• Apesar de discurso mais incisivo da oposição após protestos de domingo, a crise política prossegue em compasso de espera
Motivada pela veemência das manifestações de domingo (16), a cúpula do PSDB procura unificar sua estratégia com relação à crise vivida pelo governo federal.
Não foi outro o sentido das declarações do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na segunda-feira (17). O líder tucano mencionou a necessidade de um "gesto de grandeza" por parte de Dilma Rousseff.
Embora mais incisiva do que em ocasiões anteriores, a atitude de FHC ainda se tinge de uma prudência que seu impacto inicial não fez supor. Qual seria, exatamente, o gesto que se cobra da petista?
A renúncia, diz Fernando Henrique. Mas também –e nessa hipótese seu discurso se atenua– "a voz franca de que errou". É vasta a latitude que separa as alternativas.
Verdade que, em política, o significado literal de uma frase vale menos do que o seu contexto e o modo com que é recebida.
Nada indica, obviamente, que Dilma esteja disposta a consentir com sugestões desse tipo. Ocorre que uma renúncia, ao contrário do afirmado, raramente constitui gesto unilateral ou voluntário; deriva antes de pressões insuportáveis e da absoluta falta de opções.
Nesse sentido, o tema da renúncia pouco difere do próprio impeachment. Também neste caso é a concentração extrema de circunstâncias desfavoráveis, mais do que um ponto jurídico específico, que conduz todo o processo.
É vago e amplo o rol dos possíveis crimes de responsabilidade de um governante, a partir dos quais caberia aventar seu afastamento.
A gama de motivos vai de atentar contra a existência da União ou a segurança interna do país até proceder de modo incompatível com a honra e o decoro do cargo –e cabe ao Congresso, convertido em tribunal de julgamento, dizer o que se enquadra nas definições legais.
Nem por isso, naturalmente, poderia prevalecer um vale-tudo. Exigindo que um número bastante elevado de congressistas esteja de acordo quanto à culpa presidencial (342 entre 513 deputados e 54 entre 81 senadores, ou dois terços de cada Casa), a Constituição torna o impeachment uma eventualidade no mais das vezes remota.
Ainda mais incerto na atual conjuntura, acrescente-se, seria o "day after" desse desenlace. O ex-presidente Fernando Collor não tinha partido ou adeptos para reagir. De resto, quantos manifestantes anticorrupção estariam dispostos a dar um voto de confiança ao PMDB?
Dadas as extremas dificuldades econômicas e sociais dos próximos anos, pode-se até imaginar uma situação em que, sem poder real, Dilma Rousseff permaneça como para-raios da impopularidade que qualquer governo teria de enfrentar.
A despeito de sua ênfase renovada, portanto, o discurso oposicionista ainda está à procura de rumos. Ao sabor das circunstâncias econômicas e das investigações criminais, o quadro se altera a cada dia, impondo prudência, e não cegueira sectária, aos personagens do processo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário