sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Bernardo Mello Franco – O mercado, o pacote e a urna

O Globo

Ninguém discute a necessidade de equilibrar contas, a questão é definir quem vai perder

O mercado não gostou do pacote de corte de gastos do governo. Assim que o ministro Fernando Haddad terminou o anúncio na TV, as queixas começaram a pipocar no noticiário online.

“Foi mais do mesmo”, esbravejou um analista de investimentos. “Muito inadequado”, reprovou o chefe de uma consultoria. “Gerou frustração”, sentenciou o porta-voz de uma corretora.

O azedume se refletiu ontem nos indicadores econômicos. A Bolsa caiu 1,73%. O dólar chegou a ultrapassar os R$ 6. Questionado sobre as reações negativas, o ministro Fernando Haddad disse que o mercado tem errado nas previsões. “É preciso colocar em xeque as profecias não realizadas”, ironizou.

Ninguém discute a necessidade de equilibrar as contas para estabilizar a trajetória da dívida pública. A questão é decidir onde cortar — e quais setores serão poupados da tesoura.

O pacote prevê mudar a Previdência dos militares, acabar com os supersalários na administração pública e limitar o crescimento das emendas parlamentares. As medidas mexem com interesses de corporações fardadas e engravatadas. Por isso mesmo, arriscam cair no Congresso, como ocorreu com a tentativa de reduzir isenções fiscais.

O governo ainda promete endurecer regras para combater fraudes e desperdícios no Bolsa Família e no BPC. Tudo somado, projeta uma economia de R$ 70 bilhões em dois anos. O mercado achou pouco, mas cabe perguntar o que seria suficiente para saciá-lo.

Na quarta-feira, três deputados apresentaram um pacote alternativo, mais alinhado aos desejos da ortodoxia liberal. O texto prevê acabar com os pisos da saúde e da educação e desvincular o salário mínimo das aposentadorias e do BPC. Em português claro, isso significaria empurrar a conta do ajuste para os mais pobres.

O governo derrapou ao misturar os cortes com o anúncio da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, algo prometido e repetido desde a campanha. A intenção era adoçar o arrocho com uma medida popular, mas o efeito foi elevar o tom das críticas à Fazenda.

Isso não significa dizer que Lula errou por não se curvar ao programa da Faria Lima. Com ou sem pacote, a elite econômica apoiará qualquer candidato com chance de derrotá-lo em 2026.

 

6 comentários:

Mais um amador disse...

" Não acho que quem ganhar ou quem perder, nem quem ganhar nem perder, vai ganhar ou perder. Vai todo mundo perder."

Dilma Rousseff

😏😏😏

Anônimo disse...

É isso que dá gastar o que não tem: fica-se na mão de agiotas.

Anônimo disse...

Alguém já viu o mercado financeiro apoiar alguma medida do Lula? Ou elogiar alguma ideia dele? Estão apenas preocupados em como ganhar mais. E qualquer medida que signifique algum aumento de imposto pra esta elite econômica (todo mundo ganhando mais de 50 mil mensais, e tendo que pagar algum imposto de renda a mais, inclusive os que NUNCA pagaram IR) vai desagradar profundamente este setor.

Anônimo disse...

Ótima coluna!

ADEMAR AMANCIO disse...

Verdade,é por isso que eu prefiro a elite cultural.

Anônimo disse...

O 'mercado' é que nem o Bolsonaro:
Transforma tudo em mentiras, mas é inelegível.