• Enquanto não forem erradicadas velhas práticas patrimonialistas de aparelhamento das empresas estatais pelos políticos, a pilhagem corre o risco de continuar, sob formas ainda mais criativas
- O Estado de S. Paulo
Com um atraso de seis meses, a Petrobrás divulgará nesta quarta-feira, 22, seu balanço do 3.º trimestre de 2014. Também serão conhecidas as contas do 4.º trimestre. Virão devidamente auditadas.
Em novembro, a PricewaterhouseCoopers recusou-se a auditar o balanço do 3.º trimestre porque a Operação Lava Jato havia confirmado a prática de corrupção que elevou artificialmente os valores de um grande número de ativos da empresa. Ou seja, recusou-se a atestar a exatidão da contabilidade enquanto esses sobrepreços não fossem corrigidos, o que implicaria vultosas baixas contábeis.
Nesta quarta-feira, deverá ficar claro o critério adotado para a reavaliação. Sabe-se apenas que foi aprovado tanto pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) como pela Security Exchange Commission (SEC), o organismo que fiscaliza a lisura do mercado de ações nos Estados Unidos, onde as ADRs da Petrobrás também são negociadas.
A diretoria proveniente do Banco do Brasil, o presidente Aldemir Bendine e o diretor financeiro Ivan Monteiro, pretende dar ao evento tratamento de encerramento da temporada desastrosa das administrações passadas da Petrobrás.
Pode não ser tudo isso, mas o estrago foi tão grande e a estatal chegou tão perto do precipício, que a simples publicação do balanço auditado tem força para ser percebida, aqui e no exterior, como o início do retorno do fundo do poço. O governo Dilma pretende aproveitar o evento para passar a mensagem de que também seu governo começa a ser passado a limpo. Segunda-feira, foi esse o recado transmitido pelo ministro Joaquim Levy, em Washington, em seus encontros com investidores estrangeiros.
O processo predatório de que foi vítima a Petrobrás não foi só consequência da “ação de inimigos”, como quer fazer crer o governo Dilma. A própria estrutura de governança destituída de sistemas de alçada, que dificulta controles, tornou-a vulnerável a desregramentos. Não parece que apenas uma diretoria de Compliance, que fiscalize regras e procedimentos, e uma nova composição do Conselho de Administração sejam suficientes para evitar novos desmandos.
A Petrobrás precisa de uma reforma administrativa em profundidade. Mas enquanto não forem erradicadas velhas práticas patrimonialistas de aparelhamento das empresas estatais pelos políticos, a pilhagem corre o risco de continuar, sob formas ainda mais criativas.
A diretoria já avisou que o saneamento da petroleira exige um plano de re-equacionamento do seu endividamento que já deve ter saltado para R$ 360 bilhões em consequência de novos levantamentos de recursos e, também, da alta do dólar no câmbio interno, já que cerca de 70% desse passivo está denominado em moeda estrangeira. Todo o Plano de Negócios terá de ser revisto e seu programa de desinvestimento, intensificado.
A Petrobrás sucumbiu a políticas desastradas, que não podem se repetir. O represamento dos preços dos combustíveis desde a primeira administração Lula foi só uma delas. O marco regulatório do petróleo requer revisão. A empresa vem sendo sufocada, não está dando conta de ser a única operadora do pré-sal nem de participar em pelo menos 30% dos investimentos de cada projeto. O novo nível dos preços do petróleo exige mais racionalidade na exploração das reservas brasileiras.
Falta saber se o governo também pensa assim.
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