A determinada altura da sessão desta segunda-feira o revisor Ricardo Lewandowski
justificou assim o voto pela condenação de três réus por formação de quadrilha:
"Era um mecanismo permanentemente em funcionamento. Isso caracteriza a
quadrilha, e esses crimes eram praticados à medida da necessidade demonstrada
pelos parlamentares que se deixaram corromper".
Portanto, se alguém se deixou corromper, houve também o agente corruptor
e um motivo para corrupção.
A forma da prova, entretanto, continua em debate. A manifestação
majoritária dos ministros em relação ao crime de corrupção passiva em
"fatia" anterior do julgamento do mensalão provoca revolta aqui e
ali.
Advogados de defesa, políticos e agora até um grupo de intelectuais,
artistas e acadêmicos alegam que o Supremo Tribunal Federal está inovando.
Invocam o julgamento que absolveu Fernando Collor de Mello em 1994,
reivindicando tratamento semelhante.
O próprio Lewandowski qualificou de "heterodoxo" o
entendimento preponderante no tribunal e justificou a absolvição de João Paulo
Cunha do crime de corrupção passiva dizendo que havia se baseado na
jurisprudência da ação penal 307, a do caso Collor.
Na essência da lei o STF não está criando nada. A condenação de Cunha
decorreu do artigo 317 do Código Penal, cuja definição do ilícito é a mesma:
"Solicitar ou receber, para si ou outrem, direta ou indiretamente, ainda
que fora da função, mas em razão dela, vantagem indevida ou aceitar promessa de
tal vantagem".
O único dos atuais ministros a participar do julgamento de Collor, Celso
de Mello, na época apontou a exigência de "precisa identificação de um ato
de ofício" na esfera das atribuições do presidente, para que se
caracterizasse a corrupção.
Justamente o que a Procuradoria-Geral da República não conseguiu
demonstrar na ocasião: a denúncia não descreveu uma parte do crime, não apontou
que interesses as pessoas que deram dinheiro ao operador de Collor, Paulo César
Farias, teriam nos atos do presidente.
E, naquele voto em 94, Celso de Mello falou também sobre a necessidade
de haver "uma relação entre a conduta do agente que solicita, recebe ou
aceita a promessa de vantagem indevida e a prática, que pode até não ocorrer,
de um ato determinado de ofício".
E o que demonstra a denúncia ora em exame? Exatamente a existência de
uma relação de trocas indevidas entre parlamentares, partidos e um governo
mediante práticas ilegais.
Ou seja, o Supremo não inventa. Os casos é que são diferentes.
Conceito de ética. Quando
deixou a presidência da Comissão de Ética Pública em fevereiro de 2008, três
meses antes do fim do mandato, Marcílio Marques Moreira disse o seguinte:
"Não temos nenhuma força, não temos nenhuma tropa, temos apenas a nossa
consciência e a nossa autoridade moral".
Autoridade solapada pelo então presidente Luiz Inácio da Silva ao
ignorar por diversas vezes a recomendação de que Carlos Lupi optasse entre o
Ministério do Trabalho e a presidência do PDT pelo evidente conflito de
interesses entre as duas funções.
Quando renunciou na segunda-feira à presidência da Comissão de Ética
Pública um ano antes do fim do mandato, Sepúlveda Pertence nem precisou repetir
as palavras de Marcílio para que deixasse perfeitamente entendida a razão de
sua saída.
Demolição de autoridade moral.
Desta vez pela presidente Dilma Rousseff, que resolveu retaliar contra
dois conselheiros que cobravam mais duramente explicações do ministro do
Desenvolvimento, Fernando Pimentel, a respeito de contratos de consultoria
cujos serviços não foram comprovados.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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