O Estado de S. Paulo
A meninada da antiga sabe o que é jogo do joão-bobo. São necessárias, no mínimo, três crianças para jogar: duas para arremessar a bola e uma no meio para interceptar os lances. Desta se diz que está “no bobinho”, com os jogadores fazendo de tudo para lhe dificultar a posse da bola.
É mais ou menos a situação em que se encontra a reforma da Previdência Social, considerada essencial para o acerto de contas públicas. O governo propõe, a oposição rebate dizendo que apoia, mas condiciona à adesão do PT, sabendo que essa sustentação não tem a menor chance de acontecer.
O governo ainda não se entendeu a respeito dos pontos de alteração no sistema previdenciário, mas o PT já fechou questão a respeito: não vai aderir a mudanças, quaisquer que sejam elas, pelo simples motivo de que considera esse o único traço de união com suas bases (centrais sindicais e movimentos sociais) e, portanto, a última esperança de algum se desempenho eleitoral minimamente razoável.
Quando o PSDB anuncia atitude mais “propositiva” dizendo-se disposto a apoiar medidas que fazem parte do histórico programático do partido, o faz mediante condicionante sabidamente impossível.
Fica a reforma, então, destinada até segunda ordem a transitar como ‘bobinho’ entre a conveniência do PT e o interesse da oposição.
Qualquer semelhança.
Há quem veja na manifestação da jornalista Mirian Dutra sobre seu relacionamento com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso uma daquelas oportunidades tão caras ao PT de cotejar suas agruras com os dissabores do PSDB, a fim de se beneficiar da mistura de estações.
Por esse raciocínio, o constrangimento na seara tucana serviria para desviar o foco das suspeitas de favorecimento ilícito que pesam sobre o ex-presidente Luiz Inácio da Silva.
Dificilmente. E já que os petistas gostam tanto de comparações, vamos a elas: ao contrário de Lula, FH se manifestou de pronto, explicando que o dinheiro enviado a Mirian saiu de seu bolso e foi transferido por contas bancárias legalmente mantidas no exterior.
A princípio, não há relação entre o exercício da presidência e o pagamento de mesada para sustento do filho que Fernando Henrique reconhece como dele, não obstante a existência de dois exames de DNA negando a paternidade. A ponta solta desse caso - que pode e deve ser objeto de investigação - é se a empresa (Brasif) que fez o contrato de trabalho fictício com Mirian para o envio de US$ 3 mil mensais obteve em troca algum benefício do governo.
Nem tanto ao mar. O sistema de tramitação de ações judiciais não conspira a favor da celeridade, é fato. Ocorre, porém, que a pressa mediante atropelo de etapas constitucionalmente previstas tampouco confabula em prol da perfeição.
A decisão do Supremo Tribunal Federal de autorizar a prisão de réus condenados em foros de segunda instância, sem dúvida resulta em economia processual. Este é um aspecto da questão. O outro diz respeito à subtração de direitos expressos no capítulo das garantias individuais consagradas na Constituição, cujos ditames asseguram as prerrogativas de todo e qualquer cidadão. Poderosos ou não.
De onde há razão dos dois lados: entre os que defendem e os que condenam a decisão. Conforme, aliás, esteve expresso no resultado da votação do Supremo (7 a 4) com os votos vencidos, entre outros, de Celso de Mello e Marco Aurélio Mello, ministros de inquestionável experiência e notório saber jurídico.
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