- Valor Econômico
• Queda de juro é decisão mais eficaz para o crescimento
As duas informações econômicas mais relevantes da semana serão divulgadas na quarta-feira e serão eloquentes sobre o Brasil: o Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre encolherá mais que o observado nos dois períodos anteriores, jogando por terra a expectativa que o quarto trimestre seria de retomada da atividade; a taxa Selic, mesmo com uma segunda redução, seguirá elevada.
Essas informações podem intensificar a crise política deflagrada por suspeita de tráfico de influência pelo ex-ministro Geddel Vieira Lima, da Secretaria de Governo, que demitiu-se uma semana depois de o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero entregar o cargo, acusando Geddel de pressão para liberar uma obra em Salvador, Bahia.
A saída dos dois ministros respingou no presidente Michel Temer, também acusado por Calero que sentiu-se por ele pressionado para encontrar uma solução para o entrevero com Geddel, e poderá exigir do governo um afinado discurso pró-crescimento econômico inclusive para evitar desgaste da imagem do governo e do próprio Temer.
Nas últimas duas semanas, mais que alertar para a necessidade de o Congresso aprovar reformas, Temer e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, passaram a destacar a importância da recuperação da atividade, inclusive como elemento estabilizador das relações entre os governos estaduais e a União. Alguns Estados, com imensa dificuldade financeira, mostram-se incapazes de conter uma crescente tensão social que também preocupa o Palácio do Planalto.
Na quarta-feira, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresentará o PIB pela manhã; o Comitê de Política Monetária (Copom) informará a próxima Selic, e o comunicado que a acompanha, após às 18h. E o mercado financeiro tem firmes prognósticos para os dois indicadores, mostram pesquisas realizadas pelo Valor na semana passada. O PIB deve encolher 0,9% de julho a setembro - estimativa média de 20 profissionais de bancos e consultorias - e cair 3,2% em relação a igual período do ano passado.
A Selic da transição de 2016 para 2017 deve ser reduzida em mais 0,25 ponto percentual, para 13,75% ao ano, de acordo com a avaliação de 28 do total de 32 especialistas consultados. Há poucas semanas, gestores e investidores apostavam em uma progressão mais acelerada de um ciclo de alívio monetário. Corte de 0,50 ponto percentual foi uma boa aposta até o encerramento da eleição americana com a vitória do republicano Donald Trump.
Presidente eleito de um país dividido, mais conservador e com uma ampla classe média sendo sucateada, Trump atiçou os mercados por não poupar críticas à gestão da política monetária de Janet Yellen, presidente do Federal Reserve, o BC dos Estados Unidos. Em um discurso objetivo ao Congresso e respostas de sentido inequívoco às questões levantadas pelos parlamentares, Yellen afirmou que pretende cumprir seu mandato até o fim, em 2018, e reiterou a sinalização que a taxa básica dos EUA deve subir em dezembro.
A deterioração de preços dos ativos financeiros em todas as praças internacionais de negociação reduziu o espaço que o BC teria para acelerar o corte da taxa Selic. O mundo ficou mais arriscado. A desvalorização do real em sua comparação com o dólar adicionou cautela ao cenário subitamente chacoalhado pela demissão de dois ministros de Estado em uma semana.
Apesar do discurso do governo sobre a necessidade de retomar o crescimento, o Planalto e o Ministério da Fazenda não conseguiriam dar um gás na atividade.
Paulo Gomes, economista-chefe da Azimut Brasil Wealth Management, pondera que a retomada pouco depende das autoridades. "O programa de concessões, privatizações, licitações de novas áreas de petróleo - há cinco anos não ocorrem - poderia acelerar o crescimento, mas mesmo programas não são tão rápidos, pois há trâmites legais a serem cumpridos. Dificilmente ocorreriam [tais avanços] nos próximos meses."
Gomes acrescenta que negociações internacionais poderiam estimular exportações e investimentos de estrangeiros. Comenta que, em outubro, o Brasil registrou o maior investimento estrangeiro do ano, US$ 8,4 bilhões, 34% acima da média dos últimos 12 meses. Mas ele entende que a redução da taxa de juro é o canal mais ortodoxo, eficiente e democrático economicamente para estimular o crescimento.
"O mais provável para animar a atividade é a redução de juros, que tende a prosseguir em função da queda da inflação. Outro canal seria a aprovação de medidas para a retomada da confiança dos investidores na estabilidade econômica, sobretudo na dinâmica da dívida pública. Isso significa aprovar a emenda constitucional que limita os gastos públicos à inflação e a aprovar a reforma da Previdência", diz o economista. Para ele, o corte nos juros é consequência de uma inflação menor, ao contrário de experiências anteriores, onde se utilizava a política monetária para estimular a economia a despeito de seus impactos na inflação.
Com o recolhimento compulsório dos bancos sobre depósitos no BC superior a R$ 420 bilhões - nível mais elevado desde 2011-, uma liberação para destravar o crédito até seria possível, avalia Gomes, da Azimut, que duvida da eficácia da medida. "Hoje há recursos disponíveis, mas o crédito parece pouco dinâmico. Alguns fatores contribuem para isso: os tomadores de recursos estão com pouca demanda, pois há capacidade ociosa nas empresas, as pessoas físicas temem contrair dívidas em cenário de desemprego elevado e os bancos estão receosos com eventual crescimento de inadimplência."
A busca dos investidores por aplicações mais seguras inundaram os bancos de liquidez, relatam Vinícius Pinheiro e Felipe Marques, repórteres do Valor. Em setembro, havia cerca de R$ 5,7 trilhões de recursos aplicados direta ou indiretamente nas instituições financeiras, volume 8% maior que o do mesmo período em 2015. As aplicações cresceram com o saldo do crédito em queda de 2% no total.
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