- O Estado de S.Paulo
A dúvida é se a proposta de Bolsonaro para a Previdência será dura ou mais aguada
A proposta de reforma da Previdência a ser enviada ao Congresso por Jair Bolsonaro, caso as pesquisas de intenção de voto confirmem sua ampla liderança e ratifiquem a sua vitória na eleição presidencial, poderá frustrar a imagem de reformista que o candidato do PSL tem entre os investidores que lhe bancaram o apoio praticamente unânime.
As mais recentes declarações de Bolsonaro e seus principais auxiliares, como o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), já “nomeado” ministro-chefe da Casa Civil num eventual governo dele, foram na direção de mudanças bem mais graduais e aguadas na Previdência Social em comparação, por exemplo, com o projeto original de reforma enviado por Michel Temer em dezembro de 2016.
Por essas declarações, a idade mínima de aposentadoria, que na versão final do projeto do governo Temer ficou em 62 anos para mulheres e 65 anos para homens, deve ser mais baixa na reforma que Bolsonaro tentará aprovar no Congresso. É provável que seja mantida a diferenciação na idade de aposentadoria entre homens e mulheres.
Com o histórico de votações de Bolsonaro em 27 anos como parlamentar, como esperar mudanças significativas que afetem os benefícios de militares? É bom lembrar que a bancada no Congresso de representantes dessa corporação aumentou.
Vale destacar que é preciso dar um desconto, neste momento, no discurso de Bolsonaro e de seus auxiliares sobre a reforma da Previdência, pois dificilmente antes da votação do segundo turno um candidato anteciparia uma proposta muito dura de um tema bastante impopular entre os eleitores para não pôr em risco sua vitória.
Fica a dúvida, portanto, se o recuo de Bolsonaro e de seus auxiliares em direção a uma reforma da Previdência mais dura e mais próxima com o que os investidores esperariam é por convicção ou por mera estratégia eleitoral?
Supondo que, de fato, Bolsonaro envie ao Congresso uma proposta mais diluída do que o projeto original enviado por Temer, a reforma da Previdência dele ainda poderá ter um impacto importante nas contas públicas e, por tabela, na confiança de investidores, empresários e agências de classificação de risco sobre as perspectivas da economia brasileira.
Para tanto, é preciso que a proposta de Bolsonaro contemple alguns itens fundamentais. O primeiro seria atacar privilégios do Regime Próprio da Previdência Social, que atinge os servidores públicos, os quais, exceto uma nova idade mínima de aposentadoria, ficaram praticamente de fora na versão final do projeto de Temer em tramitação no Congresso. O projeto que quase chegou a ser votado concentrava-se muito no INSS, que rege os benefícios dos trabalhadores da iniciativa privada.
Também seria fundamental a proposta de Bolsonaro incluir um tratamento específico dos funcionários que entraram no serviço público antes de 2003, os quais ainda têm direito a se aposentar com o valor do último salário e com reajuste igual ao servidor da ativa. Isso exigiria rever direitos adquiridos, o que não é tarefa fácil se o tema acabar nos tribunais e for julgado por quem também seria afetado por tais mudanças.
Talvez a aposentadoria de servidores públicos antigos não chegue a ser o ponto mais crucial em termos de valores, mas o simbolismo político é sem precedentes no sentido de se vender aos eleitores de que se está propondo uma reforma justa, sem privilégios.
Igualmente importante será a regra de transição que a proposta de Bolsonaro vai contemplar para questões como o tempo mínimo de contribuição exigido para aposentadoria, que ficou em 25 anos no projeto encaminhado por Temer.
Se a mudança para as novas regras for diluída por muito tempo, a perder de vista, o mercado concluirá que a proposta de Bolsonaro será uma “não reforma” e pouco vai alterar a urgência que exige o controle dos gastos públicos. Quanto mais curto for o período de transição para as novas regras, maior será o seu impacto. Todavia, uma transição abrupta enfrentaria forte resistência política.
O mais provável é que, ao vencer a eleição presidencial e assumir o governo, Bolsonaro encaminhe uma proposta de reforma da Previdência mais dura do que a sua base de apoio partidário no Congresso acabe aprovando. O problema é se, antes de chegar ao Congresso, seu projeto já tenha um desenho mais aguado para acabar sendo diluído ao final da tramitação, como sempre acontece.
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