A agressividade americana nos desentendimentos comerciais com a China pode levar a uma recessão mundial, em que nenhum país deixará de acumular perdas
Próximo das eleições legislativas de meio de mandato, em novembro, o presidente Trump está tomado por um surto de hiperatividade, infelizmente no campo do isolacionismo e da xenofobia. Rompeu de forma nada diplomática com o Canadá de Trudeau, em recente reunião do G-7, em Quebec, abandonada por ele antes do fim, deixando incerto o próprio futuro do grupo.
E também fechou ainda mais a fronteira com o México, adotando a deplorável medida de afastar filhos de pais, em famílias apanhadas na tentativa de entrar de forma ilegal nos Estados Unidos. A reprovação mundial e dentro do próprio partido Republicano fez ontem Trump recuar.
Sempre numa linha nacional-populista, o presidente americano também elevou bastante a tensão no embate comercial com a China, depois de confirmar sobretaxas sobre o aço e alumínio também exportados pelos parceiros do Nafta, Canadá e México. A aliança pode até não sobreviver, mesmo que haja negociações sobre seu futuro, devido à agressividade e intransigência da Casa Branca.
Não é desconhecido que todos perdem numa guerra comercial. Mas o bom senso tem sido escasso nos movimentos políticos e diplomáticos da Casa Branca, que parece guiada apenas pelo interesse de agradar ao eleitorado mais conservador de Trump, para o qual só existem no mundo os Estados Unidos.
A escalada nos desentendimentos comerciais com a China, porém, ameaça todos os países e muito especialmente os próprios EUA. Se as duas maiores economias se chocarem, nenhuma outra escapará ilesa.
Fez, portanto, sentido, que os mercados mundiais caíssem em bloco na terça-feira, com raras exceções. Ontem, não recuperaram a perda do dia anterior. Nem poderiam, se os Estados Unidos, depois de anunciarem a taxação de importações chinesas no valor de US$ 50 bilhões, ampliaram a meta para US$ 200 bilhões e, posteriormente, chegaram a US$ 450 bilhões, diante de ameaças de retaliação. Querem contrapartidas chinesas que reduzam o superávit de Pequim nas trocas comerciais com os EUA, próximo dos US$ 280 bilhões.
Por óbvio, o objetivo só poderá ser alcançado por meio de negociações. Nunca na marra, até porque, como Trump, o presidente Xi Jinping também é um nacionalista, embora não tão estridente. Os chineses têm um grande poder de fogo contra os americanos no comércio, por serem pesados importadores de grãos, alimentos em geral e produtos manufaturados — daí as ações da Boeing e Caterpillar terem caído 3,8% na terça.
Mas não só: talvez a grande arma seja o fato de a China ser pesada compradora de títulos do Tesouro americano, que compõem boa parte dos US$ 3,4 trilhões das reservas externas chinesas. Uma grande oferta dos títulos no mercado mundial terá forte impacto negativo nas operações americanas de financiamento de sua dívida pública.
Assim como as duas economias podem sustentar ciclos de crescimento mundial, também têm o poder de propagar forças recessivas. Trump se vangloria de saber negociar, por ser empresário. Que tenha mesmo alguma noção de limites. O recuo na separação de pais e filhos imigrantes pode ser um bom sinal.
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