Revista Veja
O TSE já se arma para evitar que ‘recados’
sobre punições mais severas caiam no vazio
O Tribunal Superior Eleitoral desde já se
prepara para que a sinalização de tolerância zero em relação ao uso abusivo dos
meios de comunicação (notadamente os digitais) na eleição de 2022 não caia no
vazio e, assim, reduza o risco de a campanha ocorrer em ambiente de terra sem
lei.
Para isso estão sendo renovadas sob normas
mais rígidas as parcerias firmadas em 2020 pelo presidente do TSE, ministro
Luís Roberto Barroso, com as plataformas de internet e discutidas com elas
novas ferramentas para facilitar a identificação da ilegalidade, permitir o
banimento ou a redução do alcance das postagens e possibilitar a produção de
provas contra os infratores.
É uma preocupação pertinente, pois uma
coisa é a disposição de aplicar punições severas. Outra é a existência de
condições objetivas para transformar a intenção em gesto.
Quando o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal — e presidente do TSE em 2022, para considerável falta de sorte de alguns —, diz que os infratores estarão sujeitos a “ir para a cadeia”, suscita dúvidas sobre os instrumentos que poderiam levar à prisão um candidato cujo registro, ou mandato, viesse a ser cassado.
Arcabouço legal para isso existe. Reforçado
por uma modificação legal feita em 2019, que incluiu as notícias falsas no
crime de denunciação caluniosa, com penas previstas de dois a oito anos de
prisão. Há ainda as possíveis e prováveis consequências de inquéritos em curso
em tribunais superiores, envolvendo o presidente Jair Bolsonaro e seus
militantes digitais.
O xis da questão está na possibilidade
efetiva de punições devido a deficiências de estrutura país afora, da
disposição real de candidatos adversários denunciarem mutuamente seus ilícitos,
da robustez comprobatória fornecida à Justiça e do efeito inibidor (ou não) que
os “recados” do TSE tenham sobre os políticos.
A despeito das dificuldades e da longa
distância entre as intenções e os gestos, o advogado Oscar Luís de Morais acha
que as posições adotadas pelo tribunal eleitoral na absolvição da chapa Jair
Bolsonaro-Hamilton Mourão e na cassação do mandato de um deputado estadual
foram pedagógicas.
Talvez não tanto quanto seria o ideal no
combate aos abusos generalizados que, pela experiência do advogado, são
cometidos em maior ou menor grau por todas as campanhas eleitorais, mas
exemplares o suficiente para dar um travo na ousadia dos infratores. O problema
não será resolvido na próxima nem na eleição seguinte, mas foi dado um passo
largo.
“Posso até não concordar com alguns
aspectos daqueles julgamentos, mas o freio de arrumação era necessário”, diz
Oscar de Morais. Ele lembra outro ponto que motivou as manifestações dos juízes
eleitorais: “A disseminação nunca vista de ataques à instituição judicial
e à desqualificação pessoal dos ministros. Era preciso um ato de contenção”.
Esse ato, posto por escrito pelo TSE e com
repercussão sobre as futuras decisões dos 27 tribunais regionais, terá o condão
de, digamos, amedrontar candidatos, partidos e marqueteiros da campanha? Na
opinião de Oscar de Morais, mais ou menos.
Os assessores jurídicos reforçarão os
alertas, “mas candidato quando põe como prioridade ganhar a eleição, e este é o
interesse geral, tem a tendência de pagar para ver”. Ele considera que os que
já andavam relativamente na linha em princípio tomarão cuidados, mas os mais
atrevidos continuarão testando limites.
Importante na análise da possibilidade de
êxito nos planos de impor maior rigor ao enfrentamento de ilegalidades é o
controle das expectativas. Não se pode achar que décadas de práticas abusivas
de um lado e de atitudes algo condescendentes de outro serão modificadas num
repente ou por obra de mera vontade, por mais forte que seja.
Os ataques ao sistema de votação têm mais
chance de ser combatidos com efetividade porque, além de os ministros estarem
com sangue nos olhos devido às agressões recebidas, a Justiça Eleitoral pode e
tem agido de ofício, por iniciativa própria.
No caso das ações tidas como deletérias
entre candidatos é mais difícil por causa da linha tênue entre crime e
liberdade de expressão. Acrescente-se o costume dos partidos de evitar
denúncias mútuas mais cabulosas, a fim de preservar um pacto implícito
garantidor da impunidade coletiva.
Publicado em VEJA de 10 de novembro de 2021, edição nº 2763
Governismo de ocasião
Votos de oposicionistas na PEC dos Precatórios não significa apoio a Bolsonaro
Soa rasa e apressada a interpretação de que
os (muitos) votos dados por deputados de partidos de oposição em favor da PEC
dos Precatórios, na madrugada da última quinta-feira, 4, demonstre a
“infiltração” de bolsonaristas nas legendas que se dispõem a impedir a
reeleição do presidente em 2022.
Esses parlamentares favoreceram o governo
sim, pois ajudaram o Planalto a abrir o caminho para ter uma dinheirama (mais
de R$ 90 bilhões) para gastar no ano eleitoral. Do ponto de vista da política
macro, bobearam. Mas, no panorama “micro” dos interesses imediatos, foram mais
oportunistas que propriamente governistas.
Ficaram com receio de ficar com o ônus de
terem se recusado a proporcionar a renovação do programa Bolsa-Família o valor
de R$ 400, mas, sobretudo, puseram os olhos nas gordas verbas prometidas a
estados e municípios, nos recursos das emendas parlamentares e nos bilhões
previsto para o fundo eleitoral.
Com a repercussão extremamente negativa e
os questionamentos na Justiça, o segundo turno da votação marcado para a
próxima terça-feira, 9, pode não seguir a tradição de confirmação do já
aprovado na primeira rodada.
Se passar, a batalha no Senado será difícil para o governo que, no mínimo, terá de aceitar modificações profundas no texto original.
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