Valor Econômico
Planalto pressiona por sabatina logo após
12 de outubro
Por ironia, a cena política desanuviou
justamente quando o tempo fechou em Brasília, com o início das chuvas. O clima
de deserto adicionava um ingrediente a mais à longeva crise de nervos dos
atores políticos na capital.
Na primeira de semana do mês não bastasse a
tensão com o imprevisível 7 de setembro, o calor era de secar o espelho d’água
do Congresso.
Com as entranhas expostas, auxiliares
presidenciais e líderes da cúpula do Centrão não disfarçavam a irritação com o
presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que na avaliação do grupo, não
agia para distensionar o ambiente político.
“Ele é candidato a presidente [da
República] e está misturando propostas de interesse do Brasil com política”,
reclamou à coluna, em caráter reservado, um importante líder do Centrão.
Na véspera, 1º de setembro, o Senado havia rejeitado a Medida Provisória (MP) 1.045, que promovia uma minirreforma trabalhista. Aliados do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), acusaram os senadores de descumprir acordo para aprovar a matéria.
Visivelmente contrariado, Lira avisou, após
o resultado no Senado, que o projeto que reabre o programa de refinanciamento
de dívidas tributárias (Refis), de autoria de Rodrigo Pacheco, iria para o fim
da fila na Câmara. “Vem primeiro CBS [Contribuição sobre Bens e Serviços, que
reformula o PIS/Cofins]. Sobre Refis, vamos esperar o Senado votar a reforma do
Imposto de Renda”, desafiou.
Para agravar a tensão entre os Poderes, no
dia 14 de setembro, Pacheco devolveu ao Palácio do Planalto a medida provisória
que dificultava a remoção de conteúdo pelas plataformas de redes sociais. A
matéria havia sido publicada na véspera do Dia da Independência como um aceno
às bases bolsonaristas.
A devolução da MP foi o estopim para
obrigar a ala política do Planalto, capitaneada pelos ministros Ciro Nogueira
(Casa Civil) e Fábio Faria (Comunicações), a entrar em campo para afinar o
diálogo com Pacheco e colocar um fim ao cabo de guerra.
Os fatos políticos recentes atestam que a
movimentação surtiu efeito. Há tempos, Pacheco e o Planalto não se mostravam
tão alinhados.
A sintonia é tão fina que o presidente do
Senado foi eloquente na cobrança pública ao presidente da Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ), Davi Alcolumbre (DEM-AP), seu fiel aliado, para
que agende a sabatina do ex-advogado-geral da União André Mendonça, indicado
por Bolsonaro para a vaga no Supremo Tribunal Federal (STF).
“Ele [Alcolumbre] tem ciência da sua
responsabilidade e da necessidade de cumprir essa missão”, cobrou Pacheco na
sexta-feira, após reunião com o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), e o
deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP), liderança evangélica que apoia
Mendonça.
No Planalto, com a intervenção de Pacheco,
a expectativa é que Alcolumbre marque a sabatina para os dias seguintes ao
feriado de 12 de outubro.
Foram explícitos os gestos do Planalto na
semana passada para acalmar e reconquistar Pacheco. No dia 22 de setembro, os
senadores aprovaram a criação do Tribunal Regional Federal da 6ª Região
(TRF-6), que terá sede em Minas Gerais. A proposta contempla duplamente o
presidente do Senado, porque atende pleito da bancada mineira e do segmento
jurídico - base eleitoral de Pacheco.
Essa votação somente se viabilizou após o
compromisso do Planalto de que Bolsonaro não vetará a matéria. De iniciativa do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), o projeto arrastava-se desde 2019 nos
escaninhos do Congresso. Na Câmara, foi aprovado em agosto do ano passado, com
o compromisso de que a instalação do novo TRF ocorrerá somente ao fim da
pandemia.
No dia 23 - um dia depois da aprovação do
TRF-6 -, Lira finalmente anunciou o relator do Refis na Câmara: o deputado
André Fufuca (MA), aliado de primeira hora do alagoano e de Ciro Nogueira.
Fufuca assumiu a presidência interina do Progressistas (PP) quando Nogueira se
licenciou para se tornar ministro. O projeto terá tramitação célere e vai
direto para o plenário.
O Planalto também espera que Pacheco ajude
a convencer o senador Ângelo Coronel (PSD-BA) a não atrasar a votação da
reforma do Imposto de Renda na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Nos
bastidores, a bancada da Bahia cobra o aval do Tesouro Nacional a um empréstimo
de centenas de milhões para o governo estadual.
Faz sol na política, mas as cigarras estão
cantando furiosas em Brasília. O canto delas atrai mais chuva, e, via de regra,
relâmpagos e trovões.
Cunha faz
escola
Se não compor, o presidente da CCJ, Davi
Alcolumbre, vai encostar no recorde do ex-deputado Eduardo Cunha em protelar
assuntos de interesse máximo do Planalto no Congresso. Há 41 dias Alcolumbre
cozinha o governo em banho-maria ao não agendar a sabatina de André Mendonça.
Em 2007, ascendendo na carreira, Cunha foi
designado relator da proposta de emenda constitucional (PEC) que prorrogava a
CPMF e a desvinculação de recursos da União, a DRU - prioridade zero do então
presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Cunha levou 45 dias para apresentar, em 13
de julho, um parecer desfavorável ao governo, que previa que a arrecadação de
cerca de R$ 40 bilhões com o imposto fosse dividida pela União com Estados e
municípios.
Nos bastidores, Cunha cobrava o cumprimento
de acordo celebrado com o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). No
livro de memórias “Tchau, querida!”, o ex-líder do MDB conta que em troca do
apoio da bancada à sua eleição, o petista assegurou que a bancada do MDB do Rio
de Janeiro indicaria o presidente de Furnas.
Diante do impasse, em 1º de agosto, Lula
convidou o ex-prefeito do Rio Luiz Paulo Conde, filiado ao MDB, para assumir a
presidência de Furnas. Finalmente, em 15 de agosto - 78 dias após a nomeação de
Cunha para a relatoria - ele alterou o parecer e a PEC foi aprovada sem
prejudicar o governo. Depois, contudo, o governo acabou derrotado no Senado.
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