O
presidente teria de fazer a coisa certa no campo econômico a partir de agora
O
ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal, tomou uma decisão paradoxal, dentre
a coleção de paradoxos da jurisprudência da Corte em relação à Operação
Lava-Jato. Resolveu adotar o ponto de vista que derrotou o seu ao longo da
sessões da Segunda Turma: as denúncias contra o ex-presidente Lula constantes
de quatro processos, não poderia ter foro em Curitiba, sob o juiz Sergio Moro.
Por incompetência de juízo, as duas condenações de Lula no caso do triplex do
Guarujá e do sítio de Atibaia foram anuladas, assim como processos sobre
contribuições de empreiteiras para o Instituto Lula e a compra de um terreno
para a instituição. Lula recuperou seus direitos políticos e deverá ser
candidato à Presidência novamente.
Na
labiríntica legislação brasileira, depois de duas condenações em segunda
instância e um ano e meio de prisão de Lula, descobriu-se que ele sequer
poderia ter sido julgado aonde foi. Fachin não emitiu juízo de valor sobre as
acusações e provas contra Lula, mas apenas sobre os procedimentos incorretos -
o calvário de outras operações contra a corrupção, como Castelo de Areia e
Satiagraha. Ele encaminhou os processos para a Justiça Federal do Distrito
Federal, onde eles poderão ser reaproveitados ou reiniciar a partir do zero.
Fachin tentou preservar o legado de decisões da Lava-Jato e impedir que a
Segunda Turma, onde a trinca Gilmar Mendes-Ricardo Lewandowski-Kassio Nunes
formou maioria contra as decisões da 13ª Vara de Curitiba, julgasse a suspeição
do então juiz Moro.
A ação de Fachin preserva os processos contra Lula, mas deixa a porta aberta para que todos os outros que não tiveram conexão direta com a Petrobras, julgados por Moro tenham o mesmo destino dos do ex-presidente e sejam encaminhados ao juízo competente. Já a decisão de que Moro foi parcial pode trazer, no limite, a anulação massiva de processos. A maior operação anti-corrupção da história brasileira se tornou, segundo disse ontem Gilmar Mendes, um de seus algozes, “o maior escândalo judicial” que o país assistiu. O ocaso de Lula nas mãos de Moro deu lugar à ressurreição de Lula e o fim da saga do ex-juiz.
Quando
toda interpretação legal é possível no topo da Justiça, prosperam os interesses
pessoais e políticos. No auge do prestígio da Lava-Jato, o STF seguiu a onda,
até mudar de posição e perseguir ilegalidades cometidas. Gilmar Mendes impediu
a posse de Lula na Casa Civil, mas não a de Moreira Franco em cargo ministerial
em 2017, em circunstâncias semelhantes. Moro vazou áudio entre Lula e a
presidente Dilma Rousseff em horário em que as gravações já deveriam ter
cessado. Após o respaldo de ministros do STF a atos como esse, seguiu-se o
bangue-bangue legal que hoje volta-se contra os procuradores de Curitiba. Como
os ventos sopram em outra direção, a Segunda Turma rejeitou a denúncia contra o
“quadrilhão do PP”, processo que envolvia o novo presidente da Câmara, Arthur
Lira.
Eleito
sob a bandeira do combate à corrupção, o presidente Jair Bolsonaro abandonou-a
tão logo foi eleito e depois pôs para fora de seu governo Sergio Moro, ministro
da Justiça. Espalhou aliados pela Procuradoria Geral da República, STF,
enquanto um aceno com cargo no STF a ministros do Supremo Tribunal de Justiça
tem dado resultados positivos no processo em que seu filho Flávio é acusado de
desvio de recursos públicos no caso das “rachadinhas”.
Por
mais que Bolsonaro e seu entorno possam ver sinais positivos na perspectiva de
enfrentar Lula nas urnas - seu inimigo preferido - eles podem estar errados. O
momento é péssimo para Bolsonaro, cuja popularidade cai com o recorde de mortes
causados por uma pandemia que menosprezou e que se recusa até agora a combater.
O custo desta cegueira começou a ser cobrado com dólar alto, saída de
investidores, desemprego recorde, juros a caminho da alta e economia rumo à
recessão no primeiro semestre.
A
polarização que ressurge foi o campo favorito de Bolsonaro quando ele não tinha
ocupado a chefia do Estado. Bolsonaro agora tem uma obra a apresentar - e ela é
péssima, capaz de premiá-lo como o presidente mais incompetente da história da
República. No meio do caminho até as urnas há uma brutal pandemia e a economia
terá de reagir, se não quiser ser derrotado. O presidente teria de fazer a
coisa certa no campo econômico a partir de agora, mas seu histórico vezo
populista e corporativo indica que ele dificilmente mudará sua verdadeira inclinação.
Não deixa de ser irônico que o ministro Gilmar Mendes, para defender o devido processo legal e tentar comprovar que Sergio Moro foi parcial ao condenar o ex-presidente Lula, tenha lançado mão do fruto de um crime: mensagens furtadas do aplicativo de comunicação entre Moro e procuradores da Operação Lava-Jato. “Não se combate crime cometendo crime”, afirmou Gilmar ao votar pela suspeição de Moro.
Ele
acusou Moro e os procuradores de inspirar-se numa justiça “soviética”. Afirmou
que havia na Lava-Jato um “projeto de poder”. Toda a argumentação que
apresentou ontem à Segunda Turma do Supremo era acompanhada da leitura de
longos trechos das mensagens. Pelo argumento de Gilmar, o fruto de crimes pode
ser usado em benefício da defesa, jamais da acusação.
Mas
o que se viu ontem mostra que não estava em jogo a defesa ou a absolvição de
Lula, já que todos os processos conduzidos por Moro contra ele haviam sido
anulados na véspera pela decisão do ministro Edson Fachin. Estava em jogo a
condenação de Moro e a invalidação das provas colhidas pela Lava-Jato. O
julgamento foi interrompido pelo pedido de vista do ministro Nunes Marques
quando o placar estava empatado em dois a dois.
A
primeira dúvida agora é se, caso o tema venha a ser discutido em plenário,
prevalecerá a anulação das condenações de Moro proferida por Fachin (que
procura manter íntegras provas e denúncias contra Lula) ou a nulidade total
defendida por Gilmar (que invalida todos os atos de Moro e anula as provas).
Outra questão é se, caso a relação dos procuradores com o juiz venha a ser
considerada suspeita, outros condenados reivindicarão anulação de seus
processos. O efeito da suspeição de Moro poderá ser, na prática, o fim da maior
operação de combate à corrupção na história do Brasil.
Não
custa lembrar: Lula foi condenado com base em provas robustas, e as sentenças
foram confirmadas na segunda instância (TRF-4) e no Superior Tribunal de
Justiça (STJ). Emilio Odebrecht confessou a participação de sua empreiteira na
reforma do sítio de Atibaia. Leo Pinheiro, da OAS, aparece em imagens visitando
com Lula as obras que sua empreiteira fazia no triplex do Guarujá. Foram
encontrados documentos com rasuras mostrando a troca de um imóvel de padrão
comum pelo triplex. Um ex-diretor da OAS relatou tratativas para equipar as
cozinhas do sítio e do apartamento, pagas pela empreiteira. Há notas fiscais do
negócio. Há vários registros de fotos e vídeos da presença presidencial nos
dois lugares.
As
negativas de Lula sempre foram tíbias. Ele quis transformar as investigações em
perseguição política para desempenhar o papel de vítima e conquistar simpatia.
Diversos atos de Moro e dos procuradores contribuíram para reforçar tal
narrativa. Mas nada disso exime Lula do que fez. Até hoje não houve explicação
convincente para a proximidade dele com os maiores empreiteiros do país. Ao
contrário, sobram provas de que o cartel desmascarado pela Lava-Jato financiava
o projeto de poder de Lula e do PT.
Todas
as questões jurídicas devem ser dirimidas. Lula teve (e deve ter) direito aos
recursos que a generosa legislação brasileira oferece aos réus. Até pode sair
ileso e candidatar-se em 2022. Mas a nódoa do maior esquema de corrupção já
desmascarado no país continuará a manchar sua biografia.
Flexibilizar legislação urbanística seria um erro gravíssimo para o Rio – Opinião / O Globo
Os vereadores cariocas resolveram adotar a tática perniciosa do ministro Ricardo Salles no Meio Ambiente. Enquanto a atenção da sociedade está voltada à pandemia do novo coronavírus — que impôs ao Rio o maior número de mortes por Covid-19 entre todas as capitais brasileiras —, tentam passar suas boiadas, flexibilizando normas urbanísticas em prejuízo do município. Se efetivadas as mudanças, provocarão interferências inaceitáveis na paisagem, no ambiente e na qualidade de vida do Rio, patrimônio cultural da Humanidade.
Tramitam
na Câmara de Vereadores dois Projetos de Lei Complementar (PLCs 136 e 141) que
propõem alterações importantes na legislação urbanística. Embora estejam na
Casa desde 2019, ressurgem com força às vésperas da revisão do Plano Diretor,
prevista para este primeiro semestre. Entre os equívocos da proposta, está a
permissão para construir em áreas de matas e encostas acima do limite em vigor
(cem metros do nível do mar), além da redução nas exigências para licenciar
moradias de interesse popular, abrindo um espaço indesejável ao ímpeto
imobiliário clandestino das milícias.
Qualquer
carioca sabe quão vulneráveis são as encostas da cidade. E como já foram
ocupadas de forma caótica sob olhares permissivos — ou, por que não dizer?, sob
o incentivo, por objetivos político-eleitorais — de sucessivos governos. As
chuvas de verão costumam ser implacáveis com a negligência. Mesmo trechos de
áreas florestais não raramente despencam sob a força das águas — o Parque
Nacional da Tijuca está cheio de exemplos.
Mesmo
que não se entrasse no mérito da questão, não parece razoável que se discutam
mudanças na legislação urbanística do Rio às vésperas de rever o Plano Diretor,
que completou dez anos no dia 1º de fevereiro, sem estudos que avaliem o
impacto das medidas. Melhor seria se debruçar sobre a atual legislação e
perguntar por que as metas traçadas não foram alcançadas. A cidade cresceu onde
não tinha infraestrutura (Barra, Recreio, Jacarepaguá e entorno) e definhou
onde estava pronta (Centro e Zona Norte).
Há
muito o que fazer no Rio antes de criar novos problemas. No Centro, o
esvaziamento em curso há anos foi agravado pela pandemia. Hoje a região é um
deserto de lojas fechadas e escritórios vazios. Nos próximos dias, deve chegar
à Câmara projeto da prefeitura para revitalizar a região. A ideia é permitir
que prédios de escritórios sejam reformados para servir como moradia de classe
média baixa.
É
uma ideia bem-vinda, mas não é o caso das demais. Momentos críticos como o
atual, em que o país amarga prejuízos decorrentes da pandemia e das medidas de
contenção, são propícios para aprovar qualquer coisa. É como se tudo se
justificasse, mesmo os maiores absurdos. Mas um dia a pandemia passará e, além
dos efeitos deletérios evidentes — como aumento da pobreza, perdas na educação
e devastação das finanças públicas —, a sociedade carioca poderá ter de
carregar mais um fardo: a degradação da paisagem, do meio ambiente e da
qualidade vida.
A ficha moral de Lula é suja – Opinião / O Estado de S. Paulo
Seu
retorno à ribalta eleitoral atira o País num turbilhão de incertezas, em meio a
uma pandemia e ao desgoverno de Bolsonaro
A defesa do ex-presidente Lula da Silva tanto fez que conseguiu: depois de anos a invocar questões processuais para questionar as condenações de seu cliente por corrupção, finalmente foi premiada com uma decisão judicial que, na prática, livra o demiurgo de Garanhuns de prestar contas à Justiça e, ademais, lhe restitui os direitos políticos.
Desse
modo, o sr. Lula da Silva pode até subir nos palanques dos grotões miseráveis
onde ainda é rei para pedir votos e, eventualmente, voltar ao poder, mas ainda
assim, para todos os efeitos – morais e políticos –, terá seu nome
indelevelmente vinculado a múltiplos escândalos de corrupção, marca que nenhuma
chicana será capaz de apagar. Lula foi até agora incapaz de explicar não apenas
os mimos generosos que recebeu de empreiteiros delinquentes, objeto de suas
condenações ora contestadas, mas principalmente os monstruosos esquemas de
roubalheira que marcaram o mandarinato lulopetista.
A
decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin que beneficiou o
sr. Lula da Silva, adotada na segunda-feira, não entrou no mérito das
condenações e, portanto, não considerou o chefão petista inocente de nada. O
que o ministro Fachin fez foi entender que Sérgio Moro, então juiz da 13.ª Vara
Federal de Curitiba, não era competente para julgar os casos envolvendo o
ex-presidente, pois em tese esses casos não tinham vínculo direto com o
escândalo da Petrobrás – foco da Operação Lava Jato.
De
fato, era preciso um grande esforço interpretativo para incluir os casos
envolvendo Lula diretamente no organograma do petrolão. Esse, aliás, é um dos
pecados capitais cometidos pela Lava Jato – a pretensão de ser o patíbulo de
todos os políticos e empresários corruptos do Brasil, como se todos os casos
fossem conexos e como se Sérgio Moro fosse o juiz natural de qualquer processo
de corrupção.
Enfatize-se,
de novo, que isso nada tem a ver com a materialidade dos crimes monumentais
cometidos sob as bênçãos de Lula da Silva. Mesmo com a suspeita de que Sérgio
Moro foi parcial ao julgar os casos de Lula, que seria avaliada ontem pela
segunda turma do Supremo, não é possível simplesmente considerar, como num
passe de mágica, que não houve assalto lulopetista à Petrobrás, que não houve
escandalosa promiscuidade no Congresso, que não houve indecente relação de Lula
com empreiteiros.
O
imbróglio, ademais, diz muito sobre o Judiciário, que sai lanhado. Não há
explicação, compreensível para leigos, para o fato de que se tenha levado tanto
tempo para processar, julgar e condenar Lula, mesmo diante de tantas
evidências; para que a defesa do ex-presidente tenha tido tantas possibilidades
de recurso mesmo com condenações em três instâncias; para que o Supremo
decidisse pela enésima vez mudar a jurisprudência sobre prisão após condenação
em segunda instância, o que permitiu a libertação de Lula; e finalmente para
que se tenha decidido somente agora que Curitiba não era o foro correto para os
casos do sr. Lula da Silva, sendo que havia jurisprudência específica sobre o
escopo da Lava Jato desde 2015 – aliás, citada pelo próprio ministro Fachin em
sua intempestiva decisão.
É
como se o juiz resolvesse marcar, no final do segundo tempo, um pênalti
supostamente cometido no primeiro. Há muitas explicações possíveis para esse
casuísmo, e nenhuma delas é bonita.
Que,
em meio a essa barafunda, o eleitor não perca de vista: Lula, que sempre contou
com chicanas e prescrições para voltar a concorrer à Presidência, pode ser
agora formalmente ficha-limpa, mas continua moralmente ficha-suja. Seu retorno
à ribalta eleitoral, nessas condições, atira o País num turbilhão de
incertezas, em meio a uma pandemia mortal e ao desgoverno do extremista Jair
Bolsonaro.
É
o pior dos mundos, situação que interessa somente aos populistas radicais e
irresponsáveis que protagonizam a vida nacional há tantos anos. Mais do que
nunca, quem ainda acredita na democracia e nos valores republicanos precisa se
organizar, e rápido, para convencer os brasileiros de que há alternativa
civilizada ao caos.
Antes tarde do que mais tarde – Opinião / O Estado de S. Paulo
Seja
qual for o motivo, é bom para o País que Bolsonaro se envolva na negociação por
vacinas
O presidente Jair Bolsonaro jamais agiu de moto-próprio para promover a preservação da saúde e do bem-estar da população no curso da pandemia de covid-19, como a Nação já pôde perceber a duras penas. Sempre que se viu obrigado a tomar uma decisão que refletisse algum alívio para o pesado fardo suportado por seus governados, Bolsonaro o fez por cálculo político, seja porque se viu ameaçado por um adversário, seja porque sua flagrante incompetência fez cair seu índice de popularidade, única métrica para a qual dá importância.
Após
desdenhar por sete meses da vacina da Pfizer, chegando a fazer troça de seus
supostos efeitos colaterais, Bolsonaro se reuniu há poucos dias com o CEO da
empresa, Albert Bourla, para tratar da compra de 99 milhões de doses do
imunizante. O encontro se dá no momento em que Bolsonaro se vê premido pela
articulação de um “pacto nacional” de governadores, com apoio da cúpula do
Congresso, a fim de tomar as rédeas da gestão da crise diante do descalabro da
administração federal.
Seja
qual for a razão que o tenha motivado, é bom para o País que o presidente
Bolsonaro, enfim, se mostre engajado na aquisição de vacinas. Antes tarde do
que mais tarde.
É
absolutamente inaceitável ter de conviver com recordes seguidos na média móvel
de mortes diárias. Só a aplicação massiva de vacinas pode deter a escalada
macabra da doença. Além deste objetivo, o principal, não se pode perder de
vista que não haverá sinal de recuperação econômica sem que a população esteja
vacinada em uma escala que já permita frear a disseminação do vírus.
“O
contato de hoje foi excepcional”, disse Bolsonaro, após conversar com Albert
Bourla. “Eles (a Pfizer) entenderam a gravidade (do momento) que o Brasil
atravessa com essa nova cepa, é do interesse deles que (a variante) não saia do
local, né? Então, isso ajudou muito na negociação.” Não importa que o
presidente queira fazer crer que o laboratório teria mais a ganhar vendendo
suas vacinas ao Brasil do que o País em recebê-las. O essencial é que as
vacinas sejam aplicadas nos brasileiros o mais rápido possível.
O
País caminha para terminar o mês com quase 300 mil vidas perdidas para a
covid-19. Pode-se apenas imaginar quantas delas poderiam ter sido salvas caso o
governo federal – e o presidente em particular – agisse como se espera de um
governo minimamente sério quando se vê diante de uma emergência sanitária desta
magnitude.
A
ser cumprido o cronograma divulgado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes,
após a reunião com a Pfizer – e não pelo ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, o
que evidencia seu desgaste –, o Programa Nacional de Imunizações (PNI) poderá
contar com 14 milhões de doses da Pfizer até junho, 30 milhões até setembro e o
restante até o final deste ano. Oxalá a compra se concretize e o cronograma
seja respeitado. O País precisa desesperadamente de todos os imunizantes que
puder conseguir no mercado.
Com
eficácia global de 95%, a vacina da Pfizer é uma das melhores opções. Além de
ser uma das mais eficazes contra o novo coronavírus, é a única vacina que já
foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para uso
definitivo no País. Em contrapartida, o imunizante do laboratório americano
requer armazenamento em baixíssimas temperaturas, o que impõe um desafio
logístico para um país como o Brasil. Mas nada que impeça a sua aplicação nos
habitantes de grandes centros urbanos, onde a proximidade com laboratórios que
possuem os refrigeradores apropriados há de facilitar sua distribuição.
As
forças vivas da Nação devem concentrar suas energias para pôr um fim à tragédia
sanitária e econômica que tanta dor e desespero tem causado aos cidadãos. Há
grandes desafios a serem superados em 2021. E não haverá soluções, tanto para
os problemas econômicos como para as articulações políticas, sem vacinas.
Assédio sexual na Alesp – Opinião / O Estado de S. Paulo
Gravidade
do ato do deputado Fernando Cury impõe a sua cassação
O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) perdeu uma grande oportunidade de mostrar à sociedade paulista que o assédio sexual é uma prática intolerável. Por 5 votos a 4, o colegiado recomendou que o deputado Fernando Cury (Cidadania), acusado de assediar sexualmente sua colega Isa Penna (PSOL), seja suspenso do exercício do mandato por 119 dias. Esse prazo de suspensão sugere muito mais um arranjo corporativista do que uma genuína tentativa do conselho de punir um deputado que, pela gravidade do abuso que praticou, deveria ter seu mandato cassado pelo plenário da Casa.
Em
dezembro, a deputada Isa Penna registrou boletim de ocorrência contra Fernando
Cury por assédio sexual numa sessão plenária da Alesp. O ato foi gravado em
vídeo. Cury se aproximou da colega, que falava à Mesa Diretora, e a abraçou por
trás, tocando em seus seios. O deputado alegou que tudo não passou de “um gesto
de gentileza”, mas a reação de Isa Penna, que prontamente o repeliu, foi
bastante clara para manifestar seu desconforto diante dessa peculiar forma de
Cury demonstrar cortesia.
Que
mensagem o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Alesp passa à sociedade ao
propor uma punição branda, que mais se assemelha a uma licença-prêmio do que a
uma punição, para um gesto reprovável, cometido no plenário da Casa e registrado
em vídeo? “É a legalização do assédio”, disse Isa Penna ao Estado. “Uma
mancha na história da Alesp.” É disso que se tratará, de uma mácula na história
da Casa, se o plenário ratificar a recomendação do Conselho de Ética e Decoro
Parlamentar e não cassar o deputado Fernando Cury. Ora, se um caso claro de
assédio sexual não for punido com máximo rigor, o que será reprovável aos olhos
do Legislativo paulista?
O
prazo de 119 dias de suspensão não foi uma escolha aleatória. Por este período,
não há a necessidade de convocação de suplente. O Regimento Interno da Alesp
permite que os deputados tirem licença médica por até 120 dias sem que o
suplente seja convocado. Não está claro se a regra também é aplicável em caso
de suspensão, algo inédito até o momento. A Mesa Diretora informou que
aguardará parecer da Procuradoria da Alesp.
Ainda
que Cury não receba salário durante os dias de suspensão, não é improvável,
portanto, que toda a sua estrutura de gabinete – que conta com 23 servidores –
seja mantida, além de o deputado continuar com a prerrogativa de manejar cerca
de R$ 4,5 milhões em emendas parlamentares. “Se dependesse da minha única e
exclusiva vontade, teria sido pedida a cassação do mandato (de Fernando
Cury)”, disse ao Estado o deputado Emidio de Souza (PT), relator do
caso no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar. “Tentei construir um
entendimento que gerasse uma punição para que este caso não manchasse a imagem
da Alesp e, principalmente, restituísse à deputada Isa Penna a dignidade que
lhe foi roubada”, disse o relator.
Prevaleceu
o parecer do deputado Wellington Moura (Republicanos), que sugeriu a pena mais
branda. Acompanharam seu voto os deputados Delegado Olim (PP), Alex de
Madureira (PSD), Adalberto Freitas (PSL) e Estevam Galvão (DEM). Já pela
cassação de Fernando Cury votaram os deputados Barros Munhoz (PSB), Maria Lúcia
Amary (PSDB) e Erica Malunguinho (PSOL).
Todos
os dias, as mulheres são vítimas de toda sorte de importunações, preconceitos e
crimes no País. Passa da hora de dar um basta na tolerância que tem contribuído
para perpetuar a indignidade.
Cassar
o mandato de um parlamentar eleito é sempre uma decisão traumática. Há de ter
muito cuidado ao sustar a vontade dos eleitores manifestada nas urnas de forma
livre e espontânea. Mas, exatamente por esta razão, todos os que recebem a
confiança dos eleitores para exercer mandato eletivo devem ter na mais alta
conta um código de conduta que prime pela ética, pela decência e pelo respeito.
Não é o caso do deputado Fernando Cury, definitivamente.
Caos sem vacina – Opinião / Folha de S. Paulo
Economia
não volta sem imunização; Bolsonaro é responsável pela piora da crise
É
estarrecedor descobrir, enquanto o país bate
recordes de mortes diárias causadas pela Covid-19 e faz contas
aflitas para a chegada de vacinas, que o governo de Jair Bolsonaro recusou em
2020 três ofertas de imunizantes da farmacêutica Pfizer, num total
de 70 milhões de doses até o final deste ano.
Conforme
a Folha noticiou, um acerto com a empresa teria permitido que a
vacinação dos brasileiros começasse já em dezembro passado. Até fevereiro,
seriam 3 milhões de doses, o que permitiria números menos ruins hoje.
Até
aqui, somente 8,7 milhões receberam uma primeira dose de imunizante, ou 5,4% da
população adulta. Os que já tiveram acesso à segunda dose limitam-se a 3
milhões (1,8% dos maiores de 18 anos).
Em
tal cenário, qualquer percalço pode constituir uma tragédia em potencial
—atrasos na importação da Índia e o que parece ter sido um acidente na linha de
produção da Fiocruz, por exemplo, deixarão o país sem ao menos 15,2 milhões de
injeções neste março.
Essa
escassez dramática se dá em meio a uma nova e avassaladora onda de contágios da
pandemia, que, além de custar vidas aos milhares, força a volta da paralisação
de atividades Brasil afora —o que trava a economia, com consequências ainda
mais devastadoras para a população mais pobre e dependente do trabalho
presencial.
As
projeções de crescimento do Produto Interno Bruto no ano, já medíocres desde o
início, estão em queda. Hoje estão pouco acima dos 3%, indicando que o país não
reverterá a queda de 4,1% amargada em 2020 —e tendem a piorar se prosseguir a
derrocada na saúde.
O
primeiro trimestre já foi perdido, e o segundo está sob ameaça. A tortuosa
política econômica do governo inspira desconfiança; a retomada depende
fundamentalmente da vacinação.
O
desastre produzido por Bolsonaro e por seu ajudante de ordens Eduardo Pazuello
ainda pode e precisa ser atenuado. Urge importar mais vacinas já e induzir
laboratórios a apresentar os dados para aprovação de seus produtos.
Os
contratos com empresas desprezadas devem ser fechados imediatamente, de modo
que cheguem imunizantes no segundo semestre, quando existe a ameaça real de
novas ondas com novas variantes.
A
acreditar no cronograma do Ministério da Saúde, até o final de maio seria
possível aplicar pelo menos uma dose a cerca de 63,7 milhões de pessoas, cerca
de 40% da população adulta. No entanto tal previsão ainda depende da
confirmação de laboratórios nacionais.
A
esta altura será ingenuidade apostar num surto de compaixão ou responsabilidade
por parte de Bolsonaro. Resta esperar que o maior responsável pela crise trate
de mitigar a tragédia em benefício de sua própria sobrevivência política.
O papa no Iraque – Opinião / Folha de S. Paulo
Em
viagem criticada pelo risco sanitário, Francisco buscou fortalecer diálogo
Após
passar 12 meses encerrado no Vaticano devido à pandemia, o papa Francisco quis
marcar sua volta ao cenário mundial com uma viagem de peso simbólico e
histórico.
Com
o giro de
quatro dias pelo Iraque, concluído na segunda (8), Francisco
tornou-se o primeiro pontífice a visitar o país do Oriente Médio, uma terra
repleta de vestígios da antiguidade bíblica, mas ferida nos últimos anos pelo
sectarismo, pela desastrosa ocupação estrangeira e pela cruenta perseguição a
minorias religiosas.
Seus
dois últimos predecessores haviam tentado a empreitada, mas terminaram
desistindo ante os conflitos no país e as dificuldades de negociação com o
governo local.
Não
obstante sua importância, a viagem mereceu justas críticas em razão do momento
escolhido.
O
Iraque vive um renovado surto de contaminações pelo coronavírus e alguns dos
sermões papais ocorreram em locais abarrotados, onde a ventilação deficiente e
a falta de protocolos eficazes de prevenção tendem a atuar como facilitadores
do contágio.
Para
Francisco, contudo, a imprudência se justificaria pelos objetivos da visita,
definida por ele como um dever em relação a uma terra martirizada por tantos
anos.
Dentre
suas principais missões, o papa buscou oferecer apoio à acuada minoria cristã
da região.
Lar
de algumas das comunidades mais antigas do cristianismo, o Iraque viu a
população cristã cair drasticamente a partir da invasão americana, em 2003, num
movimento exacerbado pela ascensão dos terroristas do Estado Islâmico, em 2014.
Do cerca de 1,5 milhão de fiéis do começo do século restam hoje menos de 250
mil —boa parte se refugiou em países vizinhos.
Em
paralelo, Francisco buscou fortalecer o diálogo entre a Igreja Católica e o
Islã, um dos temas centrais de seu papado, ao se tornar o primeiro pontífice a
encontrar o grande aiatolá Ali Al-Sistani, considerado a principal autoridade
dos muçulmanos xiitas, predominantes no Iraque e no Irã.
Tendo
escolhido para a viagem o lema “Vós sois todos irmãos”, extraído do Evangelho
de Mateus, o papa defendeu uma frente inter-religiosa em prol da fraternidade e
contra o fanatismo e a violência.
Num momento em que cristãos ainda são perseguidos no Oriente Médio e o preconceito contra muçulmanos viceja no Ocidente, trata-se de mensagem necessária.
Nenhum comentário:
Postar um comentário