Corte atinge área social
• PAC perde r$ 25 bi; Minha Casa Minha Vida tem redução de quase r$ 7 bi
Cristiane Bonfanti e Cristiane Jungblut – O Globo
BRASÍLIA - Para ajustar o Orçamento de 2015 à queda das receitas e assegurar o cumprimento da meta de superávit primário (economia para o pagamento dos juros da dívida), o governo anunciou ontem um corte de R$ 69,9 bilhões nas despesas de custeio e investimentos, o maior desde que a Lei de Responsabilidade Fiscal entrou em vigor, em 2000. O contingenciamento afetou fortemente a área social e duas das principais vitrines do governo da presidente Dilma Rousseff. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) teve redução de R$ 25,7 bilhões, 39 % do previsto no orçamento, e o programa Minha Casa Minha Vida teve cortes de R$ 6,9 bilhões, 34,6% da verba aprovada de R$ 19,9 bilhões. Juntas, as pastas da Saúde e Educação tiveram um corte de R$ 21,19 bilhões. Na Educação, foco anunciado do segundo mandato, com o lema "Brasil, pátria educadora", o corte chegou a R$ 9,4 bilhões.
Individualmente, o Ministério das Cidades foi o mais atingido pelos cortes (em termos nominais), com uma redução de R$ 17,23 bilhões nas despesas, 54,2% dos gastos de custeio e investimentos previstos no orçamento aprovado pelo Congresso. O carro-chefe da pasta é o programa Minha Casa Minha Vida. Em seguida, destacam-se os ministérios da Saúde, com cortes de R$ 11,77 bilhões, e da Educação. O Ministério dos Transportes, responsável por grande parte das obras do PAC, como as rodovias, teve um corte de R$ 5,73 bilhões em seu orçamento.
O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, que anunciou o contingenciamento, observou que esse foi o maior corte realizado no Brasil nos últimos anos e defendeu o contingenciamento como o primeiro passo para a recuperação do crescimento do país de forma sustentável. Na avaliação bimestral divulgada ontem, o governo passou a projetar uma queda de 1,2 ponto percentual no Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país) este ano, contra uma estimativa anterior de retração de 0,9% do PIB.
Ajuste cai para R$ 5 bi
Do lado da receita, o ministro destacou que há iniciativas de recuperação da arrecadação, como a elevação da Cide-Combustíveis e da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) paga por bancos. Barbosa destacou que o ministro Joaquim Levy (Fazenda) está trabalhando, no Congresso, para aprovar o projeto de lei que reduz o benefício fiscal da desoneração da folha de pagamentos. E afirmou que, se as medidas de ajuste fiscal propostas pelo governo não forem aprovadas no Legislativo, isso será incorporado à programação orçamentária.
- Se alguma coisa não for aprovada como foi proposta, isso será incorporado à programação orçamentária e será compensado por outras medidas. A meta de superávit primário continua adequada à realidade da economia - afirmou, completando:
- O caminho que o governo vai adotar (se as medidas não forem aprovadas) são os ajustes que mandam a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), reavaliando sua programação orçamentária para o cumprimento da meta - acrescentou.
Com as alterações realizadas no Congresso, o ministro admitiu que a economia com as medidas provisórias 664 e 665 (que restringem o acesso a benefícios previdenciários e trabalhistas) será de R$ 5 bilhões em 2015, em relação à proposta de orçamento encaminhada ao Congresso. Destacou, entretanto, que o governo já previu na proposta uma economia equivalente a R$ 10 bilhões com as medidas, o que na conta final resultaria em um ajuste de R$ 15 bilhões. Ainda assim abaixo dos R$ 18 bilhões de economia anunciados na edição das MPs.
Nelson Barbosa afirmou que a manutenção de um montante de R$ 40 bilhões para o PAC representa um "volume expressivo de recursos", que permitirá executar as obras de 1,6 milhão de casas e lançar a terceira fase do Minha Casa Minha Vida no segundo semestre. Segundo o ministro, estão garantidos os projetos que estão com mais de 70% de sua execução concluída. Os demais terão o seu ritmo de andamento readequado de acordo com a nova programação orçamentária.
- O investimento está sendo priorizado no que é possível, como também estão sendo priorizadas verbas de custeio, principalmente em saúde e educação - disse Barbosa.
Diante da necessidade de cortar investimentos, o governo vai priorizar obras como a ferrovia Norte-Sul, cujas obras estariam em fase final de execução. No caso de projetos novos, o governo só vai executar o que considera prioritário. Nesta categoria estão os investimentos em banda larga e na construção do satélite que viabilizará esse serviço e a terceira etapa do programa Minha Casa, Minha Vida.
Esforço para elevar superávit
O governo manteve em 8,26% a projeção para a inflação oficial de 2015 medida pelo IPCA - acima do teto da meta, de 6,5% ao ano. A projeção para o déficit da Previdência passou de R$ 43,57 bilhões para R$ 72,79 bilhões.
- É um grande esforço fiscal. É o maior contingenciamento nos últimos anos. É um indicador de que o governo está realmente cortando despesas. Esse valor é o necessário para a manutenção do equilíbrio fiscal - disse Barbosa.
O ministro destacou que o corte representa uma redução de 35% nas despesas não obrigatórias, ou 0,5% do PIB. Com a medida, o governo quer garantir o cumprimento da meta de superávit primário - a economia para o pagamento de juros da dívida pública - do setor público, de R$ 66,3 bilhões ou 1,13% do PIB. Barbosa ressaltou que o governo pretende elevar gradualmente o esforço fiscal.
- Estamos fazendo um esforço gradual de elevação do primário, de um déficit de 0,6% do PIB no ano passado para um superávit de 2% do PIB em 2016 - disse.
O ministro do Planejamento acrescentou que o corte já leva em conta as mudanças feitas na Câmara nas Medidas Provisórias 664 e 665, que são pilares do ajuste fiscal.
Ele disse ainda que, no caso do abono salarial, está se discutindo com o Senado o veto apenas do trecho que obriga um prazo de três meses para o trabalhador ter acesso ao benefício. O prazo de carência voltaria a ser de apenas 30 dias. Essa posição pode levar a mais problemas para o governo na votação da próxima terça-feira da MP 665, que trata justamente do seguro-desemprego e do abono salarial. Isso porque os senadores, em especial do PT, querem o veto de todo o artigo que trata do assunto e o retorno da regra que garante o pagamento de um salário mínimo de abono em qualquer circunstância.
Mas, segundo Barbosa, seria mantido o trecho que prevê o pagamento proporcional ao tempo trabalhado. Neste caso, o trabalhador só ganharia um salário mínimo inteiro se trabalhasse 12 meses. Mas o que os senadores querem é o retorno à regra antiga, pela qual o trabalhador ganhava um salário mínimo mesmo se tivesse trabalhado por apenas 30 dias.
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