Cristina deve ser reeleita hoje pela economia, não pelos radicais que tratam oponentes como inimigos
Um número basta para explicar a razão pela qual Cristina Fernández de Kirchner será reeleita hoje: pesquisa da consultora Poliarquía mostra que 52% dos argentinos acreditam que a presidente fez um bom trabalho.
Logo, 50% dos eleitores, pouco mais ou menos, dispõem-se a votar nela, conforme todas as pesquisas. Simples assim.
Os pesquisados atribuem especial valor à redução do desemprego (caiu de 24% para os atuais 7,3% nos anos do casal Kirchner, ou seja, de 2003 até agora) e ao crescimento econômico. Só no período Cristina Kirchner (2007/11), o crescimento médio anual foi de 6,1%, 50% mais do que a média dos anos Lula no Brasil, que catapultaram a popularidade do então presidente a níveis siderais.
É verdade que Cristina se beneficia também da solidariedade de uma fatia importante da sociedade depois que perdeu seu marido e antecessor, Néstor Kirchner. Mas é razoável supor que a solidariedade a uma viúva não resistiria a um fracasso administrativo.
O que os analistas independentes e/ou da oposição questionam é a sustentabilidade do modelo. Mas, hoje por hoje, é um debate ocioso. Só vai incidir -se incidir- sobre o pleito de 2014, quando se definirá a sucessão de Cristina, se ela resistir à tentação de mudar a Constituição para poder buscar um terceiro mandato consecutivo.
Mais importante que discutir a sustentabilidade ou não do modelo é apontar o seu principal problema. É a crispação, o patrulhamento ideológico, o tratamento de inimigos aos que são apenas adversários -de resto, um problema antigo na Argentina e, em especial, no peronismo de que Cristina é hoje a principal expoente.
Aponta por exemplo Fernando Gualdoni, argentino de nascimento, editor internacional do jornal espanhol "El País", em seu blog:
"A intransigência e a radicalização das opiniões foram se acentuando ao longo dos últimos sete anos. Desde a tribuna política, passando pelos meios de comunicação, até os papos de café entre amigos, a divisão está cada vez mais acentuada, até quebrar a sociedade entre patriotas -os defensores sem fissuras do governo- e os antiargentinos".
Reforça o professor de Filosofia Tomás Abraham, em artigo para "La Nación": "Ser um crítico do governo nacional fecha portas.
Há listas negras. Há gente da cultura que não deve ser, por ordem oficial, citada nem convidada, por não aderir ao modelo".
"Desde a Biblioteca Nacional, refúgio da cultura oficial e umbral proibido para as dezenas de intelectuais críticos do poder, até as agências de notícias oficiais, passando por "Página 12" [jornal pró-governo], há livros que não se comentam, autores que não se nomeiam, colaboradores apagados das agendas culturais, geradores de cultura eliminados dos convites nacionais e internacionais, tudo porque não são kirchneristas nem aprovam o modelo", acrescenta.
Depois do recorde histórico de 28 anos ininterruptos de estabilidade democrática, manter a crispação de sempre é terrível, pois, como diz Abraham, "aos argentinos, os conflitos nos sobram e o sangue derramado também".
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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