Sem isso, governo Bolsonaro pode fracassar, por melhor que sejam seus projetos de reforma e programa
Concluída no domingo a montagem de sua equipe de 22 ministros e diplomado ontem pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o presidente eleito Jair Bolsonaro prepara-se para se submeter ao teste de vida real a partir de 1º de janeiro. Até a etapa vencida ontem, pode-se dizer que foi bem-sucedido, ao construir um ministério com dois fortes pilares, as duas superpastas da Economia e da Justiça e Segurança Pública.
Acerta, de fato, ao criar ministérios robustecidos, para enfrentar dois focos de sérias dificuldades para o Estado e a sociedade: o desajuste fiscal, gerado e mantido por uma previdência desajustada em relação ao estágio demográfico brasileiro, e ainda responsável por privilégios de castas incrustadas na máquina burocrática; e a longa crise de segurança pública, que chega a ameaçar o próprio estado democrático de direito.
Além disso, a pasta tratará da corrupção instalada no Estado por meio do conluio entre políticos e grandes empreiteiros, mas já sendo reprimida pelas instituições, embora haja mesmo a necessidade de ajustes na legislação, não só para evitar retrocessos no que já foi feito, mas também a fim de se avançar na prevenção. São corretas as escolhas do economista Paulo Guedes e do juiz Sergio Moro para os ministérios.
Por uma dessas coincidências, Bolsonaro repete o primeiro governo Lula (2003-2006), quando o petista montou uma equipe econômica à altura da crise daquele momento, causada pelo temor com a chegada do PT ao Planalto, o que provocou uma corrida contra o real. Com Antonio Palocci no Ministério da Fazenda, o Banco Central presidido por Henrique Meirelles, e Joaquim Levy na Secretaria do Tesouro, a situação foi contornada, a inflação saiu da zona dos dois dígitos, e o PIB voltou a crescer.
Bolsonaro, como Lula, se equivoca em algumas nomeações de inspiração ideológica. A entrega do Ministério das Relações Exteriores para o jovem embaixador Ernesto Araújo, defensor de Trump em textos na rede social e publicações acadêmicas, cria preocupações com a necessidade de o Brasil não estabelecer alinhamentos automáticos, mais ainda no momento em que Estados Unidos e China, os dois maiores parceiros comerciais do país, estão em uma guerra de tarifas.
Há preocupação também com o MEC, para o qual irá Ricardo Vélez Rodrígues. Apoiado pela bancada evangélica, Vélez tem o árduo trabalho de executar projetos de melhoria da qualidade da educação pública básica. Será imperdoável perda de tempo tentar implementar o projeto ultraconservador do Escola Sem Partido, estreitando os espaços para o aprendizado e a circulação livre de ideias nas salas de aula.
Qualquer equipe ministerial pode receber críticas pontuais. No caso de Bolsonaro, por enquanto a grande falha é a ausência de definição de quem fará o meio-campo de mediação política entre governo e Congresso. Pode ser que um presidente vindo do baixo clero da Câmara carregue alguns vieses. Eles são visíveis em escolhas ministeriais, mas isto não tira a responsabilidade de Bolsonaro de trabalhar para que haja um terreno aplainado para facilitar o entendimento com deputados e senadores.
O presidente eleito faz bem em vetar conchavos fisiológicos. A questão é como executar negociações com base em projetos, sem toma lá dá cá, e quem as fará. O deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), da futura Casa Civil, transita neste terreno. Outros podem ajudá-lo. Importante é haver logo uma definição, também para evitar que haja zonas cinzentas em que filhos do futuro presidente também atuem como negociadores apenas por terem uma credencial genética. Neste caso, estarão criadas as condições para crises políticas palacianas, num governo que precisa agir rápido, para executar reformas, a da Previdência em primeiro lugar.
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