O Brasil e o mundo estão de luto. Duas tragédias de grandes proporções, embora com particularidades que as distinguem, abalaram o país e todo o planeta nas últimas semanas e estenderam o sentimento de tristeza para além das fronteiras das cidades onde aconteceram os desastres. Os bárbaros atentados terroristas do Estado Islâmico em Paris e o rompimento de duas barragens de uma mineradora em Mariana, Minas Gerais, uniram povos diferentes na dor e também na solidariedade.
Os brutais ataques em Paris, que levaram à morte de mais de uma centena de inocentes, atingiram o coração da Europa e o berço da liberdade, da igualdade e da fraternidade - palavras que jamais serão compreendidas pelo terror, mas dizem muito sobre a sociedade francesa. Os grupos radicais que se proliferam, desgraçadamente, em várias partes do mundo, não aceitam a democracia como valor universal e se lançam a uma guerra odiosa que ameaça conquistas sociais, a emancipação da humanidade e a paz mundial.
O ódio e a intolerância que alimentam esses assassinos surgem a partir de uma crença religiosa fundamentalista que lembra os piores momentos da história mundial, com morticínios perpetrados supostamente em nome de um deus, seja ele qual for. Trata-se da face perversa do mesmo terrorismo que vitimara Paris no início do ano, no fatídico atentado ao jornal satírico "Charlie Hebdo", e também Beirute, no Líbano, há alguns dias.
Tais forças regressivas pregam o fim do Estado laico, da liberdade de expressão e da democracia e, para tanto, eliminam aqueles que apreciam esses valores ou mesmo que não comungam de sua interpretação destrutiva da fé. A resposta a esses ataques contra a humanidade deve ser dada por todos os países democráticos do mundo, por meio do combate incessante à barbárie e à regressão de valores civilizatórios que ela representa.
O luto pelos ataques na França se estende, naturalmente, ao desastre em Minas Gerais, que deixou 11 mortos e dezenas de desaparecidos. O rompimento das barragens praticamente varreu do mapa o distrito de Bento Rodrigues, localizado entre Mariana e Ouro Preto, e a lama destruiu e arrastou casas e carros.
Se, em Paris, o fanatismo e a intolerância religiosa causaram a tragédia, o que levou ao desastre em Mariana foram a ganância desenfreada das empresas responsáveis pelas barragens que se romperam. A busca pelo lucro fácil sem nenhum comprometimento com o meio ambiente e, principalmente, com os cidadãos que vivem naquela região, diz muito sobre a tragédia.
Para agravar uma situação que já é crítica, o governo de Dilma Rousseff continua inerte, assistindo a tudo passivamente, sem nada fazer de concreto. Ao contrário: o Departamento Nacional de Produção Mineral, vinculado ao Ministério de Minas e Energia, repassou apenas 13,2% do valor previsto pela Lei Orçamentária de 2015 para o programa de fiscalização de atividades minerárias - que monitora as condições de segurança de minas, garimpos e barragens de rejeitos, como as que romperam em Minas. Segundo dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal, o valor investido em fiscalização foi de R$ 1,3 milhão neste ano, menos da metade dos R$ 3,6 milhões desembolsados até outubro de 2014. À presidente da República, não basta sobrevoar os locais afetados pelo desastre – é preciso trabalhar com seriedade e investir na prevenção antes que seja tarde demais.
Enganam-se aqueles que imaginam haver uma diferenciação entre o peso atribuído a cada uma das tragédias, no Brasil e na França. Apesar de os fatos terem natureza completamente distintas, a vida humana tem o mesmo valor em qualquer parte do mundo. As pessoas são capazes de ter mais de uma única preocupação e podem se mobilizar legitimamente por diversas causas, sem que isso signifique comoção seletiva. Nosso luto se estende de Mariana a Paris porque, de alguma forma, todos também somos vítimas da barbárie, do terror, da ganância e do descaso.
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Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS
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