Julgamento sobre a Lei de Drogas pode, enfim, estabelecer parâmetros para diferenciar usuário de traficante, mas pedido de vista impede conclusão do caso
A intervenção federal no Rio de Janeiro e a criação do Ministério da Segurança Pública indicam a gravidade da crise em que se encontra o país no enfrentamento do crime. O descontrole da situação no Rio, acelerado pela crise fiscal fluminense, levou à intervenção, enquanto o avanço do crime organizado em várias regiões demonstrou a necessidade de haver uma efetiva integração entre União, estados e municípios para enfrentar o banditismo, da qual o ministério é importante peça.
Mas não basta. O Legislativo precisa atuar na revisão de leis, como vem fazendo. Também o Judiciário tem contribuição a dar. Via Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por exemplo, subsídios podem ser apresentados ao Congresso, e mesmo o Conselho tem condições de definir mecanismos administrativos para melhorar o funcionamento das Varas de Execução Penal, outro exemplo.
No Supremo, por sua vez, o ministro Alexandre de Moraes deveria apresentar seu voto em um processo-chave que herdou do antecessor, Teori Zavascki, morto em acidente aéreo. Teori havia pedido vista, trancando a tramitação do caso, e assim continua com seu substituto.
A importância do processo é que ele torna, enfim, aplicável, o conceito da Lei de Drogas, de 2006, que não pune criminalmente o usuário. Mas, por não estabelecer qualquer parâmetro objetivo que diferencie traficante de consumidor, a pessoa presa, assim como o juiz, fica na dependência da palavra do policial que fez a detenção.
Esta séria falha na legislação pode ser corrigida com a conclusão deste julgamento, caso seja aceita a proposta do voto do ministro Luís Roberto Barroso de fixar o parâmetro de 25 gramas de maconha como limite máximo para diferenciar consumidor de traficante — esta quantidade é adotada na legislação portuguesa, um bom exemplo de descriminalização no mundo. E de liberar o plantio de até seis pés da erva, pelo usuário, como no Uruguai.
Virou chavão dizer que a prisão é uma “escola do crime”. É mesmo, e os alunos, por essas falhas na Lei de Drogas e também na execução penal, são viciados, presos como se fossem traficantes e colocados ao lado de bandidos pós-graduados, quando deveriam ser tratados, em liberdade, do vício.
Este equívoco funciona como bem azeitada fábrica de bandidos. Calcula-se que 30% das prisões são relacionadas a drogas. Como o último dado oficial, de dezembro de 2017, é de que há 726,7 mil presos, pode-se ter uma ideia da quantidade de pessoas detidas de forma equivocada e que são futuros prováveis bandidos graduados quando saírem da cadeia.
Retomar este julgamento para concluí-lo logo é uma contribuição que o STF dará a que o Brasil siga uma política sensata neste campo, para, de forma inteligente e eficaz, reduzir a violência que acompanha a droga. Tem funcionado em outros países.
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