• Elite política esquece que problemas e riscos econômicos de 2016 já estão aqui para serem enfrentados
- Folha de S. Paulo
A gente está mais enfurnada do que de costume nos problemas domésticos do Brasil, absorta nas minúcias do cotidiano das crises. Viver da mão para a boca não vai prestar, nunca presta, ainda menos se a gente considera uma lista breve de problemas à espreita na próxima esquina (um, dois anos, é uma piscada).
Conviria pensar no seguinte:
1) O ajuste fiscal em 2015 está difícil? O de 2016 é um problema quase do mesmo tamanho;
2) A chuva boa afastou o risco de racionamento de energia até, pelo menos, novembro. Não deve haver racionamento caso continue a chover "na média histórica" e o país continue a usar ao máximo as fontes de energia mais caras e poluentes. E 2016?
3) A alta dos juros nos EUA parece o lobo da história infantil, um alarme falso frequente sobre um risco incerto. Mas algum tumulto virá daí. No mínimo, será marco importante da mudança do jeitão da economia mundial;
4) Os traços gerais do novo jeitão da economia mundial vêm sendo descritos faz uns cinco anos. Assim lenta, a mudança parece não fazer grande diferença para o Brasil. É ilusão de ótica.
Reduzir o buraco das contas do governo de modo emergencial tem sido um problemão. Deve ser feito o mínimo necessário para o país não arrebentar, a muito custo e a machadadas (cortes brutais em investimentos do governo), não há alternativa agora. Em 2016, o problema continua: o superavit teria de aumentar, mas é improvável que a receita de impostos aumente a contento, e ainda haverá "restos a pagar" de Dilma 1. Será outra guerra, se não se cuidar do assunto com antecedência. Não se trata aqui nem de "reforma estrutural dos gastos", mas de evitar recaída na crise grave. Para fazer um serviço mais limpo, será preciso haver plano novo.
Energia cara, chuva na "média histórica" e economia estagnada devem nos livrar do racionamento de eletricidade também em 2016 (pelo ora previsto, o crescimento da economia deve só repor o prejuízo de 2015). Dilma 2 apenas desmontou o sistema ruinoso de Dilma 1. Mas não há plano de reforma ou de contenção planejada de consumo.
Suponha-se que a alta dos juros americanos seja muito gradual e não cause estragos súbitos no mundo e no Brasil. Muita gente entendida e poderosa acha isso improvável. Muitos dos otimistas acham que, por ser tão gradual, não haverá tanto dano assim. Mas uma alta tão gradual dos juros deve significar que a economia mundial estará andando muito devagar ainda. O Brasil precisa acelerar seus consertos para lidar com isso.
O novo jeitão da economia global terá juros americanos em alta depois de nove anos (crédito mundial mais escasso), crescimento chinês declinando para metade do que foi nos anos 2000-10, preços em baixa de exportações importantes do Brasil, perda ao menos momentânea da graça do pré-sal, novos concorrentes para nossa indústria isolada e envelhecida (vizinhos da China e mesmo México) e os imprevistos de sempre (haveria agora uma arrancada indiana? Um novo crash? Novidades que ninguém estaria enxergando?).
Em tese, nenhuma notícia boa para o Brasil, ainda mais este Brasil avariado. Mas dá para encarar, se não ficarmos concentrados apenas no nosso umbigo sujo.
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