Folha de S. Paulo
Ao atacar presidente da CPI, Forças
sinalizam que protegerão seus corruptos
Jair Bolsonaro disse que ou a eleição
de 2022 vai ter voto impresso ou ela não vai acontecer. As Forças
Armadas e todas as outras instituições da República deveriam ter publicado uma
nota conjunta dizendo: “Jair, se der golpe, vai morrer. Abs.” Não publicaram.
Ao invés disso, na semana passada comandantes
militares ameaçaram dar um golpe de Estado caso a CPI continue
a investigar oficiais bolsonaristas que roubaram dinheiro de vacina.
Pelo menos a turma de 64 tinha a decência
de mentir que o golpe deles era para combater a corrupção. Era uma época em que
o vício ainda prestava homenagem à virtude.
A CPI da pandemia já achou indícios fortes de que existem militares e ex-militares bolsonaristas enrolados no escândalo do roubo de dinheiro de vacina.
Roberto Dias, ex-sargento da Aeronáutica
indicado por Bolsonaro para o Ministério da Saúde, é acusado de
pedir suborno de um dólar por dose de vacina comprada.
O coronel da reserva Élcio Franco, homem de
confiança de Pazuello no Ministério da Saúde, conduziu a negociação em que a
mutreta teria acontecido. Há outros militares acusados de terem pressionado
pela liberação da vacina e de terem feito a intermediação entre os picaretas e
o ministério.
Até aí, era inteiramente previsível. Os
militares são seres humanos como todos os outros. Há entre eles honestos e
corruptos, como em toda parte.
A maciça entrada de militares na máquina
administrativa brasileira, onde sempre houve os mais variados esquemas,
inevitavelmente levaria alguns deles para o lado da mutreta. Aconteceu com
todos os grandes partidos políticos.
Por isso, quando Omar Aziz, presidente da
CPI, lamentou que as investigações tenham encontrado militares corruptos, a
reação das Forças Armadas deveria ter sido dizer que corrupção existe em
qualquer lugar e que o importante é prender aqueles contra os quais surgirem
provas consistentes.
Ao atacar o
presidente da CPI do Senado, as Forças Armadas estão sinalizando,
voluntária ou involuntariamente, que protegerão seus corruptos.
Isso é ruim em si, mas é pior ainda para o
futuro da instituição: se a manobra der certo e os investigadores forem
intimidados, de agora em diante todos os ladrões que atualmente entram na
política para roubar preferirão entrar para as Forças Armadas, onde a
impunidade será garantida.
Quando Bolsonaro saiu candidato sem partido
político, mas com forte apoio nos quartéis, os militares que o apoiavam
disseram que estavam participando como cidadãos, não como militares.
Bom, quando pegaram corrupção nos partidos
dos civis, nenhum deles teve o poder de ameaçar os investigadores com as armas
e tropas da República.
A nota do Ministério da Defesa sobre a CPI
e seu silêncio sobre o golpismo do presidente da República, a entrevista
golpista do chefe da Aeronáutica, tudo isso é sintoma da degeneração moral que
Jair Bolsonaro causou na República brasileira.
O militar que acha que as armas da
República são dele é exatamente igual ao político que acha que o dinheiro
público é dele. Não deve ser difícil, para o sujeito que acha uma coisa, achar
a outra.
Por isso, lembre-se: nos próximos meses vai ter golpista falando de “esticar a corda”, de “comunismo”, e, é claro, de “voto auditável”. Não se iluda. Se houver golpe, vai ser para roubar.
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