crescimento acima da média (EUA e zona do euro) para outro, mais moderado, levou os mercados a especular sobre a possibilidade de o Fed rever sua política. É pouco provável que o faça a curto prazo. Com os estímulos fiscais de Trump se desvanecendo, a economia americana retornará a seu ritmo normal, ao redor de 2%, uma queda que não é desprezível - uma queda pela metade do ritmo atual, de 3,6%. Que ela desacelere ainda mais não está fora de cogitação, porque o ciclo atual, bombado por injeções monetárias cavalares, é o mais longo da história recente do país.
O cenário externo será menos favorável ao Brasil, que precisa fazer um ajuste fiscal importante com um novo governo em 2019. A economia brasileira tem boas defesas que, no entanto, podem ser insuficientes se em algum momento entre os investidores prevalecer a impressão de que a solvência fiscal do Estado não está garantida. A aprovação de uma reforma da previdência logo no início da gestão de Jair Bolsonaro é vital para reduzir riscos e abrir espaços para um crescimento maior que o medíocre dos últimos dois anos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário