Se falta algo para a tempestade perfeita, deve ser muito pouco, e ninguém deveria reclamar da imperfeição. A economia encolheu mais 1,9% no segundo trimestre, a inflação está próxima de 10% ao ano, o governo é incapaz até de pagar os juros da dívida pública e, além do mais, o Banco Central tem de manter o crédito arrochado, na tentativa de conter os preços. O resto do mundo avança, apesar de alguma turbulência financeira. De abril a junho os Estados Unidos cresceram em ritmo equivalente a 3,7% ao ano, enquanto a Europa continuou em recuperação. A China, apesar de alguns solavancos, ainda prospera e pode crescer no mínimo uns 6%, mas importando menor volume de matérias-primas. Isso dói, mas a crise brasileira é essencialmente made in Brazil – produto de erros acumulados em mais de quatro anos e de muita irresponsabilidade governamental, demonstrada no desastre das contas públicas.
Não por acaso, a acentuada piora dessas contas coincidiu com o agravamento da recessão. Já em péssimo estado em 2014, a economia continuou piorando. No primeiro semestre, o Produto Interno Bruto (PIB) foi 2,1% menor que de janeiro a junho do ano passado. Com menor atividade e maior desemprego, a receita de impostos e contribuições diminuiu em todos os níveis de governo. O déficit nominal – incluída a conta de juros – chegou a R$ 282,42 bilhões de janeiro a julho e a R$ 502,76 bilhões em 12 meses, soma correspondente a 8,81% do PIB, proporção desastrosa pelos padrões internacionais.
Com as contas públicas em frangalhos (ver abaixo o editorial Números do desastre fiscal), o governo tem pouquíssimo ou nenhum espaço para afrouxar a política fiscal e estimular a economia por meio do gasto público ou de cortes de impostos. Se a presidente Dilma Rousseff aceitar as pressões de empresários e relaxar o controle das contas, o País perderá acesso ao mercado financeiro, o conserto do orçamento será mais complicado e a crise se estenderá. Se, além disso, o Banco Central afrouxar os juros e soltar o crédito, a contenção de preços será prejudicada e a estagflação – mistura de recessão com espiral inflacionária – será prolongada, impondo mais sacrifícios aos brasileiros.
Se nada ficar muito pior, a perspectiva do próximo ano ainda será de atividade muito baixa ou mesmo de recessão, como já preveem muitos economistas do setor privado. O País perdeu potencial de crescimento nos últimos anos e a reação será muito difícil.
O investimento produtivo – dinheiro aplicado em máquinas, equipamentos, instalações e infraestrutura – voltou a diminuir e ficou em 17,8% do PIB no segundo trimestre. Um ano antes a taxa era de 19,5%. No mesmo trimestre de 2013, de 20,7%. Qualquer dessas taxas é muito inferior à necessária para garantir crescimento sustentável na faixa de 4% a 5% ao ano. Em muitos emergentes o investimento fixo tem ficado entre 24% e 30% do PIB. Em alguns, tem sido maior.
Continuaram em queda neste ano a produção e a importação de máquinas e equipamentos. Os empresários, inseguros e sem perspectiva, abandonam quaisquer planos de ampliação e de modernização da capacidade produtiva.
Em situações como essa, cabe ao governo tomar a dianteira dos investimentos. Mas nem o Tesouro tem dinheiro para obras nem o governo consegue capitais privados para um grande programa de infraestrutura. Mais competência nessa área será fundamental para destravar a economia. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) está emperrado há anos, mas o governo se dedica muito mais à propaganda que ao planejamento e à gestão de projetos.
Se ainda houver dúvida quanto à falência do chamado modelo implantado pelo PT, uma espiada na contração do consumo e da oferta de serviços bastará para deixar tudo claro. Para os mais atentos, o fiasco desse modelo é evidente há anos. Agora é preciso redefinir a estratégia de crescimento e, ao mesmo tempo, consertar os destroçados fundamentos da economia. Mas quem definirá esses pontos, num governo acuado politicamente e sem liderança?
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