- Valor Econômico
Líder perdeu o trono mas ainda não é um leão desdentado
O Palácio do Planalto duvida que Renan Calheiros seja capaz de nomear o senador Roberto Requião como relator da reforma da Previdência, quando a proposta chegar ao Senado. Primeiro por considerar que o líder do PMDB cria dificuldade para negociar facilidades. Segundo, porque Renan já não exibe o poder de antigamente. Líder da bancada de 22 senadores do PMDB, é certo que não será seguido se tentar levar o partido para a oposição. O senador joga, na realidade, seu futuro eleitoral em Alagoas, em 2018, a esta altura pouco promissor.
Lula e o PT adoraram, em termos, a notícia de que o líder do PMDB no Senado ameaça desembarcar do governo e se reaproximar do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de quem, na prática, nunca esteve distante. Em termos, porque Lula já tem processos demais para ficar se preocupando com a situação dos outros na Justiça. Já o PT entende que Renan apenas procura pressionar o presidente Michel Temer, mas não acha ruim ver o governo às voltas com o fogo amigo.
Renan está há anos com Lula e não ficará constrangido, se tiver que voltar a apoiá-lo, principalmente se o candidato do PMDB não tiver chances de vitória, como já aconteceu em várias outras eleições. Desde que deixou de ter candidato próprio, desde 1998, o PMDB sempre tem um pé em cada canoa. O problema do senador é agora, quando precisa assentar as bases de sua reeleição em 2018, a fim de manter o foro privilegiado. Desgastado por uma dezena de ações na Justiça, a maioria para apurar seu envolvimento na Lava-Jato, Renan passa por um singular momento de fragilidade eleitoral.
Segundo pesquisas disponíveis, Renan é rejeitado, atualmente, por bem mais que a metade do eleitorado das Alagoas. A concorrência para o Senado também aumentou, com o surgimento de outros nomes viáveis. Em uma palavra, a situação de Renan é desesperadora, porque só um novo mandato de senador pode assegurar a ele a manutenção do chamado foro especial.
Se desistisse do Senado e concorresse a deputado federal, Renan Calheiros certamente seria eleito com facilidade, a exemplo do que aconteceu com outros senadores com problemas que preferiram voltar à cena pela Câmara dos Deputados a enfrentar uma disputa majoritária, casos de Jader Barbalho (PMDB-PA) e José Roberto Arruda, à época do PFL do Distrito Federal. Mas para isso teria de pagar um preço muito alto: a desistência de seu filho Renan à reeleição para governador.
De acordo com a legislação, parente em até segundo grau de chefe do Poder Executivo pode concorrer à reeleição ao cargo que já ocupa, mas não pode disputar novo cargo. A ideia é que quem já exerce mandato eletivo não pode ser prejudicado pelo fato de seu familiar ser chefe do Poder Executivo. Ou seja, Renan só pode concorrer ao Senado, disputa em que suas chances seriam mínimas, se a eleição fosse realizada hoje.
Renan não tem outra alternativa: ou consegue a reeleição para o Senado ou fica sujeito aos humores da primeira instância do Judiciário. Lula, se for candidato, provavelmente será um cabo eleitoral mais eficiente que Temer em qualquer Estado nordestino. Mas Temer tem a máquina do governo na mão. No jogo de hoje, importa saber se os outros 21 senadores do PMDB estão dispostos a largar agora o barco do governo.
O abaixo assinado contra o projeto da terceirização, assinado por oito senadores do PMDB, mostra que Renan ainda pode muito mas já não pode tanto - 8 em 22 são um sinal de debilidade. Em outras épocas, a maioria teria acompanhado o líder. O novo presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), se manifesta cada vez mais independente. Não há briga Renan-Eunício, mas às vezes Eunício vê na dupla Renan - Gleisi Hofmann (PT-PR) uma verdadeira dor de cabeça.
Ninguém no Congresso ou no Palácio do Planalto subestima Renan. É um sobrevivente. Não faz nada sem muito cálculo político. Mira um alvo e acerta no outro, não por erro, mas porque este sempre foi seu objetivo. Aumenta o seu poder de fogo a excessiva necessidade de Temer de ter uma maioria constitucional para aprovar a reforma.
Não é à toa que Renan faz barulho justamente em torno da reforma previdenciária, cuja aprovação já seria naturalmente complicada sem um líder importante da base aliada criando dificuldades. E que ficou ainda mais difícil depois que a Justiça mandou suspender a veiculação, no rádio e televisão, da campanha publicitária do governo para explicar e justificar a necessidade de reformar o sistema previdenciário. O Planalto sentiu o golpe.
Os cenários mais realistas sobre a votação da reforma da Previdência na Câmara apontam para uma vitória apertada do governo, nada parecido com os resultados exuberantes exibidos ano passado, como os 366 votos que aprovaram a PEC do teto de gastos públicos. O Planalto tem algo em torno de 320 "trabalháveis", aqueles na maioria das vezes governistas. Precisa de 308 para aprovar a reforma. A margem de manobra é pequena, e mais do que nunca vai requerer que a coordenação política do governo identifique com precisão os interesses em jogo.
Aprovada na Câmara, a reforma vai para o Senado, o território de caça de Renan Calheiros. Ele talvez já não seja o rei da selva, mas não é ainda um leão desdentado. No impeachment de Dilma, depois de muita confusão, Temer e Renan se entenderam. Mas daquela vez o líder do PMDB, então presidente do Senado, tinha contra ele a rua. Hoje a rua pode ficar contra Temer.
Lula lá
Depois de autorizar as negociações em torno de seu nome para presidir o partido, Lula voltou atrás alegando razões de ordem pessoal e familiar. O enrosco em torno da sucessão de Rui Falcão continua o mesmo. Embora o mandato oferecido a Lula fosse sob medida, o ex-presidente alegou também que queria se concentrar "na campanha". Falcão é um dos maiores entusiastas da candidatura: "Era uma aspiração nacional, agora é um desejo nacional", diz.
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