• Declarações de Marta Suplicy jogam novamente o Partido dos Trabalhadores numa crise existencial e indicam uma provável saída da ex-ministra da legenda, repetindo o caminho trilhado por outras estrelas petistas
Josie Jeronimo - IstoÉ
O PT que chegou e se manteve no poder nos últimos 12 anos está muito diferente daquele partido fundado em 1980 nos ideais e nas práticas políticas. Para alcançar o Palácio do Planalto, recorreu ao pragmatismo eleitoral que tanto combatia. Uma vez no poder, deixou as reformas de base e a bandeira da ética para trás, privilegiando os acordos e o vale-tudo das alianças. Colheu o mensalão e, mais recentemente, o Petrolão, escândalo de dimensões ainda maiores no seio da Petrobras, maior estatal do País. Como todo partido governista, o PT cresceu em número de militantes. As estrelas de outrora, no entanto, de tempos em tempos demonstram desilusão com os rumos da legenda e acabam por abandoná-la. Na última semana, foi a vez de a ex-prefeita de São Paulo e ex-ministra Marta Suplicy jogar o PT no divã e ensaiar uma desfiliação. "Sinto que não tenho mais nada a ver com suas estruturas. É um partido cada vez mais isolado, que luta pela manutenção do poder.Ou o PT muda ou acaba", resumiu em entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo". As declarações deixaram a cúpula da sigla em polvorosa. A senadora narrou em detalhes a desorientação da sigla às vésperas de definir se Dilma Rousseff seria a candidata à reeleição ou se o PT lançaria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Tachou o presidente da sigla, Rui Falcão, de "traíra" e referiu-se ao ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, como "inimigo".
Até novembro, como ministra da Cultura, Marta desfrutava das intimidades do governo e da Executiva do partido. Suas críticas, segundo alguns líderes do PT, são produto apenas de mágoa e de um projeto pessoal que não encontra ressonância na legenda. Este foi o argumento dos petistas na tentativa de colocar panos quentes em uma crise até então restrita aos bastidores. Além do desencanto com o partido, Marta se orienta por uma lógica política. Com a escolha de Fernando Haddad para disputar a Prefeitura de São Paulo em 2012, a senadora viu o espaço político que ajudou a construir ser ocupado. Agora, de olho nas eleições de 2016, ela quer alçar voo solo. Provavelmente, filiada a outra legenda, já que Haddad deve ser o candidato do PT à reeleição. À esquerda, recebeu convite de todas as agremiações. Entre elas, o PSB. Colegas de sigla, como o vice-presidente do PT, Alberto Cantalice, tentaram explicar a explosão de Marta. "Ela está fazendo o jogo. Como pode alegar falta de espaço se ela ocupou quase todos os cargos pelo PT? Na posse do ministro da Cultura, Juca Ferreira, os petistas tentaram demonstrar unidade. Das eleições para cá, no entanto, Marta não foi a única petista histórica a desfiar um rosário de críticas ao PT. Cerraram fileiras o dominicano Frei Betto (leia entrevista nesta edição) e o ex-porta voz da Presidência André Singer. Hoje, ambos se mostram decepcionados com as primeiras medidas do segundo governo Dilma. Em junho do ano passado, o ex-ministro Gilberto Carvalho afirmou que o PT precisava se abrir para um processo de autocrítica. O ex-ministro foi lembrado enquanto Marta acionava sua metralhadora giratória. "Já no primeiro dia, vimos um ministério cujo critério foi a exclusão de todos que eram próximos do Lula. O Gilberto Carvalho é o mais óbvio", afirmou, acusando a presidente de esvaziar a influência de Lula no segundo mandato.
Caso deixe a legenda, Marta não terá sido a primeira estrela petista a abandonar a nau, decepcionada com seus descaminhos. Pouco a pouco, o PT foi perdendo referências. Nomes como Fernando Gabeira, Heloísa Helena, Cristovam Buarque e o jurista Hélio Bicudo abandonaram a legenda. Gabeira deixou os quadros da sigla decepcionado com a política de Meio Ambiente já no primeiro ano de mandato de Lula e Cristovam foi demitido do Ministério da Educação por telefone. Em 2005, com o escândalo do mensalão, a sigla assistiu a uma debandada de desapontados. Além de Bicudo, deram adeus à legenda os deputados Chico Alencar e Ivan Valente. Mais baixas atingiram a sigla em 2009, com a saída de Marina Silva. Dois anos depois, quando precisou escolher entre o ex-tesoureiro Delúbio Soares e o militante histórico Vladimir Palmeira, a cúpula preferiu manter o condenado do processo do mensalão a conservar sua memória. Palmeira foi embora.
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