O ministro Ricardo Lewandowski, revisor do mensalão, absolveu ontem o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) das acusações de peculato, lavagem de dinheiro e corrupção passiva. O voto contraria decisão do relator, Joaquim Barbosa. Lewandowski concluiu pela legalidade do contrato fechado em 2003 entre a Câmara, à época presidida por João Paulo, com a agência SMPB, do empresário Marcos Valério. O ministro argumentou que o Ministério Público não apresentou provas que sustentem a acusação de que João Paulo recebeu R$ 50 mil para beneficiar a SMPB. Ele sinalizou em seu voto que tende a absolver do crime de lavagem de dinheiro réus que sacaram recursos do valerioduto. Barbosa avisou que vai rebater trechos do voto de Lewandowski. A decisão levou advogados a comemorar
Revisor afirma que contrato da Câmara é legal e vota pela absolvição de João Paulo
Felipe Recondo, Mariângela Gallucci, Eduardo Bresciani e Ricardo Brito
BRASÍLIA - Revisor do mensalão, Ricardo Lewandowski votou ontem pela absolvição do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha. Em contraponto ao relator, Joaquim Barbosa, ele considerou o deputado federal e candidato à prefeitura de Osasco pelo PT inocente dos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e dois peculatos.
Barbosa já avisou que vai rebater trechos do voto de Lewandowski na segunda-feira, quando o julgamento será retomado no Supremo Tribunal Federal. O anúncio provocou novo embate em plenário porque o revisor pediu direito à tréplica. "Se ficar claro que não terei tréplica, posso me ausentar do plenário", disse Lewandowski. O presidente da Corte, Ayres Britto, afirmou que não pretende prolongar o debate entre os dois. Reservadamente, Barbosa disse depois a colegas que não quer fazer das divergências uma "disputa pessoal".
Lewandowski concluiu seu voto ontem analisando especificamente o contrato fechado em 2003 entre a Câmara dos Deputados, à época presidida por João Paulo, com a agência SMPB, do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza. Além de João Paulo, o revisor absolveu Marcos Valério e seus ex-sócios Cristiano Paz e Ramon Hollerbach pelos crimes de corrupção ativa e peculato nesse contrato. Anteontem, Lewandowski tinha concordado com Barbosa e condenado esses três réus pelo contrato de outra agência do grupo, a DNA, com o fundo Visanet e o Banco do Brasil, além de Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do banco, por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro.
Já ontem Lewandowski contrariou o voto do relator e disse que o Ministério Público não conseguiu comprovar a acusação de que João Paulo recebeu R$ 50 mil de propina para beneficiar a agência de Marcos Valério. O ministro afirmou que João Paulo não teve participação direta na licitação para a contratação da SMPB.
Para Lewandowski, a autorização para que a concorrência pública fosse realizada foi dada pelo então primeiro-secretário da Câmara, Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), no dia 14 de julho de 2003, ao diretor-geral da Casa, Sérgio Sampaio. Posteriormente, cumprindo determinação legal, afirmou o ministro, João Paulo determinou que fosse criada uma comissão para confeccionar o procedimento de licitação.
"Foi, sim, um ato de ofício, mas de atendimento à lei que determina a criação de uma comissão de licitação", afirmou Lewandowski. "Não se tratou, pois, de nenhum tratamento privilegiado a quem quer que seja", completou. O ato de ofício, argumentou o revisor, é uma exigência para enquadrar um acusado pelo crime de corrupção passiva.
Segundo o revisor, os integrantes da comissão de licitações tinham autonomia para agir. Argumentou que os depoimentos de testemunhas confirmariam a legalidade. "Todas as provas colhidas sob o crivo do contraditório revelaram total autonomia dos membros da comissão e a higidez do processo licitatório."
Saque. Lewandowski aceitou a versão da defesa de João Paulo de que recebeu R$ 50 mil, por meio de sua mulher, Márcia Regina, para custear pesquisas pré-eleitorais em quatro municípios da região de Osasco. O revisor disse que a realização de pesquisas de intenção de voto fora do período eleitoral não precisa ser registrada. "Penso que ficou bem demonstrado que o réu solicitou os R$ 50 mil ao partido para pagar uma pesquisa eleitoral efetivamente realizada", disse. "Não ficou caracterizada, portanto, a prática do crime de corrupção passiva", disse o ministro.
O revisor argumentou que João Paulo também não poderia ser condenado por lavagem de dinheiro porque mandou a mulher sacar o dinheiro. Ele não teria, portanto, tentado dissimular a origem do dinheiro, sustentou Lewandowski. Ele destacou ainda que o próprio Ministério Público não denunciou o petista por formação de quadrilha e, por isso, ele não teria como saber se os recursos tinham origem ilícita.
O ministro também discordou da proposta de Barbosa de condenar João Paulo por dois peculatos. Segundo a acusação, o primeiro dos crimes teria ocorrido durante a execução do contrato da SMPB com a Câmara. Em seu voto favorável à condenação, o relator destacou que a agência subcontratou quase todos os serviços (99%) de forma fictícia e ilegal.
A segunda acusação de peculato também foi rejeitada por Lewandowski. O ministro concordou com a tese da defesa e concluiu que foi regular a contratação da empresa IFT, do jornalista Luís Costa Pinto, pela Câmara dos Deputados. Conforme a acusação, a empresa teria realizado, na verdade, assessoria pessoal a João Paulo.
Ministro indica absolvição de réus por lavagem
O ministro Ricardo Lewandowski sinalizou em seu voto revisor que tende a absolver do crime de lavagem de dinheiro réus que sacaram diretamente recursos do valerioduto ou enviaram pessoas com quem tinham ligação direta ou oficial. Ele reafirmou também que só considerará em seu voto as provas produzidas durante o processo, desprezando investigações feitas por CPIs, por exemplo.
Destacou que alguns dos beneficiários dos recursos enviaram pessoas que não tinham qualquer relação com eles, o que demonstraria a intenção de dissimular a origem de dinheiro. Porém, enfatizou que no caso do deputado João Paulo Cunha (PT), quem recebeu o dinheiro foi a esposa. O ministro sinalizou ainda que, para condenar réus por corrupção passiva vai exigir a comprovação de que eles tenham cometido ou deixado de cometer atos de ofício em função dos cargos que ocupavam.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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