- O Estado de S. Paulo
• Desmontar parte das renúncias fiscais é um caminho auxiliar no reequilíbrio das contas públicas
Está marcada para hoje reunião dos governadores estaduais com representantes do governo federal, representado pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para a busca de respostas emergenciais a problemas tão agudos quanto a falta de recursos para honrar a folha de salários de servidores e aposentados. Ainda que a esta altura a definição de um alívio imediato para as contas públicas dos Estados seja inevitável, os conflitos decorrentes do colapso das finanças estaduais, dos quais o caso do Rio de Janeiro é apenas o exemplo mais premente e dramático, reafirmam a urgência de uma solução estrutural para os desequilíbrios fiscais existentes.
Por “solução estrutural” entenda-se um conjunto de medidas, com aplicação e efeitos de longo prazo, que não se limitem ao necessário, mas insuficiente controle de gastos. As receitas de tributos – aí incluídas aquelas que deixam de ser arrecadadas à guisa de isenções, desonerações e pura sonegação –, são parte ativa do problema e, como tal, deveriam também ser parte ativa da sua correção.
A crise fiscal dos Estados tem origem na contração das receitas, derivada da recessão, mas não só. Embora existam exceções, o padrão das contas estaduais revela o descalabro de anos e anos de uso irresponsável dos recursos públicos e da apropriação indevida de parte deles por grupos de interesse. Tentar resolver essa equação difícil apenas com cortes de gastos, concentrando os ônus do ajuste em servidores, aposentados e na população mais carente, atingida pela redução da oferta de serviços públicos, não só é socialmente injusto como politicamente inviável — ver, a propósito, os distúrbios de rua dos últimos dias no Rio.
Ao argumentar que ajuste fiscal estrutural não combina com elevação de carga tributária, o governo tem contribuído para interditar um debate incontornável e dificultar tanto o próprio reequilíbrio fiscal quanto a retomada do crescimento. A ideia por trás do argumento é a de que complementar o ajuste com elevações de carga tributária, diante do caráter estrutural do aumento de despesas, expressa um tipo de leniência que apenas acabará adiando, mais uma vez, o ajuste permanente. Ocorre que, se esta é uma conclusão possível ante a história dos ajustes pregressos, não há razão para carimbá-la como inevitável.
Não se trata de elevar a carga de tributos tirando mais de quem pode menos ou apertando o cerco a quem pode mais, relaxando nos cortes e controles de despesas. A previsão oficial é de que, só com desonerações e renúncias fiscais, R$ 280 bilhões deixarão de entrar nos cofres públicos — o exato dobro do déficit primário estimado. Muitas dessas renúncias configuram privilégios a grupos de interesse e são casos já provados de uso ineficiente do dinheiro público. O Rio, não por coincidência, é campeão desse tipo de benesse com o bolso do contribuinte.
Desmontar pelo menos parte dessas renúncias fiscais é um caminho complementar óbvio para a execução de um ajuste fiscal tão mais consistente quanto viável. Renúncias e desonerações, em todo o resto do mundo, são classificadas como gastos tributários. Se são gastos, por que não inclui-los nos controles que se pretende impor a outras despesas?
Mais ainda pode ser feito em favor do reequilíbrio das contas públicas, além de controlar gastos. Está aí o recente bom resultado da primeira edição do programa de repatriação de recursos mantidos ilegalmente no exterior a mostrar o valor para o ajuste fiscal de uma ação sistêmica de recuperação de receitas.
Somente nesta operação, cerca de R$ 50 bilhões, entre impostos e multas, entraram para os cofres públicos, referentes a R$ 170 bilhões sonegados por 25 mil contribuintes. Além de ajudar a compensar previsíveis reduções de arrecadação, em razão da contração do crescimento da economia, no próximo ano, parte desse montante terá de ser destinada aos cofres estaduais, aliviando a fortíssima pressão que hoje pesa sobre eles.
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