Valor Econômico
A promessa do BC é agir de acordo com a sua
função de reação, ou seja, manter a coerência com a forma como agiu no passado
recente
Na reunião do Fundo Monetário Internacional
(FMI), os membros do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central
sussurraram uma mensagem de flexibilidade e cautela, mas os participantes do
mercado financeiro entenderam como um grito para comprar o ciclo de baixa da
taxa Selic.
O mal-entendido foi desfeito, antes do
período de silêncio do Copom, pelo presidente do BC, Gabriel Galípolo, que
disse que o comitê ainda está “tateando” o nível adequado de juro, “no
gerúndio”. Ou seja, a política monetária segue pulsando, e o viés ainda é de
alta.
Depois de amanhã, quando divulga a sua decisão, o Copom estará diante do mesmo problema: dizer que precisa seguir com mais cautela, mas sem transmitir a ideia de que o problema está resolvido.
O mercado financeiro tem o costume de, quando
o Banco Central termina um ciclo, especular quando começam os movimentos de
baixa. É algo natural. Os juros, atualmente em 14,25% ao ano, estão muito
altos, embora não se saiba se o nível é suficiente. Alguma hora terá que
diminuir. Quem descobrir antes qual será o pico da Selic ganha mais dinheiro.
Em outros tempos, o Banco Central dava uma
boa ideia para os participantes do mercado financeiro da trajetória futura da
taxa Selic por meio de suas projeções de inflação. Na situação atual, pelas
projeções do BC, se a Selic subir a 15% ao ano, como previsto pelo mercado no
boletim Focus, a inflação ficará em 3,7% em 2026, acima da meta, definida em
3%.
A conclusão, a partir das projeções, é que o
Banco Central teria que subir o juro acima de 15% ao ano para cumprir a meta de
inflação. Economistas do mercado que fizeram seus cálculos estimam que os juros
tenham que subir bem mais, superando 17% ao ano. Em tese, teria que subir um
pouco mais, porque o Copom avalia que os riscos de a inflação superar 3,7% são
maiores do que os de ficar abaixo disso.
Mas o Copom tem evitado avalizar esses
cálculos. Os seus membros têm argumentado que a taxa Selic, nos níveis atuais,
é muito contracionista e que, ao longo do tempo, vai observar se é suficiente
ou não para cumprir a meta.
Essa dubiedade dificulta a coordenação das
expectativas do mercado sobre como a Selic vai ser fixada no futuro. Uma
parcela dos analistas do mercado financeiro acredita que o Copom vai alongar o
prazo do cumprimento da meta de inflação para reduzir o sacrifício em termos de
atividade.
Outros acham que o BC é incapaz de promover a
restrição necessária para baixar a inflação, seja porque o mundo político
concede um mandato restrito para buscar a meta, ou seja porque, diante da
situação fiscal, apertos monetários draconianos seriam improdutivos para baixar
a inflação.
O desafio do Copom nesta reunião é mostrar
que nada disso é verdade. A tarefa é mais complicada num período em que o BC
começa a desacelerar o ciclo de aperto. Em janeiro, quando o ritmo de aperto
era forte, com altas de 1 ponto percentual, já era difícil: os participantes do
mercado, num primeiro momento, entenderam que o comitê seria mais suave
simplesmente porque decidiu deixar em aberto o que faria duas reuniões adiante.
Um traço comum em todas as apresentações
feitas por membros do Copom nas últimas semanas foi procurar mostrar que o
ciclo de aperto monetário está se transmitindo pela economia - e, portanto,
eram infundados os receios de que pudéssemos estar sofrendo de algum tipo de
dominância fiscal.
O diretor de Política Econômica do BC, Diogo
Guillen, apresentou em um evento da XP Investimentos um gráfico que procura
provar que o Copom, sob o comando de Galípolo, executa a mesma política
monetária de seu antecessor, Roberto Campos Neto, de acordo com uma regra de
Taylor - que mostra como o a autoridade monetária deve reagir a desvios de
inflação e dos níveis de emprego.
Uma forma de garantir credibilidade seria
amarrar os passos futuros com um forward guidance, como fez em dezembro, para
as reuniões seguintes; ou como fez para o encontro desta semana, para quando
prometeu uma subida da taxa Selic menor do que 1 ponto percentual.
Mas, a julgar pela comunicação recente, não é
o que o Copom pretende fazer. Seus integrantes pregaram a necessidade de
flexibilidade, diante de basicamente três grupos de incerteza: como a alta
rápida e forte da Selic vai se transmitir pela economia; qual será a reação da
política fiscal à desaceleração da economia; e qual vai ser o efeito na
inflação no Brasil do tarifaço de Trump.
A promessa do BC é agir de acordo com a sua
função de reação, ou seja, manter a coerência com a forma como agiu no passado
recente. O Copom ganhou alguns pontos depois do choque de juros, que nesta
semana vai colocar os juros no seu maior percentual desde 2006, quando o
economista Afonso Bevilaqua comandava com mão de ferro a política monetária.
Mas a reputação se constrói no dia a dia.
Galípolo, na semana passada, deu um puxão nas expectativas de mercado, que
convergiram para uma alta de apenas 0,25 ponto na reunião desta semana. Se o
juro subisse apenas 0,25 ponto, pareceria que o Copom está tateando o fim do
ciclo, não o nível suficientemente contracionista.
Agora, o mercado financeiro precifica, nas
opções de Copom negociadas na B3,
um terço de chances de uma alta de 0,25 ponto percentual na taxa Selic na
reunião desta semana e uma chance de dois terços de uma alta de 0,5 ponto
percentual.
Para a reunião de junho, se o desejo é ter
mais flexibilidade, o caminho provável será não indicar nada e deixar a decisão
dependente dos dados.
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