- Folha de S. Paulo
Erros do partido contribuíram para a ascensão dele, mas outros elementos também intervieram
Para responder à pergunta do título, precisamos explorar um pouco a cadeia da causalidade. Tudo tem causas proximais e distais. Quando eu digo que o vírus provocou a doença no paciente, estou me referindo à causa mais imediata. Mas, se eu quiser ser mais abrangente, poderia mencionar também causas mais remotas, como as comorbidades de que ele padecia e fragilizavam seu sistema imune e até seus péssimos hábitos de higiene, que acabaram facilitando a entrada do vírus.
Para fazer jus ao título de “criador”, o agente precisa ser causa imediata ou pode estar um pouco mais afastado na cadeia? É fácil ver que as posições extremas levam a paradoxos. Se eu for muito rigoroso ao exigir que a causa seja imediata, teria de inocentar o pistoleiro que erra o tiro disparado contra a vítima, mas a faz sair em disparada pelas ruas e ela morre atropelada.
Se for excessivamente liberal, teria de responsabilizar o Big Bang por todos os problemas do mundo. Foi, ele, afinal que gerou a matéria —e não há nada que classifiquemos como problema que não envolva átomos.
Voltando a Bolsonaro, dá para dizer que ele é uma criação do PT? O partido de Lula, embora seja um cofator relevante do fenômeno Bolsonaro, não é obviamente sua causa imediata. Eu diria que qualquer um que pretenda fornecer uma explicação minimamente completa da eleição de 2018 terá obrigatoriamente de apontar os muitos erros cometidos pelo PT que contribuíram para a ascensão do futuro presidente, mas me parece um exagero atribuir ao partido a paternidade exclusiva da encrenca. Muitos outros elementos também intervieram, como as hesitações dos tucanos e a competente utilização das redes sociais pela campanha de Bolsonaro.
No final das contas, a causa imediata da eleição do capitão reformado foi o fato de que ele obteve o voto da maioria dos eleitores. É o que acontece nas democracias, para o bem e para o mal
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