Na segunda-feira, a expectativa era de que a coalizão de governadores e a intervenção branca do Congresso no Plano Nacional de Imunização poderiam suprimir poderes para a dupla Bolsonaro-Pazuello sabotar o país e dar algum rumo para o Titanic desgovernado no qual estamos enfiados rumando céleres para 3.000 mortes diárias por covid-19. Mas o Supremo Tribunal Federal decidiu que havia coisas mais urgentes para tratar.
Do
nada, o ministro Edson Fachin acordou de um sono de quatro anos em que é o relator
da Lava-Jato na Corte e, alarmado, constatou: a 13ª Vara da Justiça Federal em
Curitiba não era, vejam só, o foro adequado para julgar o ex-presidente Lula.
Foi tudo um lamentável engano, pelo qual ele infelizmente ficou preso, aliás em
Curitiba, por 580 dias. Com o voto do próprio Fachin, esse distraído.
Metade
das 46 páginas da decisão extemporânea do ministro é gasta para ele explicar o
inexplicável: por que agora? E qual a extensão de sua decisão? Ele não diz.
Talvez ainda não saiba.
Diante
do inesperado, o ministro Gilmar Mendes resolveu abrir sua gaveta, espanar o pó
e tirar de lá o HC da defesa de Lula que arguia a suspeição de Moro. O mesmo
que Fachin esperava que fosse parar no triturador de papel diante da sua
decisão.
Não
só não foi como ele ameaça ficar isolado na Segunda Turma, uma vez que até a
ministra Cármen Lúcia dá sinais de que votará com Gilmar, contra Moro.
Por
que Fachin se expõe a tanto desgaste? Qual o cálculo de que anéis poderiam ser
dados e dedos poupados com essa lambança?
E
Gilmar Mendes, que nesta terça-feira repetiu a performance indignada de sempre
contra a Lava-Jato, por que então aguardou mais de um ano com esse HC em seu
gabinete? Se de um dia para outro já tinha um voto tão sólido e volumoso?
Nada para de pé na conduta do STF, em ziguezague há cinco anos na Lava-Jato, ao sabor não do Direito, mas das circunstâncias políticas.
Ou
não foi o mesmo Gilmar que concedeu liminar para sustar a nomeação do mesmo
Lula para a Casa Civil como forma de — vejam só! — escapar da jurisdição do
mesmo Moro, lá em 2016?
Sim,
sua mudança foi sendo gradativa ao longo dos anos, e veio antes da Vaza Jato.
Mas a demora em trazer o caso da suspeição de Moro à Turma evidencia um cálculo
político e colabora para que agora, no momento dramático da pandemia, em que o
país deveria estar focado, com o STF, com tudo, em exigir vacinas do governo
federal, estejamos acompanhando esse BBB de palavrório inalcançável e
personagens pouco carismáticos.
Aproveitando
que estávamos todos brincando de juristas e traçando cenários para o ainda
distante 2022 a partir do advento do Lula livre, Bolsonaro emplacou duas de
suas cheerleaders mais negacionistas, Bia Kicis e Carla Zembelli, em comissões
importantes da Câmara.
A
mesma Câmara que ainda discutia na noite de terça um auxílio emergencial que já
deveria ter voltado a ser pago, pois no mundo real, esse cuja existência o
Supremo preferiu começar a semana sublimando, tem gente morrendo de fome ou de
falta de leito em hospital. Uma situação sinistra à qual chegamos por inépcia
absurda e criminosa dos Poderes.
À
mais alta Corte do país numa democracia cabe assegurar a segurança jurídica e
ter a última palavra para garantir que os demais Poderes não exorbitem suas
atribuições e respeitem a Constituição.
Ao exibir ao país suas entranhas e suas vaidades, seu casuísmo com casos sérios que dizem respeito ao nosso passado e ao nosso futuro, suas Excelências jogam água no moinho dos golpistas que clamam contra o Judiciário e se fragilizam para cobrar do Executivo suas obrigações no enfrentamento da pandemia. Que deveria ser a única preocupação de todas as autoridades, mas não é.
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