O Federal Reserve americano resolveu mais uma vez dar tempo ao tempo para elevar a taxa de juros. Com divergências crescentes em seu Comitê de Mercado Aberto - 3 em 10 membros queriam uma alta já - e chocando-se ao longo do ano com as expectativas dos mercados financeiros, muito mais céticos a respeito da evolução futura dos juros, o BC americano sinalizou com um pouco mais de convicção que os indícios de que um aperto monetário seria recomendável se fortaleceram. Das duas últimas reuniões do banco no ano, o ajuste das taxas deve ocorrer, se ocorrer, em dezembro, de acordo com as apostas dos investidores.
Em dezembro de 2015, quando subiu os juros pela primeira vez desde 2006, os membros do Fed previam 4 elevações em 2016 - terminarão, se tanto, com uma. A cautela tem vários motivos e o panorama econômico ainda está longe de ser claro. Na parte mais assertiva, o Fed não parece ter dúvidas de que a economia ganhou maior tração no início do segundo semestre, depois de dois trimestres fracos. Ao mesmo tempo, porém, rebaixou novamente a expectativa de avanço do PIB, desta vez de 2% para 1,8% - ritmo que passou ser a média das expectativas do Fomc também para o crescimento de longo prazo.
Essa é a primeira barreira a deter a urgência de uma alta do fed funds, ou até mesmo sua necessidade. A presidente do Fed, Janet Yellen, matizou esse quadro ao enfatizar que o nível de emprego atingiu o que seria de se esperar no longo prazo, mas é possível aguardar ainda novos progressos no mercado de trabalho sem atiçar temores inflacionários. Primeiro, porque os salários não estão tendo expansão significativa - ao contrário, o que é notável é a baixa pressão de alta. Depois, porque outras medidas do pulso do mercado, como o trabalho parcial ou temporário não tiveram redução importante, como seria de se esperar com a economia perto do pleno emprego.
A segunda barreira é que a recuperação econômica após a grande crise financeira é anormal - lenta e muito menos vigorosa do que nas crises passadas. Não só os EUA têm agora um menor produto potencial, como também a taxa de juros neutra desabou e, segundo algumas estimativas, aproximou-se do zero. Esse fato obriga o Fed a realizar algumas manobras táticas. Yellen, em sua apresentação ontem, disse que com a taxa de juros "modestamente" abaixo da taxa neutra, a situação da política monetária poderia ser qualificada de "moderadamente acomodatícia". "Há assim", concluiu " um pequeno risco de ficarmos atrás da curva no futuro próximo".
Esse argumento, que justifica doses extras de cautela na política monetária, foi somado a outro por Yellen, igualmente na mesma direção. Fazendo coro com Lael Brainard, do board do Fed, que não defende alta de juros no curto prazo, Yellen apontou que a maior ameaça para a política do Fed não está ainda na elevação rápida da inflação, mas no seu contrário. "Poderemos responder mais efetivamente a fortes pressões inflacionárias inesperadas no futuro elevando os juros do que reduzindo juros no caso de enfraquecimento do mercado de trabalho e inflação em queda".
O Fed, assim, dá menos ênfase ao risco de ficar atrás da curva e ter de correr para subir os juros, como já pareceu dar em reuniões anteriores, do que ao risco de elevar os juros na hora errada, frear uma recuperação já problemática e ainda ter de voltar atrás em suas decisões depois, reduzindo as taxas. Ou seja, o BC americano pode esperar ainda um bom tempo, sendo que o despertar da inflação, encontraria um arsenal de combate testado e conhecido, enquanto que surpresas desagradáveis, como a queda da inflação e a perda de vigor da economia, o obrigaria a usar instrumentos não testados nos EUA, como os juros negativos nos quais embarcaram a zona do euro e o Japão.
Os investidores, de todo modo, não estão vendo a inflação logo na esquina e o Fed está preparado para subir os juros, se mais sinais convincentes vierem do lado da inflação. Ao qualificar o balanço de riscos como "equilibrado", o Fed usou o linguajar de quando no passado aumentou a taxa de juros. De qualquer forma, se isso ocorrer, a intensidade e a rapidez do ciclo de aperto serão modestos. Para 2017 estão previstas duas altas, não mais três. A projeção média é de que a taxa chegue a 1,1% no fim de 2017, 1,9% em 2018 e 2,6% no fim de 2019. O juro de longo prazo foi reduzido de 3% para 2,9% - chegou a ser de 4,5% antes da crise de 2008.
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