• Pesquisas mostram que petista deveria liderar debate
- Valor Econômico
Os imponderáveis desdobramentos da Operação Lava-Jato continuam a assombrar o governo, mas autoridades do Executivo já têm um roteiro desenhado para tentar retirar a administração Dilma Rousseff da postura defensiva que a caracterizou nos últimos meses. O diagnóstico do que vem sendo feito errado também está claro para o Palácio do Planalto. Falta, porém, a própria presidente da República assumir pessoalmente a tarefa de liderar o debate a respeito das principais questões nacionais. Tal espaço, hoje, é ocupado por discussões sobre o impeachment e a crise econômica.
Com o amparo da Justiça, o governo conseguiu no fim de 2015 redirecionar o rito do impeachment no Congresso para um rumo relativamente mais seguro. A troca do comando do Ministério da Fazenda também deu novo fôlego às propostas do chamado "pós-ajuste fiscal". Mesmo que as medidas a serem anunciadas não tenham o impacto inicialmente esperado, as propostas voltadas à retomada do crescimento ganharam maior destaque na narrativa oficial, atendendo a uma demanda do PT, dos movimentos sociais e do empresariado. A oportunidade para que o governo pare de trabalhar apenas de forma reativa, portanto, teria sido construída.
Pesquisas internas do Planalto concluídas no fim do ano passado fundamentam o plano esboçado. As sondagens qualitativas foram feitas para ouvir avaliações de integrantes das classes C, D e E que moram em centros urbanos sobre o desempenho do governo, a atuação pessoal de Dilma, os programas sociais e as conjunturas política e econômica.
O resultado não chega a ser novidade para quem tem contas a pagar ou acompanha o noticiário político, mas deu novas evidências sobre o que derrubou a popularidade da presidente e o que a petista deveria fazer. A percepção majoritária, mesmo entre os entrevistados que a apoiam, é de que a situação econômica do Brasil é "péssima", "difícil" e o orçamento familiar está "muito apertado".
Quando comparam a atual conjuntura com 2014, ano em que a presidente reelegeu-se, os participantes dos grupos de discussão reclamam do aumento dos gastos com energia, água e alimentação. Demonstram insatisfação com o desemprego e o achatamento dos salários oferecidos a quem tenta uma recolocação no mercado de trabalho. Em outras palavras, a crise é sentida no dia a dia da população, gerou mudanças de hábitos e cortes de gastos principalmente em lazer.
A crise política é vista como resultado da corrupção, da tentativa de a oposição derrubar o governo e da carência de políticos honestos. Além da sensação de abandono, foi detectado sentimento de que os políticos brigam por benefícios próprios e se esquecem dos interesses da população.
Se por um lado a pesquisa captou um reconhecimento das realizações do governo para beneficiar os mais pobres e um esforço pela manutenção de programas sociais mesmo num momento de ajuste fiscal, também colheu cobranças para que Dilma tenha uma postura mais enfática no combate à crise econômica. Como há um descrédito geral em relação aos políticos, houve um consenso de que a entrada de um outro governante na Presidência não resolveria a situação.
As sugestões apresentadas ao governo para enfrentar a crise são "combater e estancar a corrupção", recuperar o dinheiro desviado e reinvesti-lo no país ou usá-lo para o pagamento de dívidas. Outros exemplos são a execução da reforma administrativa, que ainda não saiu do papel, e até uma ação de maior firmeza em relação à oposição. Essa percepção poderia dar lastro a um discurso de que o país é vítima de um boicote das siglas oposicionistas. A recriação da CPMF, contudo, sofre resistências.
A comunicação do governo, segundo os entrevistados, deve ser encabeçada pela própria presidente e precisaria demonstrar de forma didática onde são gastos os impostos, quais os resultados dos programas sociais e as ações para combater as causas e os efeitos da crise econômica. O mesmo conselho é endereçado ao gabinete de Dilma por integrantes do governo, os quais lembram que em muitos casos esse tipo de iniciativa não gera despesas. A presidente e os ministros de Estados teriam apenas que, retomando prática comum durante os governos Lula, defender os programas do Executivo nas mais diversas áreas e o projeto de país da esquerda, num momento em que uma onda conservadora ganha força em vários segmentos da população. Em sua recente reforma ministerial, no entanto, Dilma optou por ministros com perfis modestos, mas que lhe garantam apoios no Parlamento, onde as batalhas mais duras do impeachment serão travadas.
O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, é lembrado como um exemplo. Mesmo sem receber os recursos que esperava do governo federal, ele estabeleceu uma agenda capaz de sensibilizar parcelas do eleitorado paulistano que até então sempre foram menos simpáticas ao PT. Apostou no transporte público, ciclovias, redução da velocidade máxima de vias a fim de melhorar o fluxo de veículos e diminuir o número de acidentes e no uso da avenida Paulista para lazer. Também recebe elogios por sua luta contra máfias locais.
Dilma, por outro lado, nem transmite mais o programa semanal de rádio "Café com a Presidenta" desde junho de 2014, quando a campanha eleitoral se iniciava formalmente.
Quem assumiu em parte esse papel recentemente foi o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, assim como Haddad cotado como possível candidato petista para 2018 e homem forte do segundo mandato. Wagner defendeu uma reforma política. Nas redes sociais, escreveu sobre o reajuste do salário mínimo, o reconhecimento internacional do Bolsa Família, a eficiência dos aeroportos, o Estatuto da Pessoa com Deficiência e a lei que garante cirurgias reparadoras a mulheres vítimas de violência. Nesse meio tempo, Wagner teve que rebater denúncias - até agora inconsistentes - pinçadas do material obtido com os investigados pela Lava-Jato. Novamente os imprevisíveis desdobramentos da operação estão atropelando os planos do governo.
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