A quarta-feira, 5 de agosto de 2015, selou o fim, de fato, do modelo de governo que Dilma Rousseff vinha tentando sustentar. Sobre o pano de fundo de uma crise econômica e social – além de moral – sem perspectiva de solução a curto prazo, configura-se agora o fator político aparentemente decisivo: a base de apoio ao Planalto no Congresso Nacional desintegrou-se, ao que tudo indica de modo irreversível, a ponto de o habitualmente cauteloso vice-presidente Michel Temer proclamar que “é preciso que alguém tenha a capacidade de reunificar” o País, deixando mais que óbvia a convicção de que a presidente da República não tem condições de fazê-lo. E como a convalidar o diagnóstico do crepúsculo do governo petista, no fim da tarde da quarta-feira pesquisa do Datafolha revelou que o índice da reprovação popular a Dilma Rousseff atingiu a marca recorde de 71%.
Michel Temer falou aos jornalistas depois de se ter reunido, na manhã daquele dia, com os líderes da base aliada no Senado e na Câmara e com os ministros Joaquim Levy, da Fazenda; Eliseu Padilha, da Aviação Civil – seu braço direito na articulação política do governo –; Luis Inácio Adams, da Advocacia-Geral; e José Eduardo Cardozo, da Justiça. Depois, em tom emocionado, afirmou: “Eu queria fazer uma declaração precisamente em face das várias autoridades do Legislativo e do Executivo que passaram aqui pelo meu gabinete. A declaração eu quero fazer, na verdade, aos vários setores da sociedade brasileira”. E, contrariando o que dissera recentemente sobre a existência de uma “crisezinha”, emendou: “Não vamos ignorar que a situação é razoavelmente grave, não tenho dúvidas de que é grave, porque há uma crise política se ensaiando, uma crise econômica que está precisando ser ajustada”.
O vice-presidente da República tem sido o aliado em quem mais Dilma tem podido confiar nesse tormentoso início de segundo mandato. É particularmente grave, portanto, o sentido de suas palavras: “É preciso que alguém tenha a capacidade de reunificar, reunir a todos e fazer este apelo e eu estou tomando esta liberdade de fazer este pedido porque, caso contrário, podemos entrar numa crise desagradável para o País”.
Poucas horas depois do apelo de Temer pela “reunificação”, dois partidos da base aliada, PDT e PTB, declaravam posição de “independência” – sem nenhuma referência a deixar os Ministérios que comandam –, o que contribuiu para outra fragorosa derrota do governo na Câmara, que aprovou mais um golpe no ajuste fiscal: o reajuste de salário de várias carreiras que resultará em impacto de R$ 2,45 bilhões anuais para a União.
Enquanto isso, em mais uma demonstração do desespero do governo, o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, em depoimento numa comissão da Câmara, fez afagos à oposição, especialmente ao PSDB, e propôs um “pacto suprapartidário” para controlar a crise econômica. Para surpresa de quem conhece a habitual agressividade de Mercadante com os “inimigos”, ele chegou até a elogiar o programa de estabilidade econômica do governo FHC, do qual sempre foi um crítico rigoroso. Na véspera, em jantar na casa do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), com a presença do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e de Aécio Neves (PSDB-MG), tucanos e peemedebistas discutiram o desenvolvimento da crise política e a possibilidade do impeachment de Dilma Rousseff.
Por sua vez, em reunião com deputados estaduais e dirigentes do Partido dos Trabalhadores (PT) em São Paulo, Lula manifestou pessimismo com as perspectivas políticas. De acordo com participantes do encontro, fazendo uma comparação da situação atual do PT com a reviravolta conquistada em 2005 depois do escândalo do mensalão, ele teria declarado não acreditar que nem mesmo uma repentina e milagrosa recuperação econômica aliviaria a impopularidade do governo e do partido, porque, se antes se levantavam recursos para um “projeto político”, agora isso é feito para enriquecimento pessoal dos envolvidos nas denúncias de corrupção. Essa, é claro, é uma visão muito peculiar do processo dito político. A obra de Lula é mais complexa do que isso. Para chegar onde chegou, ele olhou para os lados enquanto seus lugares-tenentes inoculavam a máquina estatal e agentes econômicos que a ela serviu com o germe da corrupção. O contágio foi de tal ordem que hoje o Brasil se vê à matroca.
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