Ministra Laurita Vaz afirma que não era atribuição do plantonista do TRF-4 decidir sobre pedido de liberdade
Reynaldo Turollo Jr. | Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - A presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), ministra Laurita Vaz, negou liminarmente nesta terça-feira (10) um habeas corpus ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e afirmou que não era atribuição de um juiz plantonista do tribunal regional mandar soltar o petista.
A decisão serviu de resposta à guerra de decisões registrada no domingo (8), quando o juiz plantonista do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) Rogério Favreto mandou soltar Lula —decisão revertida pelo presidente do tribunal, Thompson Flores, após movimentação dos juízes Sergio Moro, da primeira instância, e João Pedro Gebran Neto, relator do caso no TRF.
O habeas corpus analisado por Laurita foi pedido por um advogado de São Paulo contra a decisão de Flores de manter Lula preso.
Desde domingo, o STJ recebeu 146 pedidos de habeas corpus formulados por pessoas que não integram a defesa oficial do petista —caso desse que foi julgado—, segundo a assessoria da corte.
Laurita afirmou que a decisão do plantonista do TRF-4 de libertar Lula foi “inusitada e teratológica [absurda]”, em flagrante desrespeito a decisões já tomadas pelo próprio tribunal regional, pelo STJ e pelo plenário do STF (Supremo Tribunal Federal).
O habeas corpus concedido por Favreto, e depois revogado, acolheu a alegação de parlamentares petistas de que Lula está sendo impedido de participar das atividades eleitorais. Para a presidente do STJ, a premissa é insustentável.
“É óbvio e ululante que o mero anúncio de intenção de réu preso de ser candidato a cargo público não tem o condão de reabrir a discussão acerca da legalidade do encarceramento, mormente quando, como no caso, a questão já foi examinada e decidida em todas as instâncias do Poder Judiciário”, escreveu Laurita.
A ministra disse que a guerra de decisões registrada no domingo foi um “tumulto processual, sem precedentes na história do direito brasileiro”, que suscitou um conflito de competência (um conflito de atribuição, na linguagem jurídica) entre o juiz plantonista (Favreto) e o relator do processo de Lula no TRF-4 (Gebran).
Para Laurita, a controvérsia —“em pleno domingo, mexendo com paixões partidárias e políticas”— exigiu que Thompson Flores, presidente do tribunal, tomasse uma medida saneadora urgente, com base em norma interna do TRF que o autoriza resolver “casos omissos”.
“Em face do, repito, inusitado cenário jurídico-processual criado, as medidas impugnadas no presente habeas corpus —conflito de competência [...] e a decisão do presidente do TRF-4 resolvendo o imbróglio— não constituíram nulidade, ao contrário, foram absolutamente necessárias para chamar o feito à ordem, impedindo que juízo manifestamente incompetente (o plantonista) decidisse sobre questão já levada ao STJ e ao STF”, afirmou a ministra.
MORO E GEBRAN
Laurita considerou legítimas as movimentações dos juízes Moro e Gebran que se insurgiram contra a decisão do plantonista. O fato de Moro ter se manifestado mesmo estando de férias gerou críticas de alguns especialistas em direito e de petistas, que sustentam que ele persegue Lula politicamente.
“Diante dessa esdrúxula situação processual, coube ao juízo federal de primeira instância [Moro], com oportuna precaução, consultar o presidente do seu tribunal se cumpriria a anterior ordem de prisão ou se acataria a superveniente decisão teratológica de soltura”, escreveu a ministra.
“Em tempo, coube ao relator da ação penal originária [Gebran] [...] avocar os autos do habeas corpus para restabelecer a ordem do feito.”
A ministra destacou que, não satisfeito, o juiz plantonista proferiu outras decisões insistindo na soltura de Lula e ameaçando Moro e a Polícia Federal, caso a corporação não executasse sua ordem.
Além do habeas corpus analisado em caráter liminar, Laurita deve julgar ainda uma reclamação da PGR (Procuradoria-Geral da República) para que pedidos de habeas corpus em favor de Lula sejam analisados no STJ, e não nas instâncias inferiores.
O objetivo da PGR é evitar futuros episódios como o de domingo, inviabilizando eventuais apostas da defesa nas instâncias mais baixas. Até a noite desta terça não havia decisão.
ENTENDA O VAIVÉM DE DECISÕES SOBRE A LIBERTAÇÃO DE LULA
SEXTA, 6
19h32 - Os deputados petistas Paulo Teixeira, Wadih Damous e Paulo Pimenta protocolam um pedido de libertação do ex-presidente Lula no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região). Outras solicitações foram feitas às 19h43 e às 19h59. Como nesse horário já havia começado o plantão da corte, os pedidos vão para o juiz plantonista Rogerio Favreto, e não para o relator da Lava Jato no tribunal.
DOMINGO, 8
9h05 - O juiz Rogério Favreto, plantonista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, determina em despacho a soltura do ex-presidente Lula. Entre os argumentos, está a falta de fundamentação da ordem de prisão, de abril, que não especifica os motivos para o petista ser preso. Também cita, como "fato novo", a condição de pré-candidato à Presidência dele
11h49 - Petistas protocolam petição reclamando da demora para o cumprimento da decisão de soltura e da ausência de delegado na sede da PF
12h05 - Sergio Moro, que condenou Lula em primeira instância, escreve em despacho que Favreto é "autoridade absolutamente incompetente" para determinar a soltura de Lula. Se a polícia seguir a ordem, diz o juiz paranaense, estará descumprindo decisão da turma do TRF-4 que ordenou a prisão.
12h44 - Favreto reitera, em despacho, a ordem de soltura afirmando que qualquer agente pode liberar o ex-presidente. Também afirma que o descumprimento acarreta em "responsabilização de descumprimento de ordem judicial"
14h13 - Relator da Lava Jato no TRF-4, João Pedro Gebran Neto, que votou pela condenação de Lula em janeiro e pela prisão assim que não houvesse mais recursos no caso do tríplex na corte, publica despacho determinando que a PF não solte o ex-presidente. "A decisão proferida em caráter de plantão poderia ser revista por mim, juiz natural para este processo, em qualquer momento", escreveu.
16h12 - Favreto expede nova ordem, determinando a soltura de Lula no prazo de uma hora e contestando o documento de Gebran. Ele escreveu ainda que vai levar o caso de Moro ao Conselho Nacional de Justiça.
19h30 - O presidente do TRF-4, Carlos Thompson Flores, dá a palavra final no caso: Gebran, como relator da Lava Jato no tribunal, tem a prerrogativa de decidir sobre o assunto, ainda que a situação tenha ocorrido em um plantão. Com isso, Lula permanece na prisão.
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